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Ensaios-->Filosofia Contemporânea -- 03/04/2010 - 14:49 (Fabrício Sousa Costa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Disciplina: Filosofia
Profº Fabrício Sousa

MÓDULO IV
www.michelangelo.edu.br
PRODUÇÃO GRÁFICA: MAURÍCIO COSTA / EQUIPE EAD
1
O modo de fazer filosofia na contemporaneidade

Reflexão Inicial

É sabido que existem muitas maneiras de conceber
fi losofi a. No entanto, ao primar pelo estudo existencial
da fi losofi a, implica a escolha de uma discussão de uma
determinada maneira de trabalhar fi losofi camente. Assim,
ao se escolher uma forma de pensar, não se focariam outras.
Houve, portanto, um modo de fi losofar que deixa de lado todas
as fi losofi as que não tenham uma ligação com a vida concreta.
Filosofar é compreendido, em nosso estudo atual, como uma
atividade ou uma postura de vida, que conduz à refl exão,
como um modo de existir que revela o sentido da vida, como
um exercício que ensina à conquista de si próprio, além de
se aprender a pensar fi losofi camente a partir de si mesmo.
Debatendo com os fi lósofos os temas abordados nestas quatro
unidades, aprende-se a posicionar-se e a escolher o caminho
das verdades subjetivas.
No entanto, se se optar por uma determinada maneira
de conceber fi losofi a, não se está, por essa mesma opção,
excluindo todos os outros modos de fazer fi losofi a. Foi por
esse motivo que, em todos os fi lósofos até agora estudados,
embora alguns não pertençam propriamente ao pensamento
chamado existencial, houve uma preocupação substancial
para enfocar, sobretudo, os elementos de sua fi losofi a que
manifestem esse afl oramento existencial.
Nesta última unidade, houve a necessidade de reduzir
o número de fi lósofos a serem estudados. Haverá um debate apenas com Nietzsche e Heidegger. Esses dois fi lósofos,
cada um a seu modo, desconstroem os pilares da metafísica tradicional e fazem uma leitura da realidade e do
homem totalmente nova. Heidegger receberá atenção especial, por ter sido ele um dos que mais refl etiu sobre o
tema do curso. Além de seu pensamento ser caracterizado como existencial, ao realizar o trabalho de desconstrução
e reconstrução de toda a fi losofi a anterior. Filosofar não seria mais buscar verdades defi nitivas, eternas, fundadas em
algo absoluto, como na metafísica tradicional. Heidegger procura encontrar um pensamento e uma linguagem que
possam falar da verdade e do ser como acontecimentos, isto é, a verdade e o ser se dão dentro da história, são eventos
históricos que nunca acontecem sem o concurso do homem.
Disciplina: Filosofi a
Profº Fabrício Sousa
MÓDULO IV
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2
Nietzsche e a desconstrução
da metafísica tradicional
Friedrich Nietzsche formulou um pensamento que
talvez seja o mais polêmico da fi losofi a moderna.
Com a frase Eu penso, logo existo, Descartes corta toda
estrutura anterior na qual o homem era apenas um refém
do supra-sensível, do Uno absoluto, de Deus e inaugura
um postulado onde o homem assumiria, ainda de forma
tímida, a responsabilidade por sua existência. Para
Nietzsche, a fi losofi a até então se baseava na metafísica
tradicional (quando se fala de metafísica tradicional, falase
do pensamento que prevê uma forma supra-sensível
responsável pela incidência das ocorrências terrenas, ou
seja, o homem seria guiado pelas idéias absolutas, que por
serem absolutas eram perfeitas) onde subtraía do homem
atributos essenciais à sua existência. Portanto, a Filosofi a,
simbolicamente, recorre ao Martelo nietzschiano para
demolir a metafísica tradicional a fi m de explicar a
realidade a partir de uma outra perspectiva. Onde, nesse
caso, o homem seria um outro homem criado fora dos
preceitos sociais existentes e forjados pela metafísica
tradicional. Um homem capaz de superar-se a si mesmo e
criar valores onde ele jamais subjugaria o próprio homem.
Para isso, seria necessária a morte de Deus, pois este é o
único responsável pela usurpação da realidade.
Se, para Nietzsche, a falsa moral social criada, sobretudo, a partir da infl uência determinadora da religião
representava a manipulação castradora do homem, este deveria superá-la para se libertar dessa prisão à qual fora
submetido. Essa ocorrência somente seria efetivada se antes se estabelecesse a morte de Deus. Percebe-se que
Nietzsche não matara Deus, no entanto, evidenciara que o comportamento moderno fora o verdadeiro responsável
pela morte dele. O pensamento de Descartes foi a primeira contribuição, uma vez que Deus saiu de cena como o
verdadeiro movedor da realidade e cedeu essa função ao homem que pensa (EU penso, logo existo!). A partir daí,
o homem foi assumindo paulatinamente, embora de maneira tímida, a responsabilidade por sua própria existência.
A evidência maior viria do espaço que a religião perdera nas sociedades em todo mundo. O homem moderno
estava demasiadamente seduzido que perdera sua piedade. Deus estava (e está) sendo subjugado pela sua “criação”,
segundo Nietzsche. Constata-se que ele não matara Deus, contudo, evidenciara sua efetiva morte social. Em sua
obra mais expressiva, Assim falava Zaratustra, ele relata o episódio acima mencionado: “(O homem louco) – Não
ouviram falar de um homem louco que, na clara manhã, acendia uma lanterna, corria para o mercado e gritava
incessantemente: “Procuro Deus! Procuro Deus!” – Mas como lá estavam reunidos justamente muitos daqueles
que não acreditavam em Deus, provocou um grande riso. Será que se perdeu? Dizia um. Perdeu-se como uma
criança? Dizia outro. Ou está escondido? Tem medo de nós? Embarcou? Emigrou? – Assim gritavam e riam uns
para os outros. O homem louco saltou para o meio deles e trespassou-os com seu olhar. “Para onde foi Deus?”,
exclamou, “Vou dizer-vos! Matamo-lo – vós e eu! Todos nós somos seus assassinos! Mas como fi zemos isto? Como
conseguimos esvaziar o mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte inteiro? Que fi zemos quando
desligamos esta Terra de seu Sol? Para onde se move ela agora? Para onde nos movemos nós? Longe de todos os
sóis? Não caímos constantemente? E para trás, para os lados, para frente, para todos os lados? Há ainda um acima
e um abaixo? Não erramos como através de um nada infi nito? Não nos bafeja o espaço vazio? Não arrefeceu?
Não vem cada vez noite mais noite? Não têm as lanternas de ser acesas de manhã? Não ouvimos ainda nada do
barulho dos coveiros que sepultam Deus? Não cheiramos nada da decomposição divina? – também os deuses se
decompõem! Deus morreu! Deus permanece morto! E nós matamo-lo!
Disciplina: Filosofi a
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3
Continuação...
Como nos consolamos, os assassinos de todos os assassinos? Aquilo que de mais sagrado e mais poderoso
o mundo até agora possuía sangrou sob nossos punhais – quem nos limpa deste sangue? Com que água nos
poderíamos purifi car? Que festas expiatórias, que jogos sagrados teremos de inventar? Não é a grandeza deste
ato demasiado grande para nós? Não teremos nós mesmos de nos tornar deuses, para apenas aparecermos como
dignos dele? Nunca houve um ato maior – e quem nascer depois de nós pertence, por causa deste ato, a uma
história maior do que toda a história o foi até agora”. – Aqui silenciou-se o homem louco, e voltou a olhar para
seu auditores: também eles se silenciavam e olhavam surpresos para ele. Finalmente, lançou sua lanterna ao
chão de tal modo que ela se quebrou e se apagou. “Chego demasiado cedo”, disse então ele, “ainda não chegou
o meu tempo. Este acontecimento monstruoso ainda está a caminho e deambula – ainda não chegou aos ouvidos
dos homens. O relâmpago e o trovão precisam de tempo, a luz dos astros precisa de tempo, os atos precisam de
tempo, mesmo depois de terem sido feitos, para serem vistos e ouvidos. Este ato está mais distante deles que os mais
longínquos astros – e, no entanto, fi zeram-no eles mesmos!” -Conta-se ainda que o homem louco entrou no mesmo
dia em diversas igrejas e aí cantou seu Réquiem aeternam deo. Expulso e interpelado, replicava sempre apenas isto:
“Que são então ainda essas igrejas senão os túmulos e os mausoléus de Deus?”. Com a morte de Deus constatada, o
homem tornara-se livre da falsa moral social. Segundo Nietzsche, desde Platão, o valor dos valores se encontra no
Ser transcendente (Uno ou o Bem) e no mundo cristão, Deus. Deus, o valor supremo supra-sensível, que funda todos
os valores daqui, está morto. Nietzsche o constata, dentro da cultura moderna. Se Deus está morto, então todos os
valores nele ancorados também desmoronaram. Portanto, não há mais nenhum valor. Não há mais nada em que o
homem ocidental possa se agarrar. Essa é a visão niilística do mundo em Nietzsche.
A partir dessa idéia, Nietzsche faz surgir a fi gura do Além-homem, ou do Super-homem. Este seria o homem
a posteriori do homem desamparado pela morte de Deus. Se Deus morrera e o homem fi cara desamparado, haveria
a necessidade de o próprio homem assumir o papel que Deus exercera. Por isso que ele clama a fi gura do Alémhomem,
pois este Além-homem seria o Super-homem da modernidade livre de toda manipulação da falsa moral
que morrera com Deus. “O Super-homem de Nietzsche rejeita as características da submissão e da passividade,
acreditando que elas seriam encorajadas como virtudes pelo Cristianismo, enquanto eram realmente artifícios
que os governantes usavam para controlar os indivíduos. O Super-homem se concentra neste mundo em lugar de
esperar pelo próximo”. (Mannion, 2006). O Além-homem tem, portanto, a tarefa de desprezar o homem de agora
e ultrapassá-lo. Para superar o homem antigo, o Super-homem somente existirá por meio do estabelecimento da
vontade de potência. A vontade de potência em Nietzsche representa a vontade criadora. Um sim a terra com toda a
sua força contra o conformismo metafísico. A vida é defi nida a partir dessa idéia como auto-superação, vitória de si
mesma, esforço para ser sempre mais potência. Na obra de Nietzsche Assim falou Zaratustra, o fi lósofo estabeleceu
as chamadas metamorfoses do espírito, onde para o profeta-título, os homens teriam passado por três metamorfoses:
primeiramente foram camelos por carregarem em si as culpas do mundo e o sentimento do pecado ensinado pelos
religiosos; posteriormente tornaram-se leões na medida em que se rebelaram contra esse passado de fadigas e
culpas, onde seus instintos puros eram condenados como pecaminosos; por fi m, assumiram a forma de criança, pois,
na esperança de renascer numa nova moralidade, distinta da anterior, seriam livres dos preconceitos estabelecidos
pelo bem e pelo mal. Logo, matar a Deus signifi caria matar o dogmatismo, o conformismo, a superstição e o medo.
Por conseguinte, surgiria a possibilidade de não aceitar mais a imposição de regras cristalizadas, que impossibilitam
libertar-se e elevar-se em sua saga existencializada. Portanto, a vontade de potência não é violência, porém é o homem
forte, em detrimento do homem fraco e covarde de outrora. O homem que tem a coragem de tudo transvalorar depois
da morte de Deus.
Embora Nietzsche tenha conseguido destruir com seu martelo a metafísica tradicional, não alcançou o
que desejava, uma vez que sua teoria permaneceu no campo metafísico, mesmo que tenha inaugurado um campo
metafísico moderno, livre da bipartição de Platão. Heidegger, como grande estudioso de Nietzsche, assume a missão
de transcender a metafísica a partir dos esforços de Friedrich Nietzsche.
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4
A superação da metafísica em Heidegger
Heidegger, em sua linha de pesquisa, procurou analisar o ser ontologicamente,
realizando um estudo hermenêutico dos pensadores que o precederam. Na
realidade, Heidegger tornou-se o efetivo desmantelador da metafísica, embora
Nietzsche buscasse realizar antes dele essa tarefa. Como Nietzsche não explanou
sobre a questão do ser, paradoxalmente seguindo o mesmo caminho de todo
pensamento vigente até então, deixou de realizar seu objetivo de inaugurar uma
forma de pensamento independente da metafísica tradicional. Heidegger surgiu
como o primeiro a desmantelar o velho paradigma em favor do aprofundamento
da questão do ser: apresentou, portanto, o Dasein.
O novo modo de conceber o ser, em Heidegger, partiu da contraposição
ao pensamento tradicional, o qual mostrava o ser independente do ente humano.
Agora o ser apresenta-se como o ser do homem, surge como possibilidade,
portanto, em Heidegger ele assume o caráter factível conjuntamente ao ente humano. “Em qualquer lugar e em
qualquer amplitude em que a pesquisa explore o ente, em parte alguma encontra ela o ser. Ela atinge apenas o ente
antecipadamente, já na intenção de sua explicação permanece junto do ente. O ser, porém, não é uma qualidade
ôntica do ente. O ser não se deixa representar nem produzir objetivamente à semelhança do ente” (Heidegger,
1969). Ou seja, o ser existe apenas porque existe o ente. Há uma relação de proximidade entre o ser e o ente humano.
O ser-aí, Dasein, revela-se no homem. No pensamento tradicional, manifestava-se uma dicotomia: consciência
fechada em si e um mundo existente fora. A partir de Heidegger, quebra-se tal dicotomia com a nova concepção:
o ser sai de si para conhecer o mundo; é um lançar-se do mundo interior para o mundo exterior (Dasein – ser-aí,
extremamente mundano).
O ente humano é o único que possui a possibilidade inata de poder-ser, diferentemente dos demais entes
apresentados como acabados, prontos. “Heidegger também acreditava que o ser não é um estado estagnado. A
existência está em constante mudança, conceito esse que remonta à fi losofi a de Heráclito. De acordo com Heidegger,
este mundo caótico gera muito mais do que mera angústia”. (Mannion, 2006). Como o ente humano é um poderser,
surge como a única possibilidade de buscar um sentido para o ser. Os demais entes servem a existência do ente
humano. Entretanto, tanto o ente humano quanto os outros entes vivem harmoniosamente no mesmo mundo unidos
por meio do cuidado. Os entes intramundanos contribuem para o surgimento do Dasein, uma vez que o humanizam
por meio da sensibilidade. Por isso, os entes intramundanos contribuem para que o ente humano possa-ser
conhecedor de si mesmo. A sensibilidade expõe à existência a fi m de que o ente humano possa adentrar um processo
de introspecção. A linguagem caracteriza o ser do homem como possibilidade por ser parte constitutiva dele. Estar
fora de si, lançado no mundo é característica da existência, expressa pela linguagem. A sensibilidade adquirida pelo
contato com os entes intramundanos e o conhecimento conquistado pela linguagem levam o Dasein a uma crise
existencial, portanto, possibilita uma refl exão acerca de si mesmo. Segundo Heidegger, o cuidado, unifi cador dos
entes, funda-se na temporariedade: por já se caracterizar como ser-no-mundo, o Dasein torna-se passado; passa a ser
tempo presente no instante em que é ser-junto-dos-entes-intramundanos; e, fi nalmente, tempo futuro no sentido em
que o Dasein é um poder-ser. Tais dimensões ocorrem simultaneamente, contudo, o tempo futuro torna-se o regente
por ter um caráter factível.
Na condição do ente humano poder-ser, não se pode negar que a morte seja a extensão da existência do ser,
pois o ser é, na realidade, um ser para a morte. Nesse sentido, pode-se afi rmar que o cuidado é temporariedade, pois
desvela o caráter efêmero do Dasein, visto que a morte apresenta-se como último estágio da existência do ser. Este
é um outro contraponto à metafísica tradicional que tratava o ser como algo atemporal. Em Heidegger, o ser do
homem pode-ser; diferentemente dos entes intramundanos, que são.
Heidegger funda o Dasein, ser-aí, e divide em dois os entes intramundanos: os entes com os quais interagimos,
disponíveis ao ser-aí e os entes da natureza, subsistentes. Outra questão divergente com o pensamento tradicional é
o fato de tratarem o ser-aí como um ente subsistente. O Dasein apenas pode ser compreendido como possibilidade.
Nesse caso, colocar o homem na categoria de animal racional torna-se o estabelecimento de uma contraditória
problemática, visto que o ser-aí não pode ser tratado como um ente subsistente.
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5
Em Nietzsche, pôde-se contatar a vontade de superar a metafísica tradicional. Entretanto, não houve êxito,
porque o ser foi esquecido por ele. A preocupação do ser, em Heidegger, superou a metafísica tradicional, tornando-o
o pensador responsável pela mudança do paradigma mais importante da fi losofi a moderna.
Além de toda discussão tratada até aqui, percebe-se a importância de se falar sobre um ponto essencial na
fi losofi a de Heidegger: o processo de entifi cação antes de abordar a percepção heideggeriana acerca da técnica.
Como já se sabe, a superação da metafísica não evidencia a desconsideração de si mesma, tampouco desenvolve
um pensamento externamente à metafísica. O fato é que a superação da metafísica possibilita aprimorar o ambiente
de estudo da diferença entre o ser e o ente. Além, é claro, de compreender a causa que conduziu a metafísica ao
esquecimento do ser. “Para Heidegger, o ente é a existência, o modo de ser do homem. O ser é a essência, aquilo
que determina a existência ou o modo de ser do homem (...) constatamos, portanto, a partir dessa diferenciação,
duas fases da fi losofi a heideggeriana. Na primeira, busca-se o conhecimento do ser através da análise do ente. Na
segunda, o ente é abandonado e o próprio ser torna-se a chave da compreensão da existência”. (Cotrim, 1993).
Portanto, analisa-se que o Dasein possibilita a compreensão do ser, sendo assim, por meio de tal desvelamento,
pode-se chegar claramente à constatação dos entes. É a partir do ser que os entes são conhecidos. O círculo
hermenêutico é um processo circular de compreensão: o Dasein compreende o ser, e, portanto passa a conhecer os
entes e, conseqüentemente, reconhece-se também como um ente. O Dasein possibilita uma relação recíproca entre
o ente e o ser.
Ao identifi car uma contradição aparente em Nietzsche, Heidegger expõe um tratamento comum à
modernidade em relação ao ser. Nietzsche tecia críticas à metafísica por esquecer-se do ser e, no entanto, esquece-se
também dele ao colocar a vontade de poder (segundo Heidegger, vontade de querer) no campo do niilismo ativo.
A partir da concepção moderna da fi losofi a, onde o sujeito implica objeto, e os dois entrelaçam-se mutuamente, a
vontade de querer apresenta-se como o ser do sujeito, ou melhor, o ser do ser-aí. Ora, como a vontade de poder pode
apresentar-se como ser se é apenas uma técnica? Sem dúvida, a supressão do ser dos entes expõe o ente humano à
manipulação, visto que a vontade de querer surge como algo egocêntrico e subjetivo. Por isso, percebe-se que, na
sociedade atual, o homem é tratado como estatística ou simplesmente um dado quantitativo. Talvez pelo motivo de
entifi car o ser e tornar um ente o verdadeiro ser.
Com a destituição do ser, os entes revelam-se bastante previsíveis, não há mais lugar ao desvelamento
do velado. Tudo óbvio. Portanto, a metafísica deixa-se modelar pelo contexto moderno, cerceando qualquer
possibilidade de retorno do inesperado. Nesse caso, a dominação dos entes torna-se evidente, sobretudo, neste
contexto de consumo excessivo, ou melhor, submetido ao comando do capital, do ser inanimado, da técnica.
Entretanto, percebe-se que o conhecimento, consoante a dominação da vontade de querer, minimiza-se
em sua intensa manifestação, visto que a transformação de tal realidade fi ca subordinada ao resgate do ser. Ora,
como a metafísica está a serviço do contexto sócio-econômico, infere-se de que a transformação deve ocorrer
justamente nessas áreas, sobretudo, a econômica. A economia, de acordo com a doutrina marxista de infra-estrutura,
é responsável pela construção da consciência da prole, então, a forma com a qual o ente humano enxergará o mundo
partirá da relação econômica a que estará submetido.
A libertação do ser dos entes ocorrerá mediante um esforço de aprofundamento do resgate que deve
ocorrer com o auxílio do Dasein. Daí surgirá uma nova forma de pensar contrária aos resultados previsíveis.
Buscará o desvelamento da verdade enterrada pela moderna forma de manipulação do pensamento. Nesse caso, o
questionamento dos entes é imprescindível para a consecução do resgate.
Embora o conhecimento do ser surja livre de qualquer cerceamento, o contexto histórico de cada região ou
de cada povo marcará a sua forma de perceber o mundo. Talvez se possa falar sobre algum determinismo regional
para a criação de um pensamento ou para a aceitação do mesmo. Como se percebe, o contexto, se não determina,
infl uencia o modo de conceber um pensamento, talvez pela expressão cultural, talvez pela forma como a velocidade
de informação atinge tal região. Não se pode negar que a tecnologia, sobretudo, na velocidade de informação, seja a
responsável pela vontade de poder. A sedução da técnica sobrepõe-se à categoria de detentora do pleno conhecimento,
contudo, conquanto seu poder seja encantador, a busca pelo verdadeiro conhecimento não será esquecida de todo,
visto que há a necessidade inata ao ente humano de buscar o conhecimento pleno acerca do ser. O Dasein estará
auxiliando o ente nessa missão de alto nível intelectual.
Continuação...
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6
Refl exão fi nal
Consoante o estudo realizado
na unidade quatro, pôdese
constatar a existência de
divergência entre os pensamentos
de Nietzsche e Heidegger acerca
da releitura da metafísica. Na
realidade, ambos consideramse
críticos desconstrutores da
metafísica tradicional, embora
Heidegger tenha afi rmado que
Nietzsche, ao querer desmantelála,
permaneceu ainda dentro
dela, ou seja, todo seu conceito
ainda deve ser considerado
metafísico, pois não esboçou
preocupação com a questão
ontológica. O ser dos entes
fi cou esquecido em Nietzsche.
Entretanto, pode-se perceber que
a infl uência nietzschiana motivou
Heidegger à pesquisa sobre essa
questão. Portanto, ele chegou a
desenvolver sua linha fi losófi ca
graças à provocação oriunda
de Nietzsche. Não se pode
desconsiderar o convite deste
para uma refl exão sobre os rumos
da fi losofi a, sobretudo, acerca das
convenções paradigmáticas.
A metafísica tradicional,
segundo Nietzsche, defendia
um sistema ontológico,
aparentemente contraditório. Ele
desconsiderava a contribuição
dos valores do cristianismo
e da cultura ocidental. Para
Nietzsche, embora quisesse
assegurar a multiplicidade no
mundo supra-sensível, Platão
reduziu a realidade à unicidade.
Ora, o que se percebe é que o
movimento e a multiplicidade
são características essenciais
da realidade. Sem contar que
houve uma supervalorização
do espiritual, reinando
hegemonicamente deitado
sobre o trono do ser. Portanto, a
metafísica, uma vez infl uenciada
por Platão, estaria trilhando
o caminho da limitação, inibindo
o despertar de novos pensamentos,
além de servir a algumas correntes de
idéias como fonte de manipulação do
conhecimento.
A crítica nietzschiana
dos valores do cristianismo pode
evidenciar o caráter de manipulação
exercido pela crença sobre os homens.
No Uno, fundou-se o verdadeiro
ser, portanto, o responsável pelo
estabelecimento de toda moral. No
momento em que o cristianismo
apropriou-se dessa idéia, a obediência
tornou-se um dos pilares que
conduziria o ente humano ao Uno.
A remissão da culpa foi estabelecida
como parte constitutiva do bem viver
em sociedade, além de ajudar o ente
humano a trilhar o caminho rumo
ao ser absoluto residente no mundo
espiritual.
Entretanto, Nietzsche sugere o
surgimento do Além-homem a fi m de
buscar a emancipação do pensamento
e a libertação da metafísica
tradicional. O Além-homem aparece
em um contexto de reestruturação dos
valores tradicionais, os quais foram
destruídos pelo questionamento e pela
refl exão. O deus da metafísica caiu
pelas mãos do Além-homem quando
este recusou render-se a ela. Embora
Nietzsche criticasse a entifi cação
do ser, o descaso com o ser, não o
tratou com o devido respeito, ou
seja, não procurou direcionar o
estudo do ser. Além, é claro, de não
colocar o ser como fundamento de
tudo, assumindo seu lugar o Superhomem.
Acabou, portanto, dentro da
metafísica. Porém, sem dúvida, deu
início ao processo de superação.
Heidegger, em sua linha
de estudo, aproveita a tentativa
de rompimento de Nietzsche para
superar efetivamente a metafísica. Tal
linha defendia voltar a atenção para
analisar o ente a partir do ser, portanto
transferiu o debate acerca do ente para
o ser dos entes, conseqüentemente,
conhecer a fundo o ente humano. A
característica do ser, em Heidegger,
é justamente a possibilidade. Com
isso, traça uma distinção básica entre
os entes. Há dois tipos de entes em
Heidegger: os entes humanos e os
entes subsistentes. Os entes humanos
podem vir-a-ser; os entes subsistentes
apenas são, subsistem de modo
pronto e acabado. A essência do ser
manteve-se presente em Nietzsche,
pois preocupava-se, sobretudo, com
a superação da metafísica tradicional,
sendo assim, não pôde perceber que,
ao mesmo tempo em que tentava
destruir o mundo supra-sensível,
consumava sua permanência nele,
pois o Além-homem e a vontadede-
poder estão também unifi cando
a multiplicidade e surgindo como
primeira causa.
Olhar a metafísica por uma
outra perspectiva, foi, sem dúvida,
a intenção de Heidegger. Não se
preocupava em abolir, todavia,
diferentemente de Platão, Sócrates
e outros fi lósofos que o precederam,
procurava adentrar-se à metafísica
para, dentro dela, perceber o
comportamento do ser dos entes.
Chegar ao conhecimento dos entes
pelo ser foi o objetivo de Heidegger,
dentro da diferença ontológica.
Penetra-se na metafísica,
em Heidegger, tem a conotação de
recorrer à refl exão para que, por
meio de um esforço, observar o
motivo pelo qual o ser dos entes foi
esquecido. Assim, a metafísica pós
Nietzsche, além de conduzir o ente
humano ao conhecimento do ser,
leva-o ao processo de compreensão
da realidade. Ora, o esforço para se
alcançar o ser é impulsionado pelo
espanto, ou seja, admirar-se com
aquilo que aparentemente revela-se
como natural.
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7
A cumplicidade com o
ser poderá surgir a posteriori de
um trabalho de consecução de
um pensamento independente
do senso comum, portanto,
parece importante não renegar
a metafísica a fi m de saborear o
ser. Esse é um ponto crucial para
o desenvolvimento do pensar
tipicamente fi losófi co.
Extrai-se do texto que,
com Heidegger, a fi losofi a
existencial é revestida de
grande importância. Nietzsche
inicia um debate contundente
acerca desse assunto, o qual
contribuiu bastante para
que Heidegger pudesse
aprofundar a questão. Aquele
apresentou o ente humano
como o sucessor legítimo do
ser supremo. A abordagem
existencial nietzschiana conduz
a uma introspecção sobre
a representatividade do ser
humano no contexto existencial.
Este aprofundou a discussão
para o âmbito do conhecimento
de si mesmo, fortalecendo a
idéia da infl uência do contexto
na formação do conhecimento.
Em Heidegger, pode-se
perceber que o ente humano é
capaz de conhecer o ser, pois o
dasein faz-se presente nele. O
ente humano é o único que pode
chegar ao conhecimento de si;
está aí no mundo, portanto possui
a capacidade de enxergar a
particularidade de cada situação.
Os demais entes, os chamados
entes intramundanos, apenas
subsistem e contribuem para
a existência do ente humano.
Nesse contexto, o mundo passa
a ser parte constitutiva do ser.
Contribui para o existencial
humano, sobretudo, no trabalho
de autoconhecimento.
Entretanto, os daseins
não reinam absolutos no mundo,
tampouco estão alheios aos entes
subsistentes, pois o cuidado exerce
essa preocupação de unifi car os entes
e os daseins a fi m de que se possa
perceber o valor de reconhecer-se no
mundo em um convívio harmonioso
com as demais existências acabadas e
com os entes semelhantes.
Consoante a compreensão
obtida nesta unidade, o dasein, por
caracterizar-se como ser-com, acolhe
as informações obtidas por meio da
existência, além de sofrer impactos
sentimentais, conduzindo-o à refl exão
acerca de si mesmo. Entende-se que,
por meio do espanto, pode-se chegar
a uma abstração intensa sobre a
existência. Os entes subsistentes, pois,
contribuem para a existência do ente
humano. Naturalmente, infere-se de
que a existência deles é um existencialpara,
ser-para. Nesse contexto, a
sensibilidade apresentada pelos entes
subsistentes afeta diretamente o
dasein e o humaniza. Este processo
possui como característica o despertar
para a refl exão. A partir daí, pode
compreender-se e aos outros, pois
não é um dasein apenas no mundo,
é um dasein num convívio com
outros daseins. Esse é o processo de
harmonização da existência dos entes
humanos.
O compreender a si mesmo é
entendimento de ser uma possibilidade.
O dasein adquire o conhecimento, por
meio da refl exão, de que é sempre
um poder-ser. A possibilidade é a
característica que o distingue dos
demais entes subsistentes por estes
serem ser-acabados, prontos. A
existência do dasein completa-se com
a possibilidade de chegar à morte.
Sempre um ser para a morte. A morte
é a concretização da existência.
Pois bem, ao fi nal do nosso
curso, podemos observar que a
ocorrência do pensamento fi losófi co
talvez seja mais simples do que
parece, visto que o fi lósofo, por ser
fi lósofo, não deixa de ser um humano.
Entretanto, se fosse o ente humano
idêntico aos outros entes humanos,
dentro do senso comum, não haveria
o desenvolvimento de pensamento
especial. Pode-se sugerir, então, que
o pensamento fi losófi co parte de um
elemento aparentemente semelhante
aos demais, porém revestido de uma
capacidade de saber observar, de uma
maneira diferente, o contexto que o
cerca. Não é uma característica típica
de um ser sobre-humano, por isso
sabe-se que, por meio do exercício
refl exivo, todo ente humano pode
alcançar a atitude fi losófi ca.
Um outro fator gerador de
uma má compreensão é o fato do
pensamento fi losófi co ser caracterizado
pelo espanto. Ora, este sentimento
pode ser alcançado por qualquer ser
humano, sem que para isso tenha
que se esforçar refl exivamente. Por
isso, afi rma-se que o espanto não
é essencial para o fi losofar, e sim,
fator estimulante para a consecução
de tal atitude. Não se pode negar que
o espanto, como forma de estímulo,
contribui para que o ser dos entes
possa revelar-se, sobretudo, quando
corresponde à angústia, considerandose
que ela convida o ente humano
a buscar um caráter introspectivo,
levando-o, muitas vezes, a conhecer
sua essência. A angústia contribui para
que o dasein recolha-se no silêncio e
refl ita sobre sua existência.
Talvez se possa tratar a
fi losofi a como a arte de corresponderse
ao ser dos entes. Como o dasein
possui a capacidade de conhecer-se a
si mesmo, em sua essência, a fi losofi a
ajuda-o a aprofundar o exercício do
pensamento meditativo a fi m de chegar
a uma visão diferente da comumente
estabelecida na agitação do dia-a-dia.
Continuação...
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MÓDULO IV
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8
A ausência do mundo
comum na profundidade do
âmago permite que se possa
recolher-se à escuridão do ente
humano. Por meio da fuga
meditativa, pode-se chegar a
uma idéia livre de todo véu da
realidade que cerca o ser.
Outro fator importante
nesse trabalho de aquisição do
pensar fi losófi co é o estímulo à
admiração.
Indiferentemente o ser humano
concede um olhar superfi cial às
repetições da vida. Com isso,
perdem-se os detalhes dos entes
intramundanos que existem
justamente para conduzir o dasein
ao conhecimento de si. Seria
uma forma de disposição afetiva
para a refl exão da existência.
O pensamento tipicamente
Abraços !
fi losófi co inicia-se na admiração por se
tratar de um êxodo da realidade do senso
comum. Uma maneira de retiro para um
encontro com a própria essência. Um
exercício de desconfi ança das coisas
que se apresentam óbvias. Rechaçar o
desvelamento comum ao dia-a-dia e ao
que se tem por verdadeiro.
Não se pode deixar de considerar
que o pensamento fi losófi co, consoante
toda argumentação levantada, necessita
ser adquirido confrontando as idéias.
O debate, de acordo com a pedagogia
socrática, funciona como comprovador
da efi cácia dos argumentos adquiridos
por meio da introspecção. Ser refutado
é perceber que existem pontos de
divergência nas idéias e, talvez, outros
argumentos que trilhem o caminho
mais próximo do consenso. Ou, quem
sabe perceber a boa argumentação
conquistada pela refl exão e comprovada
no diálogo.
Existem alguns fatores que
possibilitam um pensar tipicamente
fi losófi co e, com os quais se pode
chegar ao conhecimento do ser dos
entes. O objetivo da fi losofi a, de
acordo com a compreensão deste curso
existencial, é propiciar um encontro
entre o ente humano e o ser, embora
possa também apresentar ao ser humano
uma visão diferente de sua existência
neste mundo, levando-o a valorizar
os demais daseins e, sem dúvida, a
presença dos entes subsistentes. Enfi m,
valorizar-se como ser pensante implica
acolher a existência do próximo.
Buscar a tolerância na diversidade.
Reconhecer-se um eterno aprendiz
como protagonista neste círculo
hermenêutico.
Fim...
Continuação...
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BUZZI, Arcângelo. Introdução ao pensar. Rio de Janeiro: Vozes, 1992.
DURANT, Will. A história da Filosofi a. São Paulo: Nova Cultural, 2000.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofi a. São Paulo: Saraiva, 1993.
MANNION, James. O livro completo da Filosofi a. São Paulo: Madras, 2006.
HEIDEGGER, Martin. Que é a metafísica?. Lisboa: Relógio D’água, 1969.
HEIDEGGER, Martin. Que é isto – a Filosofi a. Rio de Janeiro: Vozes, 2006.
NIETZSCHE, Friedrich. Vontade de Potência. São Paulo: Escala, 1994.
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falava Zaratustra. São Paulo: Escala, 1992.
NETO, Alfredo. A vida como valor maior. São Paulo: FTD, 1996.
Referência Bibliográfi ca
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