A Funai e o indianismo do miolo mole reclamaram. Preferem a desordem, o
mundo em que tudo é possível.
Reproduzo abaixo a portaria de Adams, que incorpora as 19 condicionantes — a
rigor, a única coisa boa decidida naquele julgamento.
Menezes Direito era um homem sagaz. Ao perceber que Raposa Serra do Sol já
havia caído presa da irracionalidade e que aquele processo era irreversível,
cuidou do ordenamento jurídico de demandas futuras.
Leiam a portaria e notem que as exigências são apenas matéria de bom senso.
Volto para encerrar.
PORTARIA Nº 303, DE 16 DE JULHO DE 2012
Dispõe sobre as salvaguardas institucionais às terras indígenas conforme
entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal na Petição 3.388 RR.
O ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO, no uso das atribuições que lhe conferem o art.
87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal e o art. 4º, incisos
X e XVIII, da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, e
considerando a necessidade de normatizar a atuação das unidades da
Advocacia-Geral da União em relação às salvaguardas institucionais às terras
indígenas, nos termos do entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal
na Petição 3.388- Roraima (caso Raposa Serra do Sol), cujo alcance já foi
esclarecido por intermédio do PARECER nº 153/2010/DENOR/CGU/AGU, devidamente
aprovado, resolve:
Art. 1º. Fixar a interpretação das salvaguardas às terras indígenas, a ser
uniformemente seguida pelos órgãos jurídicos da Administração Pública
Federal direta e indireta, determinando que se observe o decidido pelo STF
na Pet. 3.888-Roraima, na forma das condicionantes abaixo:
“(I) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas
terras indígenas (art. 231, §2º, da Constituição Federal) pode ser
relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, 6º, da Constituição,
relevante interesse público da União, na forma de lei complementar”.
“(II) o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos
hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do
Congresso Nacional”.
“(III) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas
minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional
assegurando-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da Lei”.
“(IV) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação,
devendo, se for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira”.
“(V) o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de
defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais
intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração
de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas
de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da
Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente
de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI”.
“(VI) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no
âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de
consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI”.
“(VII) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de
equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte,
além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela
União, especialmente os de saúde e educação”.
“(VIII) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação
fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade”.
“(IX) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá
pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela
terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser
ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e costumes dos indígenas,
podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI”.
“(X) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido
na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições
estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade”.
“(XI) devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de
não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições
estabelecidas pela FUNAI”.
“(XII) o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser
objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por
parte das comunidades indígenas”.
“(XIII) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não
poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas,
equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer
outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham
sido excluídos expressamente da homologação, ou não”.
“(XIV) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de
qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto
e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios (art. 231, § 2º,
Constituição Federal c/c art. 18, caput, Lei nº 6.001/1973)”.
“(XV) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos
tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca ou coleta de
frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art.
231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º. Lei nº 6.001/1973)”.
“(XVI) as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades
indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades
existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49, XVI e
231, § 3º, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº
6.001/1973), gozam de plena imunidade tributária, não cabendo à cobrança de
quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns e ou outros”.
“(XVII) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada”.
“(XVIII) os direitos dos índios relacionados às suas terras são
imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231,§ 4º,
CR/88)”.
“(XIX) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento
administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus
territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento”.
Art. 2º. Os procedimentos em curso que estejam em desacordo com as
condicionantes indicadas no art. 1º serão revistos no prazo de cento e vinte
dias, contado da data da publicação desta Portaria.
Art. 3º. Os procedimentos finalizados serão revisados e adequados a presente
Portaria.
Art. 4º. O procedimento relativo à condicionante XVII, no que se refere à
vedação de ampliação de terra indígena mediante revisão de demarcação
concluída, não se aplica aos casos de vício insanável ou de nulidade
absoluta.
Art. 5°. O procedimento relativo à condicionante XI X é aquele fixado por
portaria do Ministro de Estado da Justiça.
Art. 6º. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
LUIS INACIO LUCENA ADAMS
Encerro
A Funai, o Conselho Indigenista Missionário e os ongueiros de índios pedem a
revogação da portaria. Repudiam especialmente as condicionantes XVII e XIX:
a primeira proíbe a Funai de ampliar áreas já demarcadas. Boa parte da
bagunça que aí está decorre justamente de ampliações arbitrárias. A XIX
estabelece que, independentemente da fase em que esteja a demarcação, os
entes federados — isto é, União, Estados e Municípios — têm o direito de
participar dos debates. Acaba a farra de a Funai decidir sozinha,
olimpicamente, as demarcações.
Vale dizer: as 19 condicionantes lembram que o Brasil é uma República, em
que nenhum Poder é soberano — a Funai muito menos, que nem Poder é!
Por Reinaldo Azevedo
http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/nas-maos-de-barroso-
futuro-ministro-do-stf-a-paz-ou-a-guerra-entre-indios-e-produtores-de-
comida/
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