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Ensaios-->BOIADAS DE VERSOS (Carlos Ribeiro entrevista JIVM) -- 30/09/2003 - 04:03 (José Inácio Vieira de Melo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O jornalista Carlos Ribeiro entrevista o poeta José Inácio Vieira de Melo, quando do lançamento do seu segundo livro “Decifração de Abismos”, em 26 desetembro de 2002. Entrevista que foi publicada parcialmente no Jornal A Tarde, em 24 de setembro de 2002, e que aqui está na íntegra.


Boiadas de versos

ENTREVISTA - José Inácio Vieira de Melo lança o segundo livro, Decifração de Abismos, na próxima quinta-feira, na Fundação Casa de Jorge Amado.

Carlos Ribeiro

Eis aí, leitor, o sertão de volta à nossa poesia. “De volta” é uma maneira de dizer, pois dela jamais saiu - e nem podia, pois o sertão é a própria poesia. Mas que alegria nos dá saber que existem, nas gerações mais recentes, poetas que continuam fazendo de sua obra “um aboio livre que ajunta boiadas de versos”.

José Inácio Vieira de Melo é um desses. Nascido no povoado de Olho D’Água do Pai Mané, município de Dois Riachos, Alagoas, em 1968, mas morando em Salvador desde 1998, ele mostra, no livro Decifração de Abismos - cujo lançamento será na próxima quinta-feira, das 18 às 21 horas, na Fundação Casa de Jorge Amado -, que, como disse o poeta cearense Patativa do Assaré, pra fazer versos, não precisa professor, pois “Basta vê no mês de maio,/ Um poema em cada gaio/ E um verso em cada fulô”.

Vale dizer que Patativa é, ao lado de João Cabral de Melo Neto e Gerardo Mello Mourão, uma das principais referências na formação de Inácio, que já publicou, em 2000, o livro Códigos do Silêncio, pelo selo As Letras da Bahia, e foi um dos vencedores do Prêmio Iararana de Poesia 2001. Veja a seguir a entrevista com o poeta.

Carlos Ribeiro – O que você quer dizer com o título de “Decifração de abismos”?

José Inácio Vieira de Melo – “Decifração de abismos” é o poeta peregrinando por seus próprios abismos em busca da decifração. Com “Decifração de abismos” digo o que sinto, expresso o modo como vejo o mundo e o que causa em mim essa maneira de ver e entender o mundo. Mas é importante lembrar que o título se deu por conta da publicação do prefácio do meu primeiro livro, “Códigos do silêncio” (2000), no suplemento literário do Jornal A Tarde, o Cultural. O prefácio que foi feito por Gerardo Mello Mourão, tinha o nome de “Um momento de beleza”, mas foi publicado com o título de “Decifração de abismos”, creio que sugerido por Florisvaldo Mattos. Achei muito bonito. A princípio o livro se chamaria “Zoada”, depois é que resolvi mudar para “Decifração de abismos”.

CR – Ruy Espinheira Filho afirma no prefácio que o seu universo poético permanece sendo o mesmo do primeiro livro. Como você distingue o livro atual do anterior?

JIVM – Fico contente com a afirmativa de Ruy, pois a entendo como a identificação de um estilo. E ser identificado pelo seu estilo é o que todo poeta almeja. O que faz a diferença entre os dois livros, é que em “Decifração de abismos” me sinto mais seguro, mais maduro, dominando melhor as formas que visito, porém ciente dos caminhos que ainda estão pela frente e do aprendizado que eles proporcionarão. Costumo dizer que sou completamente poeta, mas não um poeta completo. Há muito para se aprender.

CR – Luís Antonio Cajazeira Ramos fala, nas orelhas, da sua trajetória do sertão para a cidade grande, e do trânsito, na sua poética, da vivência no sertão aos mestres da nossa literatura. Como você explica esse processo?

JIVM – Sou uma pessoa da roça e sempre vou ser. Nasci em Alagoas, em Olho d’Água do Pai Mané, um pequeno povoado; passei a infância e a adolescência entre as cidades de Palmeira dos Índios e Arapiraca. Estudava na cidade, mas sempre passava os finais de semana e as férias na fazenda de meu pai, na Ribeira do Traipu. Fiz o segundo grau em Maceió e depois, em 1988, vim parar numa fazenda no município de Maracás, sudoeste da Bahia, onde fiquei por 10 anos. Foi justamente nesse período que fui desenvolvendo as minhas leituras e comecei a me aceitar como poeta, pois não tinha outra opção – nasci com esta praga sagrada. A minha poesia parte da tradição que nos legou o século XX. Vivi no campo, tangendo e aboiando o gado e li boa parte das obras dos mestres da nossa poesia do século XX alumiado pela luz de um candeeiro, daí a afirmação de Luís Antonio, e não poderia ser de outra forma.

CR – Quais foram os escritores que mais o influenciaram?

JIVM – As referências em minha poesia são várias, mas três poetas tiveram um papel predominante, o da formação, e são eles João Cabral de Melo Neto, Gerardo Mello Mourão e Patativa do Assaré. Claro que nesse alforje estão presentes Bandeira, Drummond, Pessoa, Cecília Meireles, Jorge de Lima e Carlos Pena Filho. Depois fui conhecendo outros poetas que muito me atraem, como Maria da Conceição Paranhos, Jorge Cooper, Ruy Espinheira Filho, Ferreira Gullar, Myriam Fraga, Ildásio Tavares e Affonso Romano de Sant’Anna; ou mesmo os que me são mais próximos cronologicamente: Sidney Wanderley, Luís Antonio Cajazeira Ramos, Rodrigo Petrônio, Goulart Gomes, Kátia Borges, Miguel Antonio Carneiro, dentre outros.

CR – Por que você, um dos poetas mais admirados dessa nova geração, depois de ter estreado pelo selo As Letras da Bahia, com um trabalho que passou pelo crivo de uma comissão editorial, resolve agora publicar um livro independente?

JIVM – Porque não encontrei outra maneira. O selo Letras da Bahia só publica o mesmo autor depois de quatro anos da publicação anterior. O prêmio Copene é restrito a autores inéditos. As editoras do Rio-Sampa fazem vista grossa para os poetas consagrados, imagine para os jovens.Tive algumas promessas, mas eram pura embromação. Então resolvi fazer essa publicação independente. O selo Aboio Livre Edições surgiu para mostrar que se pode fazer um trabalho sério sem ter que ficar a mercê dos caprichos dos parcos editores da província. Escolhi o nome “aboio livre” porque é assim que sinto a minha poesia: um aboio livre que ajunta boiadas de versos.

CR – Como você percebe o panorama editorial e literário da Bahia?

JIVM – O panorama editorial, como já afirmei, é bastante limitado, o que é uma conseqüência direta do problema de distribuição que, por sua vez, é conseqüente da falta de leitores. Os autores baianos escrevem para os seus pares e para meia dúzia de gatos pingados. Para despertar o interesse do público baiano para com seus escritores é preciso investir na formação de leitores. E pelo que podemos constatar, a atual conjuntura política caminha em sentido oposto.
Quanto ao nosso panorama literário, percebo que está passando por uma fase positiva, em que há uma boa produção aliada à qualidade. Os expoentes da geração 60 adquirindo reconhecimento nacional, os da geração 80 se firmando e muita gente boa aparecendo. É claro que existem os equívocos, como alguns modernosos que acham que substituir ‘ca’ por ‘k’ é fazer poesia de vanguarda. Mas os equivocados não germinam.

CR – Existe alguma diferença entre o sentimento da poética alagoana e da baiana?

JIVM – O sentimento creio ser o mesmo, pois o sentimento que move os poetas é um só. Decerto, há algumas nuances – cada esquina tem um olhar diferente – mas, respeitando as muitas vozes de cada poeta – o sentimento é o mesmo.

CR – Os escritores da Bahia têm um intercâmbio maior com o pessoal do Rio de Janeiro e São Paulo do que com os nordestinos. Você concorda? E por que?

JIVM – É verdade. Isso se deve ao fato de que os escritores nordestinos normalmente não conseguem projetar suas obras em nível nacional, ficando restritos à província em que estão inseridos. Enquanto que os escritores do eixo Rio-Sampa, além de terem as principais editoras à sua proximidade, disponibilizam também dos principais veículos de difusão para os seus trabalhos, como jornais e revistas mais importantes do país. Daí terem uma maior visibilidade e serem procurados com freqüência pelos escritores das várias “cataguases” brasileiras.

CR – Fale um pouco mais sobre o livro “Decifração de abismos”?

JIVM – Como já afirmei, o livro dá continuidade a minha expressão poética, tendo por acréscimo um misticismo que o perpassa como um todo, nas suas cinco partes: Zoada, Cânticos, Jardim das algarobeiras, Cantigas e Irresidência. Apesar do forte traço místico, cada um dos cinco capítulos tem uma certa linha temática. Em Zoada o poeta dá voz aos gritos do silêncio, numa retomada ao livro anterior “Códigos do silêncio”. Em Cânticos é onde está mais forte a presença mística, uma fé que provém das suas raízes – avô, pai e mãe – e que transmite ao filho. Em Jardim das algarobeiras percebe-se a força telúrica, o poeta abóia para o mundo as suas toadas. Cantigas são poemas feitos para musas inspiradoras, é o conjunto que apresenta uma musicalidade maior. O capítulo que encerra o livro é Irresidência, onde o poeta revela seus conflitos, fala da angústia que o acompanha e da falta de sentido que percebe em tudo. É perceptível também uma insinuação para a morte que chega encerrando esse enorme nada, mas que – no início do livro – ao mesmo tempo promete jardins.
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