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cronicas-->O pião -- 13/09/2002 - 00:17 (Luís Augusto Marcelino) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O pião

- Tio! Me ensina a rodar pião?

Eu estava num banco de praça folheando uma revista de informática - o que, cá pra nós - não é o tipo de leitura que combine com o aconchego de uma praça, mesmo que dela exale o odor de xixi de viralata e que suas calçadas estreitas e emporcalhadas exibam todo o tipo de entulho deixado pelos frequentadores: palitos de picolé, papéis de bala, guardanapos amassados, copos e latas descartáveis, coisas e mais coisas indecifráveis.

Fazia tempo que alguém não me pedia algo com tanta doçura e, mesmo não tendo lá muito jeito com crianças, resolvi fechar a revista e dar ao menos um pingo de atenção ao garoto. Devia ter lá uns oito, nove anos. Estourando, dez anos de idade. Tinha uns cabelos muito pretos e lisos, um nariz pontiagudo e uma boca vermelha carnuda. Usava roupas boas e limpas e um desses tênis importados que custam quase um salário mínimo. Estranhei o fato de ele não saber rodar pião, a princípio. Mas depois lembrei de como as brincadeiras da minha época estão desaparecendo com o tempo. Surgem outras. Em sua maioria, brincadeiras eletrónicas e sofisticadas. Não sei se melhores ou piores, isto pouca gente poderá comprovar um dia. Não se é criança duas vezes em épocas diferentes. Vai saber o que é melhor? Larguei a revista sobre o banco e o encarei. Fui levado imediatamente à Rua Cruz das Almas dos anos 70.

Houve duas coisas marcantes na minha infància. O primeiro dia de aula foi traumatizante. Minha professora, finada Dona Naná - que Deus a tenha! - parecia uma chefe de conservatório feminino. Alta, muito loira, usava óculos fundo de garrafa e tinha umas mãos imensas. Poucos minutos até a molecada se arrumar já soltou um berro estrondoso que fez o mais falante dos meninos silenciar como se fosse testemunha da máfia calabresa. Mijei nas calças, sorte ela não ter percebido. Fui chorando para casa e não queria voltar no dia seguinte, mas cá estou alfabetizado e agradecido à Dona Naná pelos primeiros traços ainda tremidos.

A outra foi um torneio de pião no terreno baldio do Moisés Louco, um velho que, à época, parecia ter uns oitenta anos. Se nos pegasse usando seu terreno como palco de um torneio de pião, certamente dispararia sua espingarda de sal contra nós. Era a minha rodada final. Seis piões descansando no chão batido, esperando meu arremesso fatal. Um deles, pintado de azul e vermelho, sem a cabeça, pertencia ao Quinzinho, campeão incontestável dos últimos confrontos. Eu o queria, seria minha glória. Enrolei a fieira calmamente. Volta por volta pensava no pião azul repousando no meu guarda-roupas velho. Manuseei a outra ponta da fieira em meus dedos ainda curtos, mirei os outros, posicionei meu braço para trás e... zummm!!! Lá se foi minha flecha antes certeira rumo ao matagal, traída pela fieira velha e desgastada que se partiu após meu arremesso.

- Não sei rodar pião, garoto! - fui austero com o pobre menino.

- Que droga, tio!
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