Diário de um pseudônimo (034) (2004/11/08)
Penfield Espinosa
08/11/2004
Casa de Bonecas, Ibsen & Gaiman
Existe uma Casa de Bonecas mais antiga do que aquela de Neil Gaiman: é a de Henrik Ibsen. Até aqui, ela era a mais famosa.
É uma peça do dramaturgo sueco onde uma dona de casa, Nora, denuncia o jugo da sociedade sobre as mulheres burguesas, que as tornava como crianças brincando em um mundo à parte. Em uma fala importante da peça, Nora diz ao pai que no casamento ele meramente a transferiu ao marido --- de uma casa de bonecas literal dos brinquedos infanto-juvenis para uma casa de bonecas figurativa, onde ela também tinha que fingir um papel alienado.
Os marxistas dos anos 70 do século 20 diziam que o feminismo é uma luta de toda a sociedade: à medida que a mulher se liberta de seu jugo perante a sociedade, liberta também o homem.
Na verdade, para esses pensadores, o homem não é o inimigo da libertação feminina: também faz parte de uma sociedade opressora, na qual algumas vezes desempenha o papel de opressor, em outras o de oprimido.
O importante, assim, é quebrar esse jugo: à medida em que o oprimido se liberta, liberta também o opressor de seu teatro igualmente alienante. E faz com que toda sociedade evolua em conjunto.
A Casa de Bonecas de Gaiman mostra uma outra alienaçào, outro apequenamento da vida humana. Passada em uma casa de cômodos britânica, pós-feminismo, pós trabalhismo, pós-contracultura, os personagens de Gaiman mostram o quanto somos todos pequenos, carentes, todos pequenos trapaceiros e traidores.
S. Paulo, 08 de novembro de 2004
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