O SANTO GUERREIRO
Quando a Santa Madre Igreja tornou-se, oficialmente, a principal
religião do Império Romano, no mandato de Constantino, o Grande, – em
latim, Flavius Valerius Constantinus – no século IV, dC, o cristianismo
ainda não tinha santos para venerar. Os romanos eram idólatras. Assim,
para substituir os inúmeros deuses romanos, gregos e outros, no ano 370
dC os bispos Basílio de Cesareia e Gregório de Nazianzo começaram a
introduzir o culto aos santos, tornando o catolicismo uma religião idólatra
para contentar “gregos e troianos”, principalmente Roma e os outros países
ocupados pelo poderoso império.
Entre as centenas de santos e santas, reconhecidos e sagrados pela
Igreja Católica Apostólica Romana, vamos nos ater ao venerado guerreiro
São Jorge, lendário em sua montaria, capacete, armadura e lança, matando
um dragão, que representava o mal (o demônio) que, infelizmente,
dominava e ainda domina o mundo.
De acordo com a lenda, São Jorge nasceu em 275 dC na Capadócia,
região central da Anatólia, atual Turquia, e faleceu como mártir cristão em
23 de abril de 303 dC. Além de soldado do império romano no exército do
imperador Diocleciano, foi padre do cristianismo ainda oculto.
São Jorge é um dos santos mais venerados no catolicismo, tanto na
Igreja Católica Apostólica Romana e na Igreja Ortodoxa, quanto na
Comunhão Anglicana.
Imortalizado nas diversas versões do conto da princesa, em que ele
mata um dragão ou um grande crocodilo de fogo para salvá-la, foi também
um dos catorze santos auxiliares da Igreja Católica.
Depois da morte do pai, em batalha, São Jorge mudou-se, ainda
criança, com a mãe, para a Palestina.
De família abastada, foi criado com esmero e carinho. Ao atingir a
adolescência, entrou para a carreira das armas – a que mais satisfazia a sua
índole combativa. Promovido a capitão do exército romano pela sua
dedicação e habilidade, recebeu do imperador o título de conde da
Capadócia. Aos 23 anos passou a morar na corte imperial, em Nicomédia,
exercendo a função de Tribuno Militar.
Nessa época, a mãe faleceu, deixando-lhe a maior parte da sua
riqueza.
Porém, ao ver de perto tanta crueldade cometida pelos romanos,
principalmente contra os cristãos, achou conveniente converter-se e, além
disso, distribuir toda a sua fortuna aos pobres.
O imperador Diocleciano pretendia matar todos os cristãos. No dia
marcado para o senado romano confirmar o hediondo decreto imperial,
Jorge levantou-se no meio da reunião e se declarou espantado com aquela
decisão. E sugeriu ao senado que todos os romanos se convertessem ao
cristianismo.
Os presentes, inclusive o imperador, ficaram atônicos ao ouvir tal
declaração de um membro da suprema corte romana.
O tribuno Jorge defendia com ardor e grande ousadia a sua fé em
Jesus Cristo. Indagado por um cônsul sobre a origem de sua conversão,
Jorge prontamente respondeu que era por causa da Verdade. O tal cônsul,
não satisfeito, quis saber o que era a Verdade.
Jorge respondeu-lhe:
– A Verdade é meu Senhor, Jesus Cristo, a quem a nobreza do
império romano persegue! E eu sou mais um servo de meu redentor, Jesus
Cristo, e Nele confiando me coloquei no meio de vós para dar testemunho
da Verdade.
Como Jorge mantinha-se fiel ao cristianismo, o imperador tentou
fazê-lo desistir de sua fé, torturando-o de várias formas.
Ao fim de cada tortura, ele era levado ao imperador, que lhe
perguntava se renegaria a Jesus para adorar os ídolos romanos,
principalmente o deus Sol.
Mas Jorge reafirmava a sua fé. Aos poucos, seu martírio foi
chegando ao conhecimento dos cristãos, e muitos romanos tomaram para si
o flagelo imposto ao jovem soldado – inclusive a esposa do imperador, que
se converteu ao cristianismo.
O imperador Diocleciano, não tendo obtido êxito, mandou degolá-lo
no dia 23 de abril de 303 dC, em Nicomédia.
Considerado um dos mais proeminentes santos militares, sua
memória é celebrada no dia 23 de abril, e também em 3 de novembro,
quando se comemora a reconstrução da igreja dedicada a ele na cidade de
Lida, hoje Israel, para onde foram levadas as suas relíquias, num suntuoso
oratório aberto ao povo, erguido a mando do imperador Constantino I, após
a sua conversão ao cristianismo, duzentos anos depois.
Em meados do século V já havia cinco igrejas em Constantinopla
dedicadas a São Jorge. No Egito, nos primeiros séculos após a sua morte,
construíram-se quatro igrejas e quarenta conventos consagrados ao mártir.
Na Armênia, em Bizâncio, no Estreito de Bósforo, na Grécia e em outras
localidades do Oriente Médio, São Jorge foi inscrito entre os maiores
santos da Igreja Católica.
Entre a Idade Média Baixa, Alta e o mundo moderno, a fama do
Santo Guerreiro atravessou fronteiras, onde alcançou os seguintes títulos,
entre outros:
Na Itália, era padroeiro da cidade de Gênova. Frederico III, da
Alemanha, dedicou-lhe uma Ordem Militar. Em Portugal, desde Dom
Nuno Alvares Pereira, o santo é considerado padroeiro do país e do seu
exército. Na França, Gregório de Tour era conhecido por sua devoção ao
santo cavaleiro. O Rei Clóvis dedicou-lhe um mosteiro, e sua esposa, Santa
Clotilde, mandou erguer vária igrejas e conventos em sua honra.
Na Inglaterra, São Jorge teve papel mais relevante. O monarca
Eduardo III colocou sob a sua proteção a Ordem da Jarreteira, fundada por
ele em 1330. Por considerá-lo ícone dos cavaleiros medievais, o rei inglês
Ricardo I, comandante de uma das primeiras Cruzadas, constituiu São
Jorge padroeiro daquelas expedições, que tentavam conquistar a Terra
Santa dos muçulmanos.
No século XIII, a Inglaterra já celebrava o dia dedicado ao santo.
Assim, em 1348 criou a Ordem dos Cavaleiros de São Jorge. Os ingleses
adotaram-no como padroeiro do país, imitando os gregos, que também
trazem a cruz do santo em sua bandeira.
Antes da revolução comunista na Rússia, o patrono de Moscou
também era o santo guerreiro.
Nas artes visuais, São Jorge foi amplamente divulgado. Em Paris, no
Museu do Louvre, há um quadro famoso de Rafael, São Jorge Vencedor
do Dragão. Na Itália existem alguns quadros célebres de São Jorge, sendo
um de autoria de Donatello.
A ligação de São Jorge com a lua é folclore puramente brasileiro.
Esta influência veio com as religiões e culturas africanas, cuja tradição diz
que as manchas vistas da terra, principalmente nas noites de lua cheia,
causadas por impactos de grandes meteoros na superfície lunar,
representam o milagroso santo, seu cavalo e sua espada, pronto para
defender aqueles que buscam a sua ajuda.
Na Bahia e em outros lugares do Brasil, em vários terreiros de
candomblé, o santo é sincretizado a Oxossi, o orixá das matas. Já na
umbanda, São Jorge é associado a Ogum, orixá africano a quem se atribui
os ensinamentos das técnicas da metalurgia. Nos terreiros brasileiros de
umbanda, é cultuado mais pela sua belicosidade. É protetor e guia das
demandas contra os fiéis.
Em São Paulo, o Parque São Jorge é a sede oficial do Sport Club
Corinthians Paulista, fundado em 1910. Assim, São Jorge é padroeiro do
Corinthians e de seus torcedores. No dia 26 de novembro de 1967 foi
inaugurada, na sede do clube, a capela de São Jorge. Atualmente, em todos
os dias 23 de abril acontece uma grande festa em homenagem ao protetor
de milhares de fiéis corintianos. Dentro da capela há uma imagem de São
Jorge talhada à mão, original do Vaticano.
Conta-se que ainda no império de D. Pedro II, no século XIX, as
procissões de Corpus Christi, na provinciana cidade de São Paulo, saíam da
antiga Igreja da Sé. O bispo caminhava sob o pálio, segurando o ostensório
com a hóstia sagrada, e a imagem de São Jorge vinha logo atrás.
Em uma dessas procissões, a imagem do santo guerreiro montado em
seu cavalo, matando o dragão com a lança – que pesava mais de cem quilos
– caiu do andor e matou um dos acólitos.
Abriu-se um inquérito na chefatura de policia, e o processo foi parar
no fórum, onde um juiz condenou o santo à prisão perpétua na antiga
Catedral da Sé.
Quando a catedral velha foi demolida para o alargamento do Largo
da Sé e a construção da nova catedral, a imagem de São Jorge e outros
objetos de arte sacra foram removidos para a Cúria Metropolitana.
Hoje, a imagem está no Museu de Arte Sacra, onde, apesar de preso,
ainda recebe visitas.
Em 1969, o Papa Paulo VI baniu do Calendário Litúrgico da Santa
Madre Igreja diversos santos, entre eles, São Jorge. A igreja só considera
santos aqueles cuja existência tenha comprovação, ou que não seja
acompanhado por lendas estranhas, como as do santo guerreiro. O Vaticano
continua aceitando a devoção a São Jorge e seu culto é reconhecido pelo
catolicismo. Assim, para a Igreja Católica, ele é considerado um grande
mártir, ou um santo menor.
Ao escrever estas linhas, em dezembro de 2011, o nosso querido e
amado Corinthians sagrou-se pentacampeão dos campeonatos brasileiros de
futebol, graças ao poderoso time e à sua fiel torcida. Para nós, o Timão é
uma religião abençoada por São Jorge Guerreiro.
Viva São Jorge Guerreiro!
Viva Ogum da Mata!
Viva Ogum Beira Mar!
Roberto Stavale
São Paulo, dezembro de 2011
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