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Contos-->NATAIS DA VILA -- 30/12/2002 - 15:08 (Luiz Antonio Barbosa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Entardecia, o horizonte incendiado do rubor vivo de um dia escaldante de verão fazia nostalgia nas lembranças dos velhos que se achegavam sob as árvores nos bancos feitos das sobras de tábuas em frente a portões de bambus rachados sorrindo amarelos para a rua descalça que mais parecia um trilho na grama enlameada pelas chuvas rápidas e derramadas. A passarada fazia algazarra nas copas das árvores, cigarras estridentes faziam sinfonia de uma nota só.
Aos poucos a luz do dia dava passagem pro espírito da lua aurada por magia gritando coisas pra minha alma criança que hoje decifrei, iluminava os terreiros e mostrava nas poças d água o retrato do céu.
A casa de tábuas fincada no fundo do quintal com lampejos amarelos de uma lamparina a querosene pelas frestas das tábuas mal juntadas esperava meu pai. Era um misto de alegria e solidão, algo que faltava e eu não sabia decifrar, então ia para a rua brincar com as outras crianças e meu irmão.

Meu pai tossia muito e carregava um lenço branco sempre junto à boca, trabalhava numa fábrica de botinas, tocava violino nas reuniões religiosas que se faziam em casa às vezes, dizia que a tosse era conseqüência de seu trabalho anterior como padeiro, que o calor do forno não combinava com lenha no depósito em dia de inverno ou chuva. Trazia na roupa rota um cheiro de couro e verniz.
Quando a porteira se abria, rangia como se despedisse de um tempo que nascia para surgir uma rua que deveria ter o nome de alguém dos meus, eu, aos gritos de "manhê o pai chegou" corria abraçá-lo, sempre sem o retorno que esperava, pegava da mão dele a marmita que o denunciava não ter se alimentado direito e sorria, sorriso meio decepção sem coragem de cobrar, era véspera de Natal e nem sonhava qualquer presente real.
Todos os natais das crianças daquela rua era uma caminhada até a praça central onde um grande caminhão cheio de bonequinhas e bolas de plástico eram dados por papais noeis de uniformes marrons com rostos iguais ao de meu pai.

Não me lembro de onde ter adormecido, era sempre assim, cansado de pular nas poças d água ia chegando sorrateiro, encostando no colo da mãe, e pronto, apagavam-se as luzes da lua, das lamparinas e pirilampos, os sons dos grilos, da sinfonia de sapos ao longe na beira do ribeirão e o vozeirio dos vizinhos. Acordava com o despertar dos pardais e bem-te-vis no telhado, o sol entrando pelas frestas das tábuas beijando meu rosto, uma nesga de lume se desenhava feito um fio transparente morrente no chão de terra batida, minúsculas partículas de poeira pareciam flutuar dentro do tubo de luz que desprendia magicamente da parede. Ia até o chinelinho colocado nas estroncas perto da lamparina então apagada pra ver se havia algo do papai Noel, meu irmão dois anos mais novo sempre como siamês, pois, até pra ir à venda comprar querosene pras lamparinas íamos de mãos dadas, acorda e dá um grito, ele veio, ele veio! Papai Noel veio!
Pela primeira vez na vida o Papai Noel nos trouxe um presente de natal, os deixou amarrados em nossos chinelinhos na estronca da parede de meu quarto. Dois carrinhos de plástico com uma tira amarrada à frente para puxarmos.
Hoje sei que o que faltava decifrar do enigma é o amor que nutriu nossas vidas e eu não sabia que se chamava amor aquele sentimento.
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