Toda vez que eu acabo de ler um livro, tenho vontade de começar a ler outro imediatamente.
Num dia de verão, bastante úmido, muito calor. Entre as árvores, um barulho de folhinhas sendo pisadas, numa mesma freqüência, cada vez mais próximo…
Um adereço de maracatu no chão, um cachimbo na mão. Quem se aproxima é o legendário Saci, um pouco desconfiado. Fita o outro sujeito com curiosidade. O Saci escuta uma música. Um passarinho azul devagarzinho vem voando e pousa no ombro dele. Desequilíbrio. O Saci cai no chão…
Com o barulho da queda o outro sujeito percebe o Saci, e se levanta então da pedra, ele também escuta a música, e se dirige para ajudar. Dá a mão, o Saci levanta. Agora o passarinho está pousado no cachimbo.
“ Saci, Saci, que prazer te encontrar! ”
O Saci não gostou nadinha daquelas intimidades, quem era aquele que estava ali na mata sentado numa pedra, lendo “ O Pequeno Príncipe ”, com um colar bonito, com um sorriso alegre, que teve a ousadia de ajudá-lo?
“ Saci , você está escutando esta música? ”
O Saci nada fala, por enquanto só pensa. Sua testa está suada. Num gesto rápido demais ele espanta o passarinho e pega o cachimbo.
“ Meu nome é Gil. Você é rápido hein? ”
O Saci nada fala, somente coça a cabeça.
“ Sabe Saci, esta música na mata,… são vozes do passado, dos antigos quilombos, todos que foram destruídos, você está escutando? ”
O Saci nada fala, estende a mão e toca o colar de Gil.
“ Gostou? É seu, pode ficar… Este eu ganhei do Pierre, mas vai ficar muito bem em você …”
Subitamente o passarinho volta, mas agora pousa no ombro de Gil, que sorri alegre.
Com o colar no pescoço o Saci também sorri. Segurando o cachimbo enxuga a testa.
E num piscar de olhos some na mata.
Gil lamentou não ter tempo de perguntar se ele gostava de marmelada. Voltou para a pedra e terminou de ler. Teve vontade de ler mais. Lamentou ter deixado seus outros livros na Bahia.
Recolheu então aquele adereço no chão e ficou observando o resto do dia.
Maracatu, coisa linda.
***
|
