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Ensaios-->Considerações sobre o texto: Perdoando Deus -- 04/04/2003 - 00:15 (Priscila de Loureiro Coelho) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Perdoando Deus
de Clarice Lispector

Este texto de Clarice externa, com sua peculiaridade de expressão, uma experiência interior de grande impacto a protagonista.
Estar caminhando pela praia, representa seu contato mais subjetivo com o mundo, com a natureza, de forma singela e espontânea. Deixa-se levar pelo movimento que arrebata todos os seus sentidos, provocando-lhe uma experiência inédita integralizante. Por uns momentos sente-se parte do cosmo, e nesta percepção de Unidade vive a consciência de Deus, e sente por este Ser um carinho indescritível que a envolve e consome todos os espaços de sua consciência.
Neste estado de ser, vive momentos em que se desliga de toda materialidade, experimentando a suspensão dos limites impostos por ela, e nesta expansão do todo sua relação com Deus é atípica, misto de ternura, força criadora e entrega como parte da unicidade que o simples caminhar lhe proporciona.
Ao pisar num rato morto, a personagem do texto assusta-se e reage com infantilidade, num pavor desmedido.
A figura grotesca do repugnante animal, morto, a desconecta de imediato do mundo da essência, das idéias e da emoção mais pura, colocando-a em contato direto e sem possibilidade de fuga, com a realidade concreta e factual.
A rejeição que lhe provoca tal situação é tanta que se revolta com Deus. O mesmo Deus que segundos antes lhe despertara sentimentos dos mais nobres, belos e sutis.
Mas um rato! Morto!
O que fazia algo tão deplorável em meio a tanta beleza e harmonia?
Sua primeira reação é negar Deus, rejeitá-lo, culpá-lo, ignorá-lo...
O rato tem então a função de colocá-la frente ao seu próprio julgamento, onde a idéia e o fato se entrelaçam e formam a mais concreta realidade.
Sente-se desnuda de justificativas. Não há como fugir nem disfarçar.
Percebe que ao deparar com sua própria fraqueza, essa mesma fraqueza cria a rejeição, como para se proteger. Talvez num movimento que busque culpar alguém pela desordem, pelo aspecto feio, pela falha de sua própria vida.
Pensamento mesquinho do fraco!
Num súbito impulso conclui que a sensação que experimentou é falsa. Não existia. Uma lucidez dolorosa a envolve e percebe com clareza como a felicidade, em sua plenitude, pode ser algo alienante!
Enfrenta a verdade crua, sem possibilidade dela se apartar. A ilusão deste mundo fictício embriaga e causa um torpor que a mantém afastada da realidade.
Por um tempo questiona-se sobre sua própria identidade, considerando a possibilidade de ser ela própria uma mera ilusão!
Nesse raciocínio vai delineando o provável equívoco em sua maneira de amar.E não pode fugir de uma questão vital: Como amar a essência real do mundo se não ama sua própria realidade do ser?Se não a percebe com clareza?
Ao ver-se negando uma parte de si mesma compreende a fragilidade das premissas em que baseia seu contato com a vida.
Vai conjeturando, perseguindo a lógica que lhe escapa, ate que se dá conta de que talvez, Deus seja apenas e tão somente uma criação sua; uma projeção daquilo que não aceita em si mesma.
Termina sua caminhada num silencio quase mórbido, envolto em sentimentos de tristeza e quietude, uma vez que fixa sua atenção ao movimento interior de seus pensamentos.
Conclui neste estado de espírito: “Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe”.
Este texto brilhante da autora expressa a dúvida que assola a alma de todos nós, quando nos deparamos com o lado mais feio, grosseiro e ordinário de nosso cotidiano, e como nos é difícil perceber a realidade de Deus sem que nela projetemos todas as nossas frustrações.
Mais que um desabafo, este texto oferece a possibilidade de se refletir sobre esta questão, de modo bastante apropriado, uma vez que tem como pano de fundo uma realidade gritantemente comum a todo mortal.
Ao fazer as pazes com Deus, após estes momentos de rejeição e incompreensão, a autora nos mostra como é irresistível a atração que o Bem absoluto exerce sobre nós, e como tem em si a poderosa força de nos transformar, mesmo que disso não tenhamos tanta consciência e nem nos apercebamos de sua intensidade.
Um belo texto, que traz a marca característica desta mulher, para alguns, um tanto contraditória, mas que sem dúvida, uma mulher que se verga reverenciando a essência da vida como principal razão de nosso existir.

Priscila de Loureiro Coelho
Consultora de Desenvolvimento de Pessoas
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