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Contos-->A TRANFERÊNCIA -- 28/11/2002 - 14:24 (Wellington Macêdo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Nos idos dos anos cinquenta uma das profissões de destaque na sociedade era a de funcionário do Banco do Brasil. Além da segurança no emprego o salário era bastante compensador, permitindo um padrão de vida invejável.
Geralmente após ser aprovado num concurso público, o candidato era nomeado para o cargo inicial de escriturário e destacado para exercer suas funções numa das inúmeras agências localizadas nas cidades distantes da capital do Estado. Somente após dois anos de efetivo exercício o funcionário teria o direito de solicitar a sua transferência para cidades mais próximas, com melhor infra-estrutura, desde que houvesse vaga em disponibilidade. Desse modo, uns se adaptavam completamente nas pequenas cidades do interior; constituiam família e lá permaneciam até completar o tempo necessário para a sua aposentadoria, enquanto que outros, talvez mais ambiciosos, conseguiam transferência para as capitais.
Assim, fora o caso de Leovigildo. Rapaz inteligente, desprendido e dotado das mais justas ambições para galgar cargos de destaque, inicialmente fora encaminhado a uma cidadezinha do interior para desempenhar as suas funções numa agência bancária inexpressiva. Após o cumprimento do estágio probatório e, à medida que fora se destacando dos demais colegas e angariando dessa forma a simpatia dos seus superiores hierárquicos, Leovigildo conseguira transferências sucessivas para cidades maiores, culminando com o cargo de gerente numa agência da capital do Estado.
Casado já há algum tempo; pai de dois filhos adolescentes cursando faculdade; detentor de um largo círculo de amizades de repente, se viu surpreendido pela sua transferência para uma cidade no sertão do Piauí. Tranferência essa, que no seu entender, se dera em razão da antipatia e do despeito que um dos Diretores do Banco nutria por ele.
Altamente decepcionado, Leovigildo chega em casa e comunica à sua mulher e aos filhos a razão do seu profundo descontentamento, que não pudera esconder, estabelecendo-se um clima de sentida tristeza no seio da família. No entanto, acreditando que a noite á a melhor conselheira, foi dormir e, logo no dia seguinte resolve solicitar aposentadoria e, desse modo, frustar aquele Diretor daquela satisfação mórbida. Para sua decepção, ainda faltavam alguns anos para completar o tempo necessário ao seu intento. Restando-lhe, unicamente, cumprir a determinação superior.
No sentido de evitar maiores transtornos, a família de comum acordo, resolveu permanecer na cidade onde residia, enquanto que Leovigildo viajaria sozinho até que os ânimos se acalmassem e ele conseguisse reverter a situação. Assim foi feito.
Após as despedidas de praxe tão comuns nessas ocasiões, Leovigildo viajou para o sertão do Piauí se instalando numa pousada, por sinal a melhor que encontrara, apesar da sua precariedade e da falta de conforto ao qual se habituara.
Reiniciando suas atividades profissionais na agência bancária local, à medida que os dias iam passando e tendo em vista sua capacidade de angariar novas amizades, logo estabeleceu um largo círculo de amizade. Quase que diariamente Leovigildo era convidado por casais amigos para reuniões e festas, sobretudo nos fins de semana. No entanto, apesar de uma vida sociala intensa, a saudade da mulher e dos filhos ia se tornando cada vez maior. Embora, diante da atenção e do carinho que lhe eram dispensados, de modo algum se acostumara à culinária local, cujo prato principal tinha na carne de bode o seu expoente. Por se tratar de uma região incrustada no sertão nordestino onde a inclemência da seca a castigava por anos seguidos, o único tipo de pecuária adaptável era a de caprino. Assim, em quase todos os almoços e jantares para os quais era convidado, lá estava a carne de bode sob as mais variadas formas: bode assado; churrasco de bode; bode quisado ao leite de côco, enfim, sempre a carne de bode pela qual manatinha profunda aversão.
Certo dia, tomando conhecimento da aposentadoria daquele Diretor que lhe impusera semelhante vexame, Leovigildo consegue, através das suas amizades, reverter aquela sua transferência, retornando à sua cidade de origem. Desnecessário enfatizar da alegria que se apossara da família após longos meses do exílio do seu chefe.
Ao tomar conhecimento da transferência de Leovigildo, seus novos amigos resolveram homenageá-lo, oferecendo-lhe um almoço de despedida na melhor e mais bem frequentada churrascaria, tendo a carne de bode como seu prato principal. Poucos dias antes da realização do evento, Leovigildo solicitou ao proprietário da referida casa pasto permissão para afixar uma placa nas suas dependências, como forma de deixar gravada a sua imorredoura gratidão diante de tão calorosa hospitalidade. Permissão obtida, ficara acertado que o descerramento da citada placa somente se daria após algumas horas de iniciada a sua viagem de regresso. Desse modo, encerrados alguns discursos de despedida, Leovigildo alegando sua grande sensibilidade a esse tipo de homenagem e levando em consideração ser dotado de profunda emotividade, pede permissão para se retirar, tendo antes solicitado à mulher do Prefeito que procedesse o descerramento da placa. E assim foi feito.
Sem esconder a emoção, os presentes se acercaram do local determinado e, uma vez exposta, lá se encontrava gravado:

Nos dias que por aquí fiquei,
De fome, vários quilos perdí,
No seertão dessa terra distante,
Jamais carne de bode comí

Adeus Piauí velho,
Nunca mais me verás tú,
Criei ferrugem nos dentes
E teia de aranho no cú.
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