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Contos-->Meu primeiro amor -- 28/11/2002 - 18:17 (Jorge Wellington Queiroz de Brito) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Meu primeiro amor


No inicio dos anos 60, época tida como “os anos dourados” ou “anos da inocência”, quando então eu vivia o inicio da minha pré-adolescência entre 11 e 12 anos, morava com meus pais e irmãos num bairro residencial de classe média no subúrbio do Rio de Janeiro. No mesmo quarteirão da nossa casa, na esquina, havia um pequeno comercio, coisa muito comum naqueles tempos, aonde se concentravam algumas pequenas casas comerciais cujos proprietários, geralmente, eram portugueses e em sua maioria moradores do próprio bairro, pois não existiam esses grandes mercados ou supermercados. Os donos da Padaria e Confeitaria Brasil, “os Paiva”, o botequim do “seu Zé”, o açougue do ”seu Paulo, dos balões”, e ao lado dele a quitanda do “seu Manuel português”, que vendia hortaliças, legumes, carvão, querosene, alguns enlatados, recipientes de barro etc.
Um belo dia a quitanda entrou em reforma e quando reabriu, eu vi que havia mudado de donos e os novos proprietários, também Portugueses, eram um jovem casal ainda sem filhos. Logo no nosso primeiro contato eu fiquei encantado pela beleza daquela moça de 27 anos de idade, de gestos simples e voz suave. Maria, esse era o seu nome. E eu nunca havia visto uma Portuguesa tão linda e bem cuidada como ela. A sua pele era a muito alva e aveludada, como um pêssego. Tinha uns olhos castanhos escuros, redondos, que pareciam estar sempre arregalados, cílios grandes, cobertos por sobrancelhas cheias e muito bem delineadas. E completando o tipo, uma cabeleira longa e negra que contrastava com sua pele clara que ela mantinha quase sempre presa em rabo-de-cavalo, colocando em relevo aquele belíssimo semblante. Ela e Antonio, seu marido, estavam recém chegados ao Brasil procedentes da cidade do Porto, e traziam ainda um sotaque muito forte. Logo iniciamos amizade, pois eu sempre os ensinava palavras próprias do nosso vocabulário ainda desconhecidas para eles e especialmente para ela com quem eu passava mais tempo. Assim, uma amizade foi-se transformando em afeição e amor. Minha primeira paixão.
Com o tempo passando, nossa intimidade foi aumentando e ela, logicamente, passou a perceber que eu a tinha como alguém muito especial. Porém nunca alimentou em mim aquela ilusão, claro, pois eu era apenas uma criança. Nós conversávamos muito e ela sempre dizia “miúdo, era assim que ela me tratava, você é um menino muito esperto para tua idade” e sempre falando carinhosamente de forma que eu entendesse que eu era uma criança e ela um adulto, dizia sempre que quando eu crescesse, a mulher que viesse a casar-se comigo seria muito feliz. A ternura com que ela me tratava era muito grande. Tinha sempre gestos ou palavras carinhosas comigo. Também ganhava balas, bolinhas de gude, pipas, aquilo era suficiente para que acreditasse que também era amado, e era, mas de outro modo. Às vezes eu lhe trazia algumas flores silvestres que eu pegava nos jardins da vizinhança, que ela recebia, agradecia e sorria. Amor de criança é assim mesmo, um amor puro, sem interesses, somente de contemplação. E essa era minha alegria, vê-la, todos os dias, e escutar aquele sotaque engraçado, mas naquela voz sempre suave, era bonito.
O Antonio também era um grande amigo, e por essa razão, eu, na minha ilusão infantil, achando que ele nada sabia, tinha muito medo que percebesse alguma coisa, uma vez que, eu não saberia o que fazer se ele descobrisse que eu namorava a mulher dele e qual seria a sua reação.
Pelas manhãs ele estava no balcão. Ela ficava na parte da tarde, quando eu voltava da escola, e permanecia em sua companhia, até mesmo ajudando a atender a freguesia. Ao anoitecer ele voltava para o balcão e ela se retirava para fazer a refeição deles, pois eles moravam nos fundos da loja.
Assim passaram os meses, não sei quanto tempo, mas o meu coração infantil amava pela primeira vez, e logo uma mulher adulta.
Numa dessas tardes, ao retornar da escola, encontrei a loja fechada. Achei estranho, bati na porta e ninguém atendeu. Fui para casa troquei o meu uniforme da escola e voltei lá diversas vezes sem resultado e nem os vizinhos deles sabiam o que havia acontecido, Antonio havia fechado cedo a loja e saído apressado, disseram eles.
À noite voltei lá e olhando pelas frestas das portas vi que havia luz acesa nos fundos. Tornei a bater e chamei por eles. Um vulto se aproximou. Percebi que era o Antonio.
Ele abriu aporta lentamente, e eu deparei com meu amigo todo transtornado, as faces muito vermelhas, e com os olhos que pareciam duas postas de sangue. Aos prantos ele abaixou-se e pela primeira vez abraçou-me, e apertando-me fortemente contra seu peito, entre soluços disse ao meu ouvido:- miúdo a nossa amada morreu!
Mas como? Eu a havia visto quando fui para a escola! Chorando muito e quase desesperado perguntei o que havia acontecido. Um acidente de lotação. Ela ficou com o pescoço imprensado entre dois bancos, disse-me ele. -Vou voltar para Portugal! Dizia chorando.
E na loja, ficamos ambos chorando muito durante algum tempo. Eu não entendia nada de sofrimento, nunca alguém que eu conhecia havia morrido, ainda mais alguém que eu gostasse tanto.
Ali eu soube que ele já sabia de tudo.
Abatido e desesperado corri para casa chorando tanto que não conseguia nem contar para minha mãe o ocorrido, pois ela não entendia porque eu chorava tanto. Como explicar?
Naquele dia eu cresci. Deixei de ser tão criança. Eu ainda não sabia que amar doía tanto e que Maria era uma pessoa tão preciosa.
E essa foi a ultima vez que eu vi Antonio.
(J.Brito)

“Na infância, o que se ouve, o que se vê, ou o que se sente não sobe para o cérebro, desce para o coração, e ali, fica escondido para sempre”. (Humberto de Campos)

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