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Ensaios-->Em Defesa da Sociologia -- 05/11/2003 - 02:46 (Márcio Scheel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Anthony Giddens é diretor da London School of Economics e professor da Universidade de Cambridge. É autor e editor de mais de trinta livros. As obras anteriores de Giddens, principalmente Beyond Left and Right, influenciaram o debate sobre o futuro da social-democracia em muitos países. Na Inglaterra, é freqüentemente apontado como o mentor intelectual do primeiro ministro Tony Blair, e como o causador, graças ao seu pensamento, de um forte impacto sobre evolução do novo trabalhismo europeu.
Um dos últimos livros de Giddens – Em Defesa da Sociologia - é formado por um conjunto de artigos escritos na última década do século XX. Nestes artigos já é flagrante a preocupação central do autor, ou seja, chamar a atenção para o fato de que estamos vivendo uma época de finalizações marcadas pelo encerramento do milênio. Segundo o autor inglês, vive-se um período de transações em que as certezas construídas pelas ciências sociais desde o século XIX foram, a um só tempo, sendo reconstruídas e dissolvidas.
As profundas mudanças ocorridas na sociedade ocidental e, particularmente, na Europa, no decorrer do século XX, colocaram novamente em pauta as discussões sobre a construção do saber desenvolvido pelas Ciências Sociais - o saber que afiançou a capacidade que temos de refletir sobre a natureza do homem, as relações que estabelece com seus semelhantes e com as estruturas sociais por ele mesmo criadas.
Anthony Giddens trata, no artigo Em Defesa da Sociologia, das polêmicas em torno da legitimação da sociologia como uma ciência entre as disciplinas acadêmicas. Procura, então, reabilitar a sociologia e trazer de volta todos os méritos que a disciplina conquistou ao longo de mais de um século de existência. O autor inglês principia por reconhecer que essa mesma disciplina se enquadra, sim, em todas as acusações que tem sofrido nos últimos tempos: a de ser “difusa”, “desprovida de um tema coerente” e “coalhada de jargões”, mas que não é única e exclusivamente isso.
Realmente, a sociologia não pode ser encarada, percebida ou criticada como uma ciência, ou pretensa ciência, que se desgastou com o tempo e que vive da repetição mais ou menos generalizada de idéias, conceitos, jargões ou métodos de investigação. Giddens vai discutir o fato de que em alguns momentos, em determinadas circunstâncias e sob alguns aspetos, a sociologia apresenta ou apresentou algum vínculo com a direita política, como a criticavam durante a década de 60 e 70 as mais diferentes vertentes marxistas, embora nem todos os sociólogos tenham aderido decididamente à direita, ao contrário, a maioria deles iria mesmo se identificar com o pensamento revolucionário proposto pela esquerda em muitos lugares do mundo.
Agora, a questão central para Giddens não é simplesmente a inclinação política dos sociólogos, mas sim demonstrar como a sociologia vem se decompondo nos últimos anos graças ao fechamento de salas, à diminuição do número de graduandos, e do corte em seus recursos. Tudo isso acontecendo, principalmente, nos Estados Unidos que, segundo o autor, é o país em que a disciplina melhor se desenvolvia há muito tempo.
Giddens identifica, como motivo para esse descaso, o fato de que a matéria vem se tornando a morada dos descontentes, um ponto de encontro de grupos com assuntos específicos em pauta, que vão desde defensores dos direitos homossexuais até simpatizantes da teologia da libertação. Longe de soar como um preconceito, o motivo apresentado por Giddens revela que a sociologia padece de um mal que vem se alastrando no ambiente universitário: a especialização, o afunilamento dos temas de pesquisa, os assuntos excessivamente delimitados, o exagero empirista que deixa de criar grandes teorias e faz com que a disciplina se concentre, cada vez mais, na pesquisa e na análise prática, que tem sempre um caráter imediatista, deixando de buscar a constituição e a fundamentação de novos escopos teóricos capazes de abarcar em profundidade o estudo das sociedades contemporâneas como realidades cada vez mais complexas e desarticuladas.
A sociologia deve, sim, preocupar-se com a análise prática, da política prática, de temas pontuais para a realidade contemporânea do homem que vive uma época de grandes problemas sociais, problemas que parecem não dispor de uma solução a curto ou médio prazo, problemas como os da violência urbana, das cidades em crise, do estudo médio e universitário em processo de deterioração, porque, segundo Giddens:

'Entre todas as ciências sociais, a sociologia estabelece uma relação mais direta com as questões que dizem respeito à nossa vida cotidiana - o desenvolvimento do urbanismo moderno, crime e punição, gênero, família, religião e poder social e econômico'. (pág. 14)

O problema é que a sociologia não deve promover nenhum tipo de pesquisa social que se distancie ou dissocie do mundo social que descreve ou que, ao menos, busca descrever, analisar e compreender. Giddens defende a idéia de que a pesquisa social, como vem sendo realizada, além de não promover o aparecimento de um suporte teórico de peso - como foi o marxismo durante o século XIX e mais da metade do XX -, tem se distanciado da realidade social, da matéria e objetivo em que se fundamenta a dinâmica da investigação sociológica, isso porque todos nós necessitamos dessas pesquisas para identificar e entender o que, muitas vezes, consideramos senso comum, nas palavras do próprio autor.
E é a idéia de senso comum que prejudica e cria esta série de críticas que circundam a sociologia atualmente: quando as pesquisas ganham um caráter popular, no sentido de que de tão difundidas passam ao domínio da discussão pública não-especializada, a sociologia passa a ser vista como algo pouco original e menos fundamental do que verdadeiramente o é, já que parece simples aos olhos e à compreensão do senso comum porque tem seu conteúdo mais intenso e profundo excessivamente barateado por esse tipo de perspectiva simplificadora. Daí a importância do suporte teórico de peso que a sociologia deveria criar antes de partir, efetivamente, para a análise empírica e prática da sociedade contemporânea. É a teoria quem garante e protege a pesquisa social, e a sociologia, de qualquer tipo de reducionismo ou barateamento, de qualquer tipo de vulgarização que faça com que ela acabe sendo confundida com artigo de segundo ordem.
Outro ponto a ser considerado na discussão sobre a degeneração da sociologia - e das críticas que esta tem recebido - diz respeito ao fato de que, em última análise, o próprio universo acadêmico não tem fornecido garantias reais para os professores e pesquisadores que se formam sob a tutela desta disciplina: trata-se da queda considerável dos salários pagos pelas universidades e as péssimas condições de trabalho que elas vêm oferecendo nos últimos anos. Não é fácil ser um profissional mal remunerado e ainda ter de driblar problemas como classes superlotadas, deficiência de materiais e espaço para o desenvolvimento das aulas e trabalhos de pesquisa, além da grande carência de subsídios orçamentários que possam garantir a continuidade e a divulgação dos trabalhos e das pesquisas realizadas ao longo, muitas vezes, de todo o curso de graduação.
Assim, é preciso reconsiderar muitas das críticas que se direcionam à sociologia e repensar sua importância não só histórica, mas também social, política e econômica, de acordo com os novos padrões sociais surgidos a partir da segunda metade do século XX, além de levarmos em conta a realidade adversa que cerca os profissionais dedicados à investigação sociológica. Giddens afirma que

'Os autores da sociologia foram os pioneiros em discussões sobre o pós-modernismo, a sociedade pós-industrial e da informação, a globalização, a transformação da vida cotidiana, do gênero e da sexualidade, a natureza mutável do trabalho e da família, a ‘sub-classe’ e a etnia'. (Giddens, pág. 19)

Apenas estes motivos já seriam mais do que suficientes para que pensemos a importância da sociologia como forma de compreender o homem, nossa realidade, nosso meio social, e as relações em que nos vemos constantemente envolvidos. É preciso pensar, ainda, que a história, por si mesma, determina a importância da sociologia como disciplina não simplesmente para a compreensão do homem, mas também como forma de suporte para a compreensão da própria história, determinada sempre, em maior ou menor grau, por uma série de movimentos sociais mais ou menos ordenados que revolucionam e alteram profundamente as bases de convivência e relação das pessoas dentro das sociedades, dos meios sociais em que vivem e se desenvolvem. E, segundo o autor, como a vida social tornou-se episódica, fragmentária e marcada por novas incertezas, o pensamento sociológico é quem primeiro deve contribuir para o entendimento dessa mesma vida social.
A sociologia, como disciplina, vem sofrendo os mesmos problemas que quase todas as disciplinas relacionadas às ciências humanas vêm sofrendo nas últimas décadas. O que não quer dizer que esteja em vias de extinção como quer acreditar uma certa parcela de detratores. Está, sim, passando por um momento de reavaliação crucial que envolve, sob muitos aspectos, outras várias disciplinas igualmente determinantes para uma melhor percepção do homem, da sociedade e da cultua. Mas apenas o tempo pode precisar se esta reavaliação irá salvar a sociologia das críticas da própria sociologia e do descaso educacional que essa forma moderna de atuação política tem promovido.

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