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Contos-->Nada além de um pesadelo -- 16/12/2002 - 17:44 (Javier Martínez) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Enquanto estava passeando pela Praça Central, Maria viu um senhor de uns quarenta anos ao lado da estátua, perto da pérgula de trepadeira de flores brancas. Estranhou o fato dele ignorar o aviso “proibido pisar na grama”, tão verde, tão parque. A estátua de um herói de alguma guerra que só servia para dar sombra e ele estava a procurar a vontade de uma tarde macia naquele canto. Olharam-se nos olhos e não dava para perceber se era mais uma paquera de rua ou um simples acaso. Não comentou nada com o marido.

Essa noite Maria teve pesadelos que decifraram o roteiro da vida de uma pessoa desconhecida, no sonho não conseguia distinguir o rosto, mas o corpo era, por vezes, normal. Acordou de madrugada com a impressão do susto e desceu até a cozinha para beber um copo d’água. Voltou para o quarto e dormiu, novamente, com a incerteza de retomar a calma.

Dia seguinte, pesadelo, dia subseqüente, pesadelo. O problema não passava, agravava-se. Sempre aparecia o emblemático atormentador das madrugadas para atrapalhar o sonho. Mas, nunca revelava sua identidade. Marcou uma consulta, foi ao psicanalista e explicou o que estava acontecendo. Ele receitou calmantes e depois de uma semana estava retomando sua tranqüilidade noturna com a calma fictícia dos remédios.

Maria deixou de consumir essa química depois de ter resolvido o problema. Meses de tratamento para engordar o orçamento do doutor. O esposo dela nunca soube o que aconteceu já que eles eram muito independentes e cada um respondia pelos seus atos sem o compromisso de compartilhá-los.

Uma noite foi dormir e apagou os olhos com o cansaço do cotidiano. O relógio marcava três e quinze e, subitamente, um calafrio abraçou Maria. O seu marido estava respirando e roncando ao mesmo tempo. O seu nome “Maria” ecoou na cabeça prestes à enxaqueca. Não era a voz do esposo.

Ela acendeu a luz e os olhos dele pareciam duas bolas brancas, ela gritou e o marido acordou. Nada além de um pesadelo. Toda madrugada acontecia a mesma coisa. O nome “Maria”, o grito, o acordar repentino do esposo. Maria voltou a freqüentar o psicanalista e a consumir remédios. Ela estava começando a desconfiar da situação.

Descrente da situação e descrente da sua loucura, visitou uma consultora espiritual que confirmou que o marido estava possuído e aconselhou-a a fazer um trabalho urgente para evitar uma tragédia. O trabalho começou e na mesma noite ouviu o marido, com a voz de outra pessoa, dizer,

- Não Maria! Não faça isso!

Essa noite ela saiu da cama devagar e desceu até a cozinha. Pegou uma faca de açougueiro escondeu a faca na saída de cama e voltou com a intenção de acabar com o pesadelo. Quando chegou o esposo, ou o espírito que o possuía, olhou para ela com os olhos brancos e assustadores e murmurou,

- Sei o que você esconde!

Foi o suficiente para Maria enfiar a faca no pescoço do marido, que acordou por última vez.

Entregou-se à polícia e comentou o que estava acontecendo, com o marido, com o espírito. Arranjou um advogado picareta que fez a pior defesa que a promotoria já viu. Pegou trinta anos de prisão por causa de um jogo que o advogado não soube utilizar. Alegar insanidade temporária, criar um marido ameaçador, ou até castigos de almas penadas.

Enfim, via-se Maria passar de uma vida a uma subvida. A companheira de cela tinha menos castigo pela frente e com sorte, sairia na condicional como ela gostava de lembrar à Maria.

Mas os pesadelos voltaram e o nome fazendo eco na cela foi dando mais medo à condena. Maria não olhava mais para a cara da colega. Parecia um jogo mórbido, chamava-a toda noite. A colega estava possuída também.

Uma noite esperou as luzes apagarem e a colega dormir. Com um barbante que achou no pátio deu um nó no pescoço dela e aguardou seu desespero por uma gota de ar. A noite acabou com a loucura gritando pelos corredores e uma camisa-de-força segurando a revolta de Maria.

Foi trasladada para um hospício com uma crise de nervos. Dentro da sala fechada do hospital psiquiátrico, mais uma vez começou a vivenciar pesadelos que se repetiam e repetiam o desespero das madrugadas. Ouvia-se “Maria” em todos os cantos do quarto. Uma tortura insuportável.

Uma madrugada Maria, totalmente desesperada, chamou os seguranças e no momento em que a porta se abriu, com força brutal, empurrou os dois funcionários. Deu-se à fuga pelo corredor do prédio e entrou no banheiro masculino do quinto andar. A única janela sem grades que dava à rua. Pulou através dela e continuou a correr, deixou atrás seu corpo desmanchado no chão, desintegrado, colado à calçada. Pouco tempo depois, parou de correr e perdeu a noção de onde estava.

Maria começou a lembrar das imagens que tinha vivido de forma estranha. Relembrou o tormento desses últimos meses e começou a rever os lugares que formaram parte desse inferno. Na sua última passagem pelo mundo material, o quarto do hospital psiquiátrico, deparou-se com alguém.

- Olá Maria, lembras de mim? Estava esperando-te. Tu foste a única a me ver na Praça Central ao lado da estátua. A partir desse momento tentei falar contigo através dos sonhos ao que reagiste com medo. Tentei falar através da boca do teu marido e o apagaste. Tentei falar pela boca da tua colega e me calaste. Tentei me expressar no quarto. Nunca quis fazer-te mal. Precisava da tua ajuda, mas fugiste. Agora, podes seguir teu caminho. Não podes me ajudar. Eu deverei continuar aqui indefinidamente.
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