A rosa é uma rosa, uma rosa é... (I)
Júlio Carvalho
No final do século XIII circula, na Europa, um poema com cerca de 22000 versos denominado Romance da Rosa. Curiosamente este título reúne duas autorias; uma escrita por Guillaume de Loris e a outra atribuída a Jean de Meun. A primeira parte contém 4000 versos e a segunda perto de 18000. Graças a Jean é que ficamos conhecendo o primeiro autor e que a primeira parte, por ele, foi retomada quarenta anos após a redação de Guillaume.
O texto faz parte de um amplo contexto literário da Idade Média genericamente chamado de Literatura Cortês ou Literatura do Amor Cortês. A segunda designação, a nosso ver, especifica, melhor, toda uma rica produção literária que tem como tema o Amor; amor segundo um ritual preconizado pelo contexto cultural das Cortes, não só na poesia dos trovadores, como nas narrativas das Novelas de Cavalaria.
O que, entre outras coisas, caracteriza o texto do Romance da Rosa, é o recurso estético à Alegoria, desde o jardim cercado por muros onde se destacam figuras que representam vícios até ao seu interior onde se encontra a fonte de Narciso; o encontro da rosa , até ao personagem feminino, personificador de vários sentimentos amorosos.
O recurso à Alegoria está presente em toda a mentalidade medieval, sobretudo na Igreja, à qual ela recorria com freqüência como principal artifício para divulgar a sua mensagem marcada pelo mistério. Muitos dos escritores deste vasto cenário são homens que pertencem ou pertenceram à Igreja. A cultura medieval foi profundamente esotérica.
O jovem protagonista do Romance da Rosa, que deambula oniricamente, penetra em um jardim e aí encontra a Rosa; a rosa da maior beleza. O odor das rosas embreagou-o, mas os espinhos e cardos não permitiam tocá-las e o Deus do Amor acaba por acertá-lo com suas flechas.
A rosa aí está, no centro de tudo, neste espaço de aprendizado amoroso. O jovem sonhador está começando uma “iniciação” no ritual do Amor.
A forma e a beleza da Rosa consagraram-na como a mais importante flor de nossa flora. O seu simbolismo é de uma riqueza total. A sua forma a relaciona a Mandala e podemos vê-la como um “centro místico”. Ela significa o Amor, a vida, o cálice sagrado.Entre os mulçumanos o Jardim das Rosa é um lugar de contemplação. Associada ao sangue, ela simboliza a vivência mística de uma nova vida, assim como uma regeneração.Dante a compara ao amor paradisíaco. (Divina Comédia; Paraíso-XXXX; 124-127).
O Romance da Rosa é um manual do Amor Cortês, assim como outros textos medievais, como certa versão de Tristão e Isolda. Consideremos como um Manual no sentido de um livro que ensina, que inicia às pessoas nos mistérios de alguma coisa. Haveria, então, uma Escola do Amor?