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Artigos-->AMERICA PAIXÃO IMORTAL -- 21/04/2012 - 10:18 (Marcelino Rodriguez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos




O America é sobretudo uma questão de amor”

Dario Meirelles

“O America é como uma religião”

Tia Ruth

“Nenhum fanatismo em futebol deve ser perdoado, exceto o dos torcedores americanos”

Marcelino Rodriguez



“Torcedor do America não bate bem da cabeça. È tudo maluco.

A vida de americano é dura”



João Maluco















NASCE UMA PAIXÃO





Nossa história começa em meados dos anos setenta. Naquele tempo, os clássicos da rodada das dezessete horas era reprisado as vinte e duas horas, na íntegra. Eu era um menino de cabelos de cor de girassóis que costumavam cair nos ombros e era franzino como um anjo invertebrado, o que me valeu em Santíssimo o apelido de Mosquito. Eu assistia a reprise de um America e Flamengo, vencido pelo rubro-negro por dois a um. Porém, todos os comentaristas diziam que o placar havia sido injusto e, ao que parece, o America, que costuma ser subtraído até fora do campo, fora prejudicado. Fiquei indignado. No dia seguinte, cheguei para o meu padrasto, o capitão Mike de múltiplos talentos, sargento da valorosa marinha de guerra e interroguei-o, como se o oficial fosse eu.

-- Tio, o America é bom?

-- É sim.

-- Então, sou America.

Desse dia em diante, nasceu uma paixão que levou-me as aventuras mais quixotescas e ao amor mais certeiro cuja mesma fidelidade não posso prometer a mulher alguma, posto que o amor de um homem por uma mulher pode ser chama, mas o amor de um torcedor americano de pedigree costuma ser imortal. Capitão Mike passou o resto da vida tentando insinuar que virei a casaca. Mas não é verdade. Ser America é uma certeza sobrenatural do meu ser. Até essa noite, o futebol era algo difuso.













Ter decidido meu time naquela noite trouxe para dentro de casa um problema de proporções sociológicas. O caso é que só havia um rádio AM dentro de casa e meu padrasto não o largava de jeito nenhum nos dias de jogos do rubro-negro. Começaram as rixas. Minha mãe decidiu a peleja que travávamos pelo espaço do rádio com uma parcialidade escancarada. Deu-me um radinho do pilha de couro azul, que foi um grande companheiro da minha infância, além de ter sido, juntamente com o livro “Só As Mães São Felizes”, muitos anos depois sobre a vida do Cazuza, presentes que jamais esqueci. Na voz de Doalcey Bueno De Camargo, grande americano, fui iniciado na alegria de ouvir os gols do Mecão. Além disso, o radinho servia para meus romantismos nebulosos musicais de infância. Definitivamente, como chamou-me um vez certa mulher, eu era o Bob. Um dia, porém, o sobrenatural, invejoso da minha felicidade, resolveu encarnar um demônio em meu melhor amigo na época, o Ângelo. O America aplicava uma goleada estratosférica num time que agora não me recordo e a cada gol, eu vibrava e gritava alto. Creio que nunca duvidei de Deus, porque o demônio é evidente demais. E se existe um , há de haver o outro. Elementar. O fato é que meu amigo, que morava na casa defronte, veio em minha direção com uma fúria insana, como Michael Douglas naquele filme e , invadindo minha casa, jogou fora meu radinho de pilha de capa de couro azul no brejo que tinha ao lado de minha casa, o que levou-me a um perigoso estado de pranto. Eu olhava meu amigo terno, que era meu competidor de botão sem entender nada. Estava possuído. Para quem duvida dessas coisas, digo que dias depois Ângelo veio em minha casa aos prantos com outro radinho, pedindo desculpas. Aquele radinho de pilha que dera-me minha mãe deve ter dado inveja ao demônio e ele resolveu usar meu amigo para destruir o presente que eu ganhara. Tenho pena dos homens que não rezam. Sãs, a imensa maioria, marionetes do demônio.







Estar num estádio de futebol, vestido com as cores do meu time dos pés a cabeça, patético e sem noção. Uma cerveja gelada, eventualmente um cigarro fumado nervosamente; soltar centenas de palavrões por minuto, exaltado, ilógico, blasfemo, hilário. Isso tudo faz a felicidade sem igual de um autêntico torcedor de arquibancada. Nessa vida, onde temos que parecer ser sempre o que não somos, estar insensato pelo meu time é como estar diante de Deus, puro de coração. Estar torcendo pelo meu time é um dos meus melhores momentos nessa vida.





Em nossa vida de menino há aqueles momentos de fulgurantes intuições que nos levam a atos que ficarão para sempre marcados em nossa memória enquanto vivermos. Foi assim que comecei, quando todos em casa e no bairro já sabiam que eu era o garotinho fanático pelo America, com uma paixão que beirava o mitológico, a pressionar meu padrasto para levar-me a primeira vez ao Maracanã. Capitão Mike, como bom capricorniano, não era de facilitar sem levar nada em troca e teria que ser um America e Flamengo para estimulá-lo de forma a não permitir sabotagens dele, para enfim eu ter meu sonho realizado.

O ano era 1978. Uma bela tarde de domingo. E não poderia ter sido escolhido um jogo melhor. O America entrou em campo de branco e aquele branco parecia, ou era, divinal. Esse jogo entrou para a história porque o ponta esquerda do America, Silvinho, fez um verdadeiro gol de placa no empolgante empate de dois a dois. Ao entrar e vislumbrar o interior do estádio, dei de frente com a torcida do America do outro lado, num número muito inferior ao contingente rubro negro. Esse primeiro impacto deu-me novamente uma sensação de injustiça. Havia, porém, naquelas faixas em vermelho e branco uma nobreza, uma magia, uma sina que logo percebi que ali, entre aquela gente, estava meu lugar e pressionei meu padrasto – eu que estava vestido de America dos pés a cabeça – para que levasse-me até lá. As faixas diziam “Torcida Organizada”, Torcida Belfort Duarte” e outras. Só sosseguei quando percebi que deixava para trás o lado rubro negro. Lembro-me que gritei e vibrei como nunca, sobretudo porque o dia era de Silvinho, que infernizava pela ponta-esquerda. Meu padrasto,anos depois, ele que tinha mania de criar ficções e sustentá-las, disse que eu gritava “vai, Silvinho, vai , Silvinho” e que os outros gritavam “cala a boca, galego”. Não posso negar que o Capitão Mike foi um dos humoristas mais sofisticados que conheci nesse planeta muito divertido, quando os seres sem imaginação não estragam nossa vida com a estupidez. O jogo terminou dois a dois e ficou na história do clássico. Eu sai orgulhoso do meu time do Maracanã e com o senso perfeito de que a partir daquele momento, e para sempre, passei a ser e era cidadão americano.







Com meu pai vi apenas um jogo do America contra o Bangu, no saudoso Andaraí. Exaltados, nós dois comandamos uma escarrada coletiva no bandeirinha, o que hoje já convertido aos valores espirituais faz-me pensar, ao recordar isso, que terei de quando for para o céu pagar antes algumas cestas básicas na ante-sala de São Pedro. Qual dentre nós, porém, não tem seu porão de infâmias? O pecado nos une a todos. Como disse a Jesus, atire a primeira pedra quem nunca pecou. Logo que contei a meu pai que era torcedor do America, ele reagiu de forma hilária e disse que eu poderia ser tudo , menos Flamengo. Mas não contarei detalhes porque não vivemos tempos de humor sofisticado. Convenci-o a levar-me para ver essa antigo clássico alvirrubro no estádio Wolney Braune, nosso alçapão. As arquibancadas lotadas ainda contava com trinta por cento de banguenses com aquela bandinha que eu achava insuportável. Quem não conheceu a bandinha do Bangu nada sabe sobre o futebol carioca. Meu pai se exaltava no jogo, adotando o America pelo filho. O estádio, todo em vermelho e branco, tinha gente até no morro defronte. Uma festa. O jogo terminou empatado e o bandeirinha deixamos em petição de miséria. Não lembro se foi zero a zero ou um a um. O que vale é que percebo hoje que meu velho espanhol tinha um talento muito especial para deixar-me um canal 100 de lembranças.







Foi duro deixar Santíssimo, que foi sempre a minha terra no Brasil. Sobretudo ter deixado Paloma, minha cadela pastor alemã que dera-me meu pai. No carro, a caminho de São Cristóvão, as lágrimas sinalizavam minha saída do sitio onde mais fui feliz. Deixava a casa rosa e confortável, de grades brancas, onde tirei a mitológica foto com a camisa do America. Tão bonita foto que teve gente que pensou que eu era um boneco. Nasci um clássico. Deixar Santíssimo foi, definitivamente, o fim da inocência.

























Naqueles primeiros tempos no novo bairro, tendo a facilidade de ser um de localização central, eu ia aproveitando para levar minha paixão rubra onde fosse possível. Havia, naquele tempo, um programa muito original chamado “Conversa de Arquibancada”, onde participavam figuras como o Russão, fundador da torcida folgada, que conheci nessa minha ida e faleceu esse ano. Nosso bravo representante no programa era o Nilo Sérgio da torcida organizada. Desejoso de ir ao programa e sendo o garoto apaixonado que era, procurei entrar em contato com o Nilo para que ele levasse-me. Acredito que por ser uma torcida seleta e proporcionalmente menor que a de nossos rivais, temos nós rubros um instinto algo maternal uns com os outros, pois somos preciosos uns para nossa sobrevivência psíquica . Nilo topou na hora levar-me, responsabilizando-se perante minha saudosa mãe. Eu o esperava de véspera, vestido a caráter, no melhor estilo Tia Ruth e acredito, se me recordo bem ou se não está essa minha memória me inventando fábulas, que bati na porta do seu Brandão para avisar da minha façanha. E não apenas apareci no programa como fui citado como um dos “americanos presentes”. Quanto ao Russão, a torcida do Botafogo devia fazer um boneco pra ele e colocar em General Severiano , que a meus olhos de menino era o que ele me parecia: um boneco.





















Na velha foto do jornal dos esportes vejo-me sentadinho na arquibancada de São Januário, com meu boné do Mecão. Nessa época, eu era o presidente da torcida "Diabinhos Americanos" e também seu único membro. fiz uma faixa que hoje dou risadas ao recordar. Ao meu lado, em pé, um torcedor vestido de múmia protestava. O time estava em crise e a múmia fora o motivo da reportagem. Que orgulho daquele menino que fui e que saudades do tempo de meus treze anos.





















Dentre os meus amigos todos, em São Cristóvão, nenhum foi mais chegado que o Mario, que era tricolor como o pai . Tínhamos uma relação de irmandade, pois embora eu fosse o craque do Mourão Futebol Clube, time da nossa rua que criei, era Mario quem era o goleador, embora não fosse de grandes habilidades com a bola. Mas ele , porém, garantiu muitas e grandes vitórias para o nosso time. Marola, que me ensinou a fumar, estava comigo em 1982, na conquista americana da Taça Rio. Quando a torcida do Fluminense aplaudiu de pé lindamente nossa vitória, o que levou-me as lágrimas. O que, porém, faz-me retornar a essa quadra da vida e imortalizar o nome de meu amigo de puberdade, foi o bolo de quinze anos que ele fez para mim, com um escudo do America em vermelho no seu designer clássico sobre um fundo de açúcar branco. Graças ao Mecão tive a sorte de ter uma festa de quinze anos inesquecível na memória e a partir de então essa data deixou de ser especial apenas para as mocinhas, mudando um paradigma importante na história do mundo. Mario hoje é um homem de bem, um motorista de taxi que vive deixando e voltando para mulheres e cigarros, um personagem que penso daria um documentário excelente sobre a vida urbana moderna.





Não creio que elegi o Botafogo como meu pior rival por acaso. Fora a gentileza do cantor Agnaldo Timoteo, nunca tive. por mais que busque, felicidade contra o Botafogo. Num dos vários jogos protagonizados com o Maracanã vazio contra o Botafogo, fui detido antes do jogo começar. O caso é que a torcida alvinegra pegou um americano na geral na covardia atrás do gol, bem abaixo do espaço da Inferno Rubro, onde eu estava e era meu posto de combate. Quando eu e outros rubros demos com a situação de um americano sendo espancado por vários botafoguenses, descemos as arquibancadas e eu com meu copo de cerveja descartável cheio joguei lá embaixo. Outros fizeram o mesmo, porém um guarda pegou-me para Cristo com uma inflexibilidade de um nazista e fiquei detido antes do jogo começar, sendo liberado apenas ao fim da partida. Num caminhão da polícia do exército passei a tarde com mais um alvinegro com cara de nerd e um outro que havia deixado o olho de um vendedor de coca-cola arroxeado. Ficamos os quatro ali naquele microuniverso tragicômico e o jogo terminou num melancólico zero a zero. Tarde da noite ia a pé para casa por fora da Quinta Da Boa Vista, pois por dentro senti que ia ser assaltado e corri antes. O botafogo é meu corvo do azar. por isso morro de rir em suas desgraças.



FRIO NA MADRUGADA, A CAMINHO DO PACAEMBU



Não pensei que o Sergio Coelho aceitaria ir a São Paulo tão facilmente. Comentei com ele que sairia ônibus da sede para o jogo contra o Corintias pela Taça de Prata. Ele, porém, para minha surpresa, aceitou ir e no dia marcado, saímos da sede a meia noite. A caravana rubra veio em três ônibus, se não me falha a memória.Logo o ônibus mergulhou no silêncio e eu no desamparo do frio. Sentia-me um heróico e grande sofredor. Agüentei todavia, resignado, portando apenas a camisa rubra na parte de cima do corpo, encolhido no assento. Chegamos a São Paulo pela manha. Lembro-me de ter ficado um bom tempo antes de entrar no estádio na praça em frente ao estádio, observando a chegada dos corintianos. O jogo? Perdemos de dois a zero. Jogamos mal. No segundo tempo, aquela multidão da Gaviões da Fiel vieram em nossa direção, pois o Corintias atacaria para nosso lado. pensei rapidamente que "seriamos esmagados", porém os corintianos nos vieram cumprimentar cortesmente e deixaram-nos a vontade com um excelente clima de camaradagem e acolhimento.



COM SILVINHO, NO VASCO



A gente descobre fundamentos e coisas voltando ao passado. Talvez a memória seja algo educativa do nosso espírito. Sim, a memória é um portal para a poesia e para o mistério.

Silvinho ficou pouco tempo no America, infelizmente. Ele que foi o primeiro ídolo que vi jogar ao vivo. A cobiça do clube da colina o levou para São Januário.

Então, o que eu tinha ido fazer, num dia qualquer do início dos anos oitenta, em São Januário? O que estaria eu fazendo ali, num treino do Vasco? O clube cruzmaltino foi meu vizinho por décadas e nunca despertou-me entusiasmos maiores. Em 1980, inclusive, assistir o Fluminensse ser campeão carioca com o gol de falta do Edinho e eu estava com um colega vascaino na torcida do Vasco, torcendo mais para o Tricolor, cija torcida fazia uma festa como poucas vistas no

estádio.

O caso é que agora conversava com um dos maiores pontas esquerda que vi jogar. Conversava e chorava copiosamente. E do meu dramático encontro pessoal com o craque, ficou esse trecho de nossa conversa gravada no espírito.

-- Por que voc esaiu do America?

-- Bem, eu tentei ficar, mas os dirigentes do clube não me deram valor. Eles pensam como pequenos. Infelizmente.

Nossa conversa demorou uns vinte minutos a beira do campo. Essa frase. porém, "eles pensam como pequenos" ficou no meu espírito como uma ordem de despejo, uma maldição. Não perdôo dirigente medíocre dentro do America, e como houveram deles. Percebo que o clube poderia ser melhor trabalhado e defendido. A conversa com meu ídolo ali no campo do Vasco levou-me a confrontar a realidade de estar a vida do clube sempre entre o feijão e o sonho e a águia e a galinha, o sonho e a necessidade.



LUIZINHO GUERREIRO E O CRUCIFIXO DE LATA



A despeito de uma parte de nossa torcida colocar em questão a lealdade de Luizinho Gurreiro,com o clube, ele é um de nossos ícones mais emblemáticos, um símbolo de nossa história.Era em campo um lutador, oportunista, carismático, incansável, emocional, parecia multiplicar-se em campo, sem bolas perdidas. Eu o escalo no meu America de todos os tempos, Numa de suas passagens pelo clube, as coisas não estavam nada bem, os gols não saiam, eu resolvi interferir com a força sobrenatural. Eu tinha o hábito de chegar muito cedo aos estádios, doente que era.E fui, nesse dia de fé, levando um crucifixo de metal pendurado a um cordão que não me recordo como o tinha comigo. Estava decidido a passá-lo ao nosso artilheiro. Chegando na porta do vestiário, o treinador, que não era um nome conhecido,sequer me recordo contra quem jogávamos, já ia fechando a porta dizendo-me que eu não poderia falar nesse momento com o artilheiro, quando de repente Luizinho que parecia ter ouvido a conversa e do que eu vinha fazer, veio falar comigo,ignorando o treinador que segurava a porta entreaberta.

-- Pode falar garoto, o que é?

-- Luizinho, eu trouxe isso aqui para você, disse-lhe estendendo

já o meu patuá. É pra dar sorte.

-- Obrigado - respondeu levemente emocionado.Depois de ter visto e falado com meu ídolo, passando-lhe o meu modesto presente, dei-me por feliz e devo ter me sentido uma espécie de Anjo Escarlate.

CAMPEÃO DOS CAMPEÕES





Há pessoas que ousam entrar sem oração em certos projetos. Não é meu caso. Não consigo falar sem consultar os deuses do ano de 1982, o mais glorioso que já vivi em termos competitivos. Já começa com o Império Serrano , minha escola de coração, sendo campeã com o antológico “Bum Bum Paticubum Burugudum”. Madureira vibrou como nunca. E no correr do ano o America, com aquele time que reputo como um dos dez mais de todos os tempos do futebol mundial, conquistou dois campeonatos históricos, tornando-se o primeiro campeão da Taça Rio e Campeão dos Campeões, o que é o mesmo que um campeonato brasileiro copa do Brasil, nos moldes de hoje. Fosse o título ganho por um time de massa e o mesmo disputaria o título mundial, o que era muito justo. O time com certeza era um dos dez maiores do todos os tempos, algo assim como o Santos de Pelé. Começava o time com o clássico goleiro Gasperin, passava pela genialidade de Moreno e na ponta esquerda o pequeno Gilson Gênio, que fez o golaço do título histórico, depois de um jogo tenso contra o valente Guarani de Campinas, o Bugre Paulista. Das arquibancadas vi o colega que estava comigo no dia que lanchamos com o Aguinaldo Timóteo e ele acenou-me lá de baixo. Era um Sábado a noite. E Gilson chutou duas vezes até que a bola entrasse e o Maracanã visse o delírio rubro, a começar por ele, que saiu correndo como um louco pois ali todos já sabíamos que ninguém mais tiraria o título. Éramos Campeões dos Campeões, invictos e com toda justiça. Ainda sem conhecimento da vida festeira na sede, voltei para casa sozinho, mas com a sensação sem igual de torcer para o maior time do mundo. Campeão dos campeões, com certeza.







SEMIFINAL CONTRA O SÃO PAULO, 1986







Em 1986, o America realizou a sua melhor campanha de todos os tempos em campeonatos brasileiros e ficou em terceiro lugar, sendo eliminado pelo São Paulo na semifinal num ano em que o atacante Careca estava iluminado e conduziu o tricolor paulista ao título, porém contra o America no Maracanã o juiz validou um gol dele muito estranho, em que só, o arbitro, viu com certeza a bola entrar. No primeiro jogo o São Paulo venceu de um a zero e no segundo, no Maracanã lotado e vibrante, houve um empate de um a um e foi uma emoção extraordinária para mim ver o Maracanã não apenas vermelho, mas sobretudo com torcidas organizadas de Flamengo, Fluminense e Botafogo nos apoiando com faixas e bandeiras; a Inferno Rubro comandava a massa com “Um Vamos A La Playa, Oh oh oh oh oh”, “ Vamos A La Playa, Oh oh oh oh oh”. Era comovente ver o Rio vibrando com o America. Creio que time algum do mundo é capaz de tal façanha. O Maracanã tremia e o público de cinqüenta e poucas mil pessoas que apareceu no placar eletrônico foi estrondosamente vaiado. A torcida do São Paulo ficou num canto, valente mas acuada. A rivalidade entre cariocas e paulistas é grande e America leva facilmente a emoções extremas; o jogo terminou empatado e o valente time do técnico Pinheiro saiu aplaudido de pé. Por pouco não chegamos, muito pouco. Hoje relembrando a distância, parece um sonho bom. No ano seguinte, forças obscuras do futebol criaram o clube dos treze que em minha opinião estragou e descaracterizou o campeonato brasileiro. Tiveram a cara de pau de tirar o America, um dos fundadores do futebol no Brasil e terceiro lugar no campeonato do certame seguinte. O America, que nunca tinha sido rebaixado e em 1979 teve o artilheiro da competição, o centroavante César. Como disse-me uma vez um alvinegro que viajava comigo pelo interior de Minas, “O America é roubado até fora de campo”. Depois da criação do clube dos treze e de sabotarem o America dessa forma, deixei de levar o futebol brasileiro a sério e fiquei bom tempo longe dos estádios, indignado. Foi meu exílio do futebol e os anos noventa foram sombrios. Dedicava meu tempo a ler poetas e filósofos suicidas.





O CHAMADO





No livro Campos Salles 118, a Bíblia Americana, obra fundamental mesmo de ser lida por qualquer pessoa que queira conhecer a història do futebol brasileiro é dito que os clubes, assim como as pessoas, tem uma predestinação. Estava afastado fisicamente do America, sem ir aos estádios, enojado depois do episódio da criação do clube dos treze; ia pela rua São Januário com a camisa rubra da conquista da Taça dos Campões, que tem o número nove as costas. Camisa essa que é minha amiga guerreira até hoje e foi comprada no maior do mundo mesmo. Nisso passa um cara de biclicleta e para um pouco mais a frente do caminho que eu ia, ficou me olhando e esperando.

-- Você é America? -- perguntou-me com um grande e simpático sorriso.

-- Sim. mas tem tempos que não vou a jogos. depois daquela sacanagem do rebaixamento do brasileiro fiquei desiludido.

Ele contou-me que era professor de educação física no Vasco da Gama e pediu que eu fosse ao clube, pois o Dario estava promovendo um almoço para reunir os torcedores. Despedimo-nos, ele partiu na sua bicicleta e fiquei feliz de encontrar aquele americano

dos bons no caminho. Anos depois, já sendo ele meu amigo, pude reconhecê-lo no documentário "America Unido Venceras". Lá estava ele

tocando bumbo no estádio Giulite Coutinho vazio com outros heróicos americanos que ousaram acompanhar aqueles times fracos da década de noventa, uma das piores de nossa história.

O repórter do documentário pergunta porque ele era America.

-- E nosso personagem, que se chama Guilherme e é americano dos melhores, responde com essa frase lapidar:



-- Pra que que vou ser Flamengo? O Flamengo não precisa de mim. O Vasco não precisa de mim. O America precisa. Chame de altruísmo, se quiser.

Esse dom de amor louco e cavaleiresco é visivelmente lugar comum no dadivoso coração dos melhores americanos.



"Ahaahuu", o Maraca é nosso!!!!! Naquele ano de 2006, eu ia sabendo aqui e ali, misteriosamente, que o America estava fazendo uma boa campanha. Começou a despertar em mim, aos poucos, a mesma velha chama, a tanto tempo adormecida sob as cinzas da decepção e da revolta. Perguntei ao Raul... , que foi o primeiro americano que conheci na virtualidade, se o time estava bem e ele disse que sim. Até que dobrei minha resistência e ,depois de muitos anos, resolvi ouvir um jogo no rádio; foi a nossa vitória sobre o Botafogo por dois a zero. Estávamos numa semifinal e eu já havia decidido voltar para a guerra das arquibancadas e vinha articulando por uma rede social a criação de uma torcida, ainda sem nome. Já tinha conhecido muitos outros americanos e aos poucos ia reencontrando os membros antigos da Inferno Rubro, que conheci menino. Fui um dos primeiros a chegar no Maracanã ainda vazio e logo depois avistei a figuraçaa do Raul do outro lado com uma bandeira pequena nas costas, amarrada ao pescoço. Depois veio a Deby e nesse dia oficializamos a fundação da Orkut Vermelho. Deby era uma linda garota de olhos verdes, cujo pai falecido fora americano e ela vivia saudosa dos tempos que ia nos jogos com o genitor De repente, comecei a ouvir um grande rumor, uma gritaria festeira e pensei logo que era a torcida da Cabofriense que tinha chegado; pensei que pelo que ouvia íamos ter uma torcida rival na noite a altura. O barulho ia aumentando, chegando perto. Qual não foi minha surpresa quando vi adentrando nosso lado com bandeiras enormes e gritos de "Sangue" dezenas de jovens morenos, negros e brancos formando uma massa com as cores popular da Baixada Fluminense. Havia esquecido que o America agora também era, confirmando o carisma de sua singularidade, um clube da Baixada. um "Patrimônio do Rio". No jogo, percebia-se que realmente o futebol havia mudado; era mais compacto e retranqueiro sem os pontas tradicionais. O Mecão era melhor, mais técnico em campo, com Robert cadenciando o jogo. A Cabofriense avançava, porém, em contra ataques fulminantes e assim veio o empate de um a um, levando o jogo, para nosso desespero para os pênaltis. Brincávamos na arquibancada que íamos perder alguns velhinhos. Vieram os pênaltis, até que no último, com as pontas dos dedos, o nosso goleiro Everton desviou a bola, que ainda raspou na trave, para fora e ali foi como se o tempo novamente parasse, como senti em 1982.

O mais emocionante, porém, que ainda hoje ao recordar os olhos marejam em lagrimas, foi a festa dos jogadores, registrado muito lindamente no DVD gravado pelo Ribeirinho. Os jogadores correram para o nosso lado e conosco dançaram e cantaram; o craque Robert as lágrimas gritava “o futebol é maravilhoso”. Tenho certeza que em clube algum que ele tenha passado, tenha sentido uma emoção tão grande quanto a daquele dia; eles no gramado, nós na arquibancada. Raul ficou ajoelhado uns cinco minutos, em êxtase. Uma festa rubra com certeza. Bastou que o America recebesse um pouco de atenção e investimento, o que fez Jorginho num trabalho brilhante que o premiou com o convite da seleção brasileira, para que as asas do anjo escarlate voltasse a ditar as cores da cidade e nessa semana que antecedeu a grande final contra o Botafogo, no qual fomos roubados de forma escandalosa, alguns outdoors apareceram dizendo que o Rio voltara a sorrir, pois o America estava na final. Vale ressaltar que quem quiser entrar em contato com a emoção sobrenatural desse momento, basta ouvir o registro que esta no Cd "Soy Louco por Ti,America" do compositor e sambista americano Jorge do Batuque, na voz ao vivo do Luis Penido, dizendo“Deus Salve O América.”







Naquele canto tá faltando eles, e a saudade deles tá doendo em mim. “ A paródia da música feita pra Jacob do Bandolim por seu filho, poderia ritmo e letra caber para a volta emocionante do América, o verdadeiro mais querido do Brasil, ao seu lugar no Maracanã; a volta dos torcedores rubros, sempre aguerridos e surpreendentes. Tradicionais como o próprio estádio. Eu cresci, antes que os cartolas tentassem roubar o brilho do América, rebaixando um dos vinte maiores clubes do Brasil, indo ver os clássicos do time no estádio e não apenas os clássicos cariocas, uma vez que o Maracanã era o segundo estádio do América, depois do Andarai, onde recebíamos os adversários do campeonato brasileiro em jogos memoráveis. E o América bem sempre teve seu espaço sagrado sendo ocupado por sua torcida. Sempre. E na maioria das vezes sempre ganhou no grito, mesmo quando em menor número, deixando os adversários perplexos – “Como pode? “ A torcida do América impressiona e comove. Foi muito mágico depois de mais de uma década em que eu não ia a o estádio , exilado que o time ficou no Brasil pelos pilantras do futebol, ver o nosso lugar de sempre lá; velhos e novos torcedores tomando feliz sua cervejinha, o estatutário vermelho que sempre deixou o estádio muito mais bonito. Foi uma volta romântica; lindo ver o brilho nos olhos dos torcedores parecendo crianças. Uma volta à memória aos meus tempos nem tão longe de menino fanático, quando estava lá em todo clássico e todo jogo. Sou um sujeito sensato em geral. Menos com o América. O América me tira realmente do sério; minha sanidade fica comprometida, o equilíbrio precário. A saúde e a vida correm risco. Por isso vou tomando a “agua sagrada” para poder ver o verdadeiro mais querido do Brasil. È meu anestésico no estádio. Foi bom rever meus irmãos de vermelho, porque torcedor do América é como uma seita seleta, invadindo o estádio numa Segunda-feira depois de década de ostracismo para dizerem “ Nada mudou”. Curioso é que ninguém parecia velho, passados mais de dez anos. Pareciam todos crianças. Mesmo a nossa velha guarda. Aliás, o grande medo da cartolagem é a grandeza do América. Foi preciso corrupção para afastá-lo do maior do mundo; a verdade é essa. Depois que quiseram nos afastar , o maracanã diminuiu de tamanho. Praga dos Deuses. A decisão da taça Guanabara contra o Botafogo é a mais romântica e linda desde os anos setenta, quando o a América disputava a competição como favorito. Pequeno e medíocre são a cartolagem, os comerciantes nefastos do futebol , seus negros juízes e os outros. A verdade é que aquele canto do maracanã é nosso. Sempre foi e sempre será. E nós estamos voltando. Quem quiser que veja o jogo Domingo, o jogo do século. “Alo Torcida do América, aquele abraço. O MARACA é nosso. “ “Hei de torcer, torcer, torcer Hei de torcer até morrer, morrer , morrer Pois a torcida americana é toda assim A começar por mim.”







ESCREVER FINAL CONTRA O BOTAFOGO



Os dias que antecederam a final contra o Botafogo foi de muita ansiedade e tensão nas redes sociais, onde durante madrugadas eu e mais alguns rubros travamos verdadeiras batalhas de provocações antes do clássico e inventei um fake com a cara do Bart Simpson e dei uma de que ia deixar um despacho em frente a sede do Botafogo, com ingredientes os mais estranhos como um resto de charuto que já tenha sido fumado pelo Fidel e penas do Pato Donald. Devo admitir que irritei um bocado os alvinegros e no dia do jogo penso mesmo ter visto um cartaz com alguma coisa escrita que não deu para ler direito e meu nome. Senti-me um predestinado. A torcida do America marcou de encontrar-se num bar em Vila Isabel e cheguei bem cedo, o primeiro na verdade, por volta de uma hora. Já sabia que beberia todas nesse dia. Logo após o terceiro chopp começaram a chegar mais amercanos e logo estávamos em dezenas, mas houveram também a chegada em grande número de alvinegros, mas não houve confrontos, apenas gritos de guerra. Todo rival carioca admira nós, os americanos, pois a nossa resistência é sem igual. Cheguei a fazer alguns camaradas e bater algumas fotos com eles. Numa inclusive um alvinegro beijava o escudo da minha camisa e eu a dele, ambos de bandana. Chopp faz milagres. O fato é que nunca vi tanto alvinegro em minha vida. Eles eram de três a quatro para um em proporção a nossa torcida, porém nas arquibancadas foram pegos de surpresa pelo nosso buzinaço e o entusiasmo de quem não decidia um título desde 1982. Nossa torcida havia combinado de dar um buzinaço no maracanã e isso amplificava nosso barulho. Durante o primeiro tempo, mandamos nas arquibancadas e após o gol do Robert era quase certo para toda nossa torcida que seriamos campeões, pois éramos melhores como time e em campo. Infelizmente, porém, não há como dizer sem mágoa que fomos IMENSAMENTE prejudicados. Lembro-me de por a mão na cabeça várias vezes pedindo a expulsão de alguns jogadores do Botafogo que descontrolados, batiam de forma acintosa como eu nunca tinha visto nada igual . Depois, houve um dos pênaltis mais escandalosos da história do Maracanã não dado pelo juiz do goleiro do Botafogo em cima do Cris, quando já vencíamos por um a zero e o jogo era nosso. O juiz não deu. A revolta de nossa torcida e a perplexidade foi geral. No segundo tempo, parece que todos já sabiam que era inútil jogar contra os alvinegros e o juiz e eles viraram para três a um. Uma vergonha. A maior que já vi no Maracanã. Na saída do estádio, o clima amistoso enttre as torcidas tinha acabado e evitei que alguns conhecidos entrassem em conftontos que poderiam resultar em uma tragédia de proporções imprevisíveis. E na saída, pela primeira vez na vida, tirei a camisa do America para voltar para casa em paz. Vi muita covardia dentro e fora de campo. Naquele domingo para mim ficou claro que o futebol passou a ser um jogo de cartas marcadas e não quis arriscar minha integridade com uma parte da torcida alvinegra que não me pareciam gente que tenha lido nada sobre honra em dia nenhum. Há um filme lindo no yutube, chamado “uma história diferente” em que o jogo terminou um a zero e fomos os campeões da Taça Guanabara 2006. Para mim está claro que o futebol carioca é de alguns anos para cá, o mais tendencioso e pouco confiável. Pela centésima vez ou mais em sua história, o Mecão foi o campeão moral.









A DESPEDIDA DE CHICO ANÍSIO E O FOLCLORE AMERICANO







Enquanto os homens inutilmente tentam se matar e ficam se perseguindo nos níveis espirituais como almas penadas, gozo como escritor americano de uma mediunidade privilegiada de psicografia, o que me torna evidentemente modesto por natureza. Tudo é sobrenatural. Se não fosse, porque estaria eu uns dois dias antes da morte de Chico Anisio, lendo seu blog? Pelo fato dele ser americano de origem e de depois de velho fingir-se de vascaíno, o que nada mais era que um refinamento de seu humor , pois todos sabemos que um homem pode trocar de mulher, religião, Deus, mas de time de futebol após os quinze anos é completamente inconcebível. Como artista, Chico dispensa comentários: era gênio.



Suas entrevistas eram uma aula de excelência humana. “Só se pode adquirir cultura de três maneiras, lendo, vivendo e viajando, ele dizia.” Como torcedor rubro foi desconcertante de humor negro. Ele contou para Leda Nagle a suposta virada sua de casaca.



-- “Eu estava em São Januário e o America precisava de um empate. Ganhava de um a zero e faltando poucos minutos perdeu de três a um para o Náutico. Então pensei que já estava velho demais para sofrer e desisti.”

Com sua suposta viração de casaca, como se trocar de time fosse tão simples quanto trocar de personagem, o mestre das mil faces, grande ator que era, assim como Tim Maia, que foi menos sutil ao afirmar “eu era America, mas o America não ganha porra nenhuma” entram para a galeria dos ilustres americanos que supostamente não suportaram o “sofrer americano”, que é um épico completo de proporções inimagináveis para os não iniciados em ser America.













UM BAR NO CAMPO DE SÃO CRISTOVÃO, DEZEMBRO 2011



Há quase dois anos eu não via meu irmão C.L , um dos grandes rubros que tornou-se um meu familiar por adoção. Já me esperava no bar marcado.

-- Fala, cara! – disse-me ao me ver, com o rosto demonstrando a alegria de saber que um ser humano semelhante tinha chegado. Ficamos felizes quando encontramos alguém da nossa espécie. Hoje em dia, com a decadência da civilização e da cultura a maioria dos seres humanos viraram sistemas de indiferença. Se acha de tudo: padre, santo, pastor, advogado, dentista, frentista, profeta sobrenaturais, porém uma pessoa com sentimentos de empatia em que podemos relaxar é quase milagre. A maioria dos seres viraram brothers e se reproduzem com suas mentes vazias como pragas, poluindo o planeta azul. Tanto eu quanto C.L temos dificuldades de sobreviver na selva urbana do país.

-- E ai , já adotou minha idéia? – disse depois de me abraçar.

C.L costuma me pilheriar dizendo que eu deveria escrever livros com formato de bola para ganhar dinheiro no Brasil. E que o brasileiro só ia ter disciplina nos estudos e nas maneiras sociais com um Mao Tse como disciplinador, de chicote nas mãos. De fato, as escolas do país são um mistério digno dos filmes estilo sexta-feira treze, o aluno entra, estuda décadas, forma-se e sai de lá sem saber quem foi Franz Kafka, Salvador Dali, sequer lendo a obra de Machado de Assis, o que já dariam cérebros capazes de entender metáfora e ironia.

C.L pede cerveja e começamos a conversar sobre nossas futuras aposentadorias, quando o motivo que nos fez existir um para o outro vem a tona, inevitável.

-- E o América? – Ele pergunta.

Dou uma tragada no meu cigarro, jogo as cinzas no cinzeiro, sinto o enorme prazer que existe em fumar e fico com pena dos não fumantes. Pior do que ser fumante é um ser nascer, viver e morrer e não gostar de livros, cultura, sofisticação, boa música.

-- O América vai mal , maninho. Não tem capital humano de qualidade suficiente . O clube está todo dividido em facções, disputas internas e na própria comunidade existem rixas, sabotagens. Acredita que apagaram meus textos antigos? Cansei disso. Americanos de verdade, que tem alegria de viver em clube social e somar forças pensando no bem comum hoje em dia, cultivando amizade como nós , por exemplo, somos uma minoria.

Ele me cita vários nomes do que eu acho do sujeito X, sujeito Y e eu vou apenas meneando a cabeça, negativamente.

-- Não é isso, Maninho. Apenas o América é como uma mãe pra mim, algo sagrado, e não sou muito de fazer concessões nesse assunto.

-- Sei como é. O que voce acha que a gente devia fazer?

-- Fechar internamente o clube, fazer seminários com sócios, torcedores, debatendo qual seria a filosofia do clube. Como o futebol hoje é todo mercantilizado, acho que perdemos para sempre o romantismo.

-- Nós pegamos um tempo bom né?

-- Sim. E como. Aquele time de oitenta e dois poderia ser comparado ao Santos de Pelé e ao Flamengo campeão em Tokio. È que a mídia desses times são massivas. Mas acho que aquele nosso time era um dos dez mais de todos os tempos.

A gente ia conversando, comendo salaminho, derrubando garrafas de cerveja num grande estra de nostálgicos e eu via que os olhos de C.L estavam cheios de água. Nosso time agora, traído em sua grandeza luta como Daniel na cova dos leões.

-- Tá gostando da Dilma? – Ele pergunta, para não chorar.

-- Ela me parece bem intencionada, mas o país precisa ter uma filosofia de educação verdadeira, com as pessoas saindo da escola tendo cultura e gosto de ler e estudar. O Brasil precisa de uma engenharia humana, senão vamos sempre ter esse povo sem prioridades, sendo posto nos bolsos. Como pode universitários de mentes estreitas? Prefiro nem falar em política, enquanto não se pensar em criar outra humanidade. A pessoa tem que sair do primário conhecendo as doutrinas religiosas, os valores culturais, e os principais autores,quadros e música do mundo. Fora isso é tudo analfabetismo funcional. Mas apesar disso, o planeta continua lindo.

-- E querem acabar.

-- É. Mas não conseguem não. Na hora certa o joio e o trigo serão separados. Essa humanidade medíocre e sem Jesus vão cair num negro buraco cósmico .

O telefone de C.L toca, com a canção de nosso hino. Ele levanta e vai na rua para ouvir melhor. Retorna com ar preocupado.

-- Cara, é minha mãe. Tá pedindo para eu ir para casa. Ela ta recém operada. Deixa que eu pago essa – disse, já dirigindo-se ao caixa.

C.L voltou , deu-me um abraço de despedida e fiquei vendo meu mano de coração de ouro ir embora. Alguma coisa dentro de mim disse-me que ele estaria salvo e protegido de quaquer cataclisma. O coração dele ficaria intacto como um poema. Sozinho com minhas cervejas, olhava a grande teve de Plasma com um DVD que passava o filme “Era Uma Vez No Oeste”, com a música de Enio Morriconi parecendo gritar que Deus é beleza.





















































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