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Ensaios-->Felicidade clandestina e uma esperança -- 03/04/2010 - 14:14 (Fabrício Sousa Costa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Estudo comprado entre os contos FELICIDADE CLANDESTINA E UMA ESPERANÇA de Clarice Lispector


Os contos UMA ESPERANÇA e FELICIDADE CLANDESTINA trazem a tona a reflexão sobre o comportamento humano. Aquele apresenta uma relação entre ser humano versus ser humano; é, portanto, do ponto de vista atual, processo comum de se observar, principalmente, por que ocorre quase que diariamente em relações parecidas. O segundo apresenta interação existente entre ser humano e um inseto; pode-se dizer que a relação de ensinamento partiria do “mais forte” para o “mais fraco”, o que é evidentemente falso, pois a relação de ensinamento que do inseto se extrai permite uma mudança da visão do garoto e, ainda, de sua mãe.
O conto UMA ESPERANÇA se inicia misterioso e chamativo. Um inseto cujo nome esperança despertou a atenção de um garoto na sala de sua casa. Esperança simboliza esperança? O início do conto é marcado pelo trocadilho feito pela narradora.

(...) Aqui em casa pousou uma esperança. Não a clássica, que tantas vezes verifica-se ser ilusória, embora mesmo assim nos sustente sempre. Mas a outra, bem concreta e verde: o inseto (...) página 1.

Tudo é muito propício para a realização de tal analogia: esperança é simbolizada pela cor verde; o inseto esperança traz sorte para o lar. A analogia realizada pela mãe leva o filho também à reflexão acerca do despertar levado pelo inseto. O garoto também bastante introspectivo filosofa incentivado pela presença do inseto.

(...) Ela só tem alma, explicou meu filho e, como filhos são uma surpresa para nós, descobri com surpresa que ele falava das duas esperanças (...) página 1.

A mãe marca a diferença existente entre as esperanças no início do conto levando o ar filosófico para a sala da casa.

(...) Uma esperança! E na parede, bem em cima de sua cadeira! Emoção dele também que unia em uma só as duas esperanças, já tem idade para isso (...) página 1.

O adjetivo ilusória caracteriza o substantivo esperança pertencente ao primeiro período. Esse adjetivo traz um caráter relativamente negativo para a palavra, pois, segundo o discurso, se a esperança é ilusória, está distante da realidade. A última oração do mesmo período completa o discurso negativo, visto que o sentido do verbo sustentar está diretamente ligado à ilusão criada para manter a motivação de lutar pela vida.
Já o conto FELICIDADE CLANDESTINA aborda a mesma temática de uma maneira diferenciada. Nele, percebe-se que a narradora é a personagem principal. Ela é a vítima da trama que se monta na narrativa. Logo no início, há a descrição dos personagens secundários, a fim de montar o ambiente que servirá de integrante ativo do conflito.
*
A protagonista descreve suas características e as de suas colegas, que juntas servirão de confrontadoras da outra personagem, a má, da história. A personagem má, fisicamente, é descrita como um ser feio, diferentemente das outras meninas descritas. Porém algo muito importante é inserido na narrativa, a fim de equilibrar as diferenças existentes entre elas.
*
As colegas e a protagonista eram bonitas e amantes da literatura, mas sem condição para adquirir o objeto da paixão, pois, nesse ponto, invejavam a menina feia ; a outra era feia e não simpatizava muito com a leitura, mas o pai era dono de livraria. Analisa-se que de um lado as colegas tinham algo preterido pela gordinha, do outro a gordinha tinha algo preterido pelas colegas. O ponto principal do jogo que se formará baseado na relação descrita acima evidencia a proximidade com o primeiro conto, principalmente, no sentido da esperança. Será ela misturada com o amor às letras que farão da protagonista uma ardente guerreira em busca do objetivo.
A narrativa ainda apresenta numerosos trechos em que a protagonista-narradora entra em conflito com a realidade para conseguir refletir sobre a situação pela qual passava. As reflexões descritas marcaram belas passagens comentando indiretamente o comportamento humano, além de confrontá-lo com o comportamento da narradora, observando os dois lados de uma mesma situação.
O conto UMA ESPERANÇA desenvolve, em sua narrativa, nos personagens uma admiração. Infere-se que a admiração poderia ser com o inseto ou poderia ser com a possibilidade de acreditar em algo, ter coragem. Essa relação aparece em quase todo o conto com a intenção de induzir o leitor a também refletir sobre a questão. Em diversos fragmentos, há o trocadilho.

(...) – Ela é burrinha, comentou o menino.
- Sei disso, respondi um pouco trágica.
- Está agora procurando outro caminho, olhe, coitada, como ela hesita.
- Sei, continuei mais infeliz ainda (...) página 1.

A mãe, como mais experiente, portanto com maior facilidade de perceber a relação, paralelamente à fala do filho, faz diversas comparações entre a situação vivenciada naquele momento com o inseto e a dos atos de sua vida. Até o garoto ensaia inocentemente – ou inconscientemente – a comparação entre o inseto e a vida.
Percebe-se que a palavra esperança foi escolhida pela autora com a intenção de levar o leitor à incerteza quanto ao significado verdadeiro da palavra. Porém o leitor superficial, naturalmente, fará pouco caso da relação existente no texto, às vezes por ingenuidade ou por inexperiência. Já o leitor profundo associará à leitura simples uma leitura mais engajada com possibilidades de interpretação subjacentes ao texto. O jogo de palavras, além de marcar o texto com um forte caráter literário, o aproxima da descoberta da complexidade do texto.
Avalia-se que, conforme o texto, a visão da mãe, em relação à esperança, é de pessimismo; muitas vezes trágica. Essa atribuição pessimista à esperança marca uma profunda reflexão realizada por ela e que justifica o adjetivo ilusória do primeiro parágrafo. Por outro lado, o final do conto traz uma análise diferente da atribuição pessimista ligada somente à esperança. A outra vertente coloca o ser humano como responsável ativo para a derrocada da esperança ou como culpado das realizações negativas vivenciadas.

(...) Uma vez, aliás, agora é que me lembro, uma esperança bem menor que esta, pousara no meu braço. Não senti nada, de tão leve que ra, foi só visualmente que tomei consciência de sua presença. Emcabulei com a delicadeza. Eu não mexia o braço e pensei: “e essa agora? Que devo fazer?” (...) página 2.

A inércia, explícita no texto, deixa clara sua participação na negativibilidade das ações motivadas pela esperança, colocando o ser como sujeito ativo das mudanças ocorridas na vida. A analogia é “nada fiz”; “nada aconteceu”. Verdadeiramente, como diria o pré-socrático Heráclito, nada gera nada. Ação gera mudança. Esperança sem ação gera permanência do estado atual, ou seja, não há mudança efetiva.
O conto FELICIDADE CLANDESTINA aborda a mesma temática embora tenha um desdobramento diferente do do conto anteriormente analisado. A menina bonitinha pede um livro do qual gostava bastante. O pedido citado é o causador do conflito existente na obra. Ele transforma a vida das duas meninas: a bonitinha se enche de alegria; a gordinha se enche de perversidade. Paradoxalmente, o livro é o objeto de massacre ao mesmo tempo em que é o objeto de prazer.
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A menina bonitinha se cresce de admiração com a possibilidade de ter o livro tão desejado. Somente a possibilidade foi suficiente para transformar sua vida por meio do comportamento extasiado. Assim como no conto UMA ESPERANÇA, a menina bonitinha recorre a esse sentimento para dar rumo à vida. Bastava a esperança para ela viver um sonho encantado. A alma dependia do sonho de ter o livro para existir.
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Na primeira visita à casa da menina gorda. A menina bonitinha se deparou com a maldade da garota. A decepção tomara de conta do sonho de ter o livro. A esperança levou um golpe que poderia ser fatal. Porém o fato que difere um conto do outro é justamente o da intensidade de retenção da esperança. No primeiro conto, a esperança, além de ser vista com um ar pessimista, não recebe o esforço da ação para impulsioná-la a chegar ao objetivo. No segundo conto, a esperança sofre agressões, mas não sucumbe a pressão pessimista de sentir-se enganada, além de receber a contribuição da ação de deixar-se iludir pela promessa e todo dia ir à casa da menina gorda para receber o livro emprestado.
*
A insistência da menina bonitinha revela que o grau de intensidade da esperança é fundamental para subsidiar a motivação pela vida. Não se analisa apenas a esperança da garota em receber de empréstimo o livro, porém todo sentido que envolva a esperança como forma de manter objetivos à vida do ser, pois são os projetos de vida que fazem existir ou que dão sentido a ela.
Percebe-se que a reflexão trabalhada por Clarice Lispector em seus personagens contribui para conduzir o leitor atento à realidade da vida moderna – para serem mais objetivo.
As reflexões realizadas pela garota bonita contribuíram para o seu crescimento como ser humano, uma vez que ela tenha percebido a intenção de sua antagonista. As reflexões que ela fazia contribuíram também para que percebesse quanto a leitura daquele – ou a leitura em geral – era importante em sua vida. Sentia-se necessidade, quase que desesperada, de possuir aquele objeto, que era mais que de consumo, era um objeto essencial, vital, de extrema importância para a existência.
O conto Uma esperança atinge o ápice do conflito existente em seu enredo no momento da salvação da esperança. É importante salientar que o trocadilho entre as esperanças ocorre até o final da história. Com isso, a reflexão em que a autora pretende levar o leitor se perpetua durante o conto inteiro. Conquanto que a tendência seja conduzir o leitor a uma interpretação singular da obra, o mesmo tem a capacidade, e é incentivado, de se aprofundar nas entrelinhas e extrair a significação implícita.
A esperança é posta em perigo na sala da casa de cada personagem. Eles ficam em polvorosa para evitar o massacre. A aranha representa o pessimismo, a falta de ação, tudo o que impede o ser de prosseguir a caminhada com expectativas positivas.

(...) Não uma aranha, mas me parecia a aranha. Andando pela sua teia invisível, parecia transladar-se maciamente no ar. Ela queria a esperança. Mas nós também queríamos e, oh! Deus, queríamos menos que comê-la. Meu filho foi buscar a vassoura. Eu disse francamente, confusa, sem saber se chegara infelizmente a hora certa de perder a esperança (...) página 2.

A aflição do garoto é demonstrada claramente na obra. A importância da esperança para o garoto e para a mãe demonstra o valor real que ela possui para a existência. Após a morte da aranha a esperança passa a reinar novamente na vida daquelas pessoas. Infere-se que, no final do conto, houve uma mudança no valor que representa a esperança para a vida. A diferente visão no início e a do final, em princípio, parece paradoxal, no entanto, evidencia um grau maior de consciência por meio da reflexão realizada durante todo o desenrolar da narrativa.

(...) O menino, morta a aranha, fez um trocadilho, com o inseto e a nossa esperança. Meu outro filho, que estava vendo televisão, ouviu e riu de prazer. Não havia dúvida: a esperança pusara em casa, alma e corpo (...) página 2.

Não se percebe somente aquisição da consciência, mas, também, o reconhecimento da importância da ação em busca da esperança. Essa consciência ficou evidenciada por meio de um elemento implícito ao último parágrafo.

(...) Em verdade nada fiz. Fiquei extremamente quieta como se uma flor tivesse nascido em mim. Depois não me lembro mais o que aconteceu. E, acho que não aconteceu nada (...) página 2.

O fato de ficar quieta e não acontecer nada pode ter sido o ponto final e o reconhecimento definitivo da esperança aliada à ação para se atingir o objetivo.
A salvação evidenciada no conto FELICIDADE CLANDESTINA ocorreu no momento em que, pessistentenmente, a menina bonita vai à casa da gordinha a fim de conseguir adquirir o objetivo de seu desejo, que já havia cambiado para objetivo de terrorismo.
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Parecia que mais uma vez teria uma hemorragia na alma causada pela decepção de ser novamente enganada. O que mais a maltratava não era o fato de ser feita de idiota, mas o simples fato de não adquirir a posse provisória daquele bem essencial para sua vida. Clarice Lispector põe às vistas do leitor a decepção que se reerguia de uma dimensão não muito natural, tomava de conta da sua existência.
O momento da chegada da mãe da gordinha parece ser mais que o divisor de águas; marca a inversão de papeis. Não que a menina bonitinha passasse a exercer todo aquele mal, mas que tiraria a angústia dela e finalizaria a relação de prazer, por meio da perversidade, exercida pela menina feia.
Em vez de desistir do livro, a menina persistiu até consegui-lo. Nesse caso, a esperança venceu a maldade.
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O prazer de ter o livro fez com que ela eternizasse aquele momento. Serviu de aprendizado para quem busca algo sem perder a esperança.
Os dois contos mantiveram, mesmo que por caminhos diferentes, a mesma linha de abordagem. A proximidade entre os dois contos pode não ser tão evidente, por esse motivo que foi proposto deste ensaio. A intenção foi levantar pontos para que fossem cruzados e se extraíssem linhas paralelas às abordagens. Os pontos analisados coincidiram com os recursos eleitos para evidenciar a proximidade entre os contos. Tanto em um quanto no outro, a esperança correu risco de desaparecerem, entretanto não morreu. Ela se tornou a virtude da conquista para alcançar os objetivos.
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