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Ensaios-->Diário das Três Viagens -- 12/09/2011 - 16:53 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Diário das Três Viagens

2ª Viagem

 

Hiram Reis e Silva, Bagé, RS, 11 de setembro de 2011.

 

Não estou preocupado apenas com o passado. Estou preocupado com a forma como o passado é trazido para o presente para disciplinar e normalizar. (Thomas Popkewitz)

 

Damos aqui continuidade à publicação ao Diário de Viagem do Padre Nicolino. A raridade da obra e sua importância histórica para os pesquisadores nos impelem a isso. Esta é a segunda das três viagens relatadas no seu manuscrito.

 

 

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA

CONSELHO NACIONAL DE PROTEÇÃO AOS ÍNDIOS

 

Publicação n° 91

 

 

 

Diário das Três Viagens (1876-1877-1882) do Revm° Padre Nicolino José Rodrigues de Sousa ao Rio Cuminá (afluente da margem esquerda do Trombetas, afluente do Rio Amazonas)

 

(Cópia executada pelo C.N.P.I., em 1942, do manuscrito único redigido pelo referido sacerdote e pertencente à Biblioteca particular do Sr. General Cândido M. S. Rondon)

 

 

 

 

1946 - Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, Brasil.

 

 

 

DIÁRIO DE VIAGEM DO PADRE NICOLINO JOSÉ RODRIGUES DE SOUSA
ÍNDIO DA FRONTEIRA DO BRASIL COM A GUIANA INGLESA

 

Apresentação

 

A resolução tomada por esta presidência quanto à impressão do presente trabalho, é a resultante de duas forças concorrentes: uma, relativa ao assunto em si, por se tratar de três interessantes viagens pelo interior do Brasil, subindo e descendo os rios Trombetas e Cuminá — este, a que o autor chamou de “Cuminá-Grande” — outra, concernente à circunstância de que os feitos que descreve e sua execução, terem sido inspirados e dirigidos por um sacerdote, que nasceu índio e se educou no meio civilizado, onde, por sua clara inteligência e por seu poder de adaptação, alcançou a posição de eclesiástico e conquistou outra de maior destaque na religião e na sociedade, como vigário das paróquias de Óbidos e de Monte-Alegre, no Estado do Pará, em cuja atividade permaneceu vários anos.

 

Quando me encontrava em serviço ativo do Exército e dirigia os trabalhos da Inspeção de Fronteiras, executei pessoalmente a exploração e o levantamento do rio Cuminá (1928/29), desde sua foz no Trombetas (afluente este do Amazonas, pela margem esquerda, logo a montante da cidade paraense de Óbidos), até suas mais altas cabeceiras (Latitude = 2°17’59”, Norte; Longitude = 55°56’47”, Oeste de Greenwich).

 

Nestes trabalhos, serviram-me de guia os “Diários de Viagens”, manuscritos, do Rev. Padre Nicolino José Rodrigues de Sousa, judiciosamente organizados, sob escrupulosa exatidão, e onde se encontram, como o leitor verá, considerações de ordem filosófica e interessantes pensamentos, que definem a arraigada fé católica do autor e denunciam os seus sentimentos elevados e filantrópicos.

 

O fato de ter o Padre Nicolino se entusiasmado com a leitura dum roteiro que descobriu em Roma e que lhe inspirou a idéia de atirar-se ao sertão, denota bem a influência ancestral do sangue indígena que lhe corria nas veias.

 

Possuindo em minha modesta biblioteca particular o exemplar único desse manuscrito precioso do Padre Nicolino, mandei-o copiar, no Conselho Nacional de Proteção aos Índios, a fim de atender à solicitação do Prefeito de Óbidos, constante da carta que vamos transcrever e que me dirigira o distinto patrício Dr. Paulo Inglez de Souza, em 23 de julho de 1942, como documentação histórica e comprovação da origem indígena do Padre Nicolino, faltando ali dizer qual a tribo a que pertenciam os seus maiores e que, segundo é fácil deduzir, deve ser ou Macuxi ou Uapixana, que são as duas que habitam a zona da fronteira do Brasil com a Guiana Inglesa.

 

Com idêntico objetivo, e para a divulgação dos dados a propósito colhidos pelo Dr. Gastão Cruls, julguei de bom alvitre anexar, como o faço, uma cópia do tópico em que aquele reputado escritor se referiu ao Padre Nicolino, a páginas 73 a 78 de seu interessante livro:

 

A Amazônia que eu vi — ed. 1938 — Série Brasiliana — Cia. Editora Nacional de São Paulo.

 

Por ocasião da minha viagem ao Cuminá, visitei o túmulo em que descansam os restos mortais do piedoso clérigo, religiosamente guardados na modesta igreja por ele erigida à margem do Rio Trombetas, próximo à foz, no lugar em que existe a vila Oriximiná, nome indígena, aliás, do Rio o que os portugueses denominaram: das Trombetas.

 

Finalmente, como esclarecimento necessário, devo ainda informar que, julgando de interesse histórico e geográfico o teor do “Diário de Viagens” do Padre Nicolino autorizei ao secretário deste Conselho a remeter uma das cópias datilografadas ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o que ocorreu mediante o Ofício n° 80, de 3-111-1943, oferta que foi acusada e deu lugar aos agradecimentos que nos dirigiu o distinto e operoso secretário daquele Instituto, Dr. Cristóvão Leite de Castro (Of. n° 3-1.167 de 5-III-43).

 

Conselho Nacional de Proteção aos Índios.

 

Rio de Janeiro, 4 de dezembro de 1944.

 

Cândido Mariano da Silva Rondon

 

SEGUNDA VIAGEM AO CUMINÁ GRANDE EM 1877

 

O amor é certo; essa força misteriosa, que excitando no homem o desejo da posse de um objeto, o impele, o conduz com os olhos fitos no desejado, de tal sorte que nem tempo, distância, indicia de outros, necessidade, perigos mesmo, numa palavra, nem toda a dificuldade é capaz de distraí-lo um momento; todo possuído do objeto que aspira, caminha dum passo firme e diligente através as sarças e espinhos de toda a espécie, por entre os animais ferozes, as serpentes venenosas, rochedos escarpados e pontiagudos que povoam os centros como por sobre finas e brancas areias, varridas estradas verdes e esmaltados prados, que embelezam as margens e encantam os olhos dos espectadores. É que o amor, cuja voz melodiosa transporta, cujas palavras não somente convencem a razão, como tocam o coração e exaltam a imaginação o tem ferido e levado sobre suas asas aveludadas, não lhe permitindo um só repouso, senão na posse do objeto amado.

 

Não é, pois de admirar que tendo eu tentado uma viagem a este grande Rio em 25 de novembro de 1876, tivesse de fazer uma segunda em 11 de outubro de 1877, dia em que saí de Óbidos, sede de minha cara e idolatrada Paróquia, em uma galeota, propriedade do Snr. Tenente Leonel da Silva Fernandes. Meus companheiros foram o Dr. João A. Luiz Coelho, Joaquim d’Azevedo Bontis, Antônio Leonardo da Cruz, Joaquim Cosme, Francisco Marinho Ferandes e o índio João Gomes de Souza. Chegamos ao Uruá tapera pelas 4 da tarde e ficamos, tendo de mandar avisar um companheiro o Sr. José Joaquim Figueiredo, que ainda existia em sua casa.

 

Outubro de 1877

 

12, 6ª feira. Tendo chegado o Sr. Figueiredo com duas canoas trouxe em sua companhia Francisco José de Figueiredo, filho do mesmo e Antonio Pedro Baptista. Pelas 4 da tarde, deixamos Uruá-tapera. Ao partir meu pobre coração não pude deixar de encher-se da negra saudade, pois entre os filhos que deixava, via também minha velha mãe; mas era imperioso ceder à força do dever. Com o riso nos lábios, contente contemplava de novo a sedutora perspectiva das margens do incomparável Trombeta, cujas águas já vencidas pela primeira vez pareciam pretender vitória nesta segunda viagem. As duas canoas do Sr. Figueiredo partiram antes de nós, bem assim o mulato Sant’Ana que também levou alguma carga nossa, tendo embarcado no lago Sumaúma a Anselmo Francisco dos Santos, chegamos à casa do Sr. Tenente Leonel na boca do Salgado às 9h do dia pouco mais ou menos: o Sr. Figueiredo, o Sr. Dr. e eu que juntos viemos em a galeota.

 

Assim terminado aí o dia 13 (sábado) no dia 14 (domingo) ouvimos o S. Sacrifício da Missa e a 1 h. da tarde partimos em 4 canoas: na galeota comigo ia o Sr. Dr. Joaquim d’Azevedo Bentis, Antonio Leonardo Cruz, Joaquim Conne, Anselmo Francisco dos Santos, Maximiano Arara; em outra do Sr. Leonel e com o mesmo iam o Sr. Figueiredo, Marcos Careca, Joaquim do Timbó e Gabriel Moisinho; numa do Sr. Figueiredo Antonio Pedro Baptista e o índio João Pereira de Souza; noutra o filho do mesmo e Ignácio de Macedo e Castro; as quais seguindo o canal do Jacuman e nós o do Jaruacá, pernoitamos a bordo encostados a uma praia a margem do Igarapé.

 

15 (2ª feira), às 7 e 1/2 da manhã fronteavamos a boca do Jaruacá aonde entraram o Tenente com o Sr. Figueiredo, seguindo eu com o Sr. Dr. chegamos às 11h em casa dum velho de nome Cláudio e mais tarde os Srs. Tenente e Figueiredo, trazendo o português Joaquim Alves e a índia Anna Maria com o filho menor de nome Manoel.

 

No dia 17 (4ª feira), partimos assim distribuídos: na galeota pela manhã seguiram o Tenente, Dr. Joaquim Cosme, Luiz, Antonio Cruz, Joaquim Bentes, Gabriel Moisinho e Anselmo dos Santos: numa montaria do Sr. Tenente, foram o Marcos Careca, Joaquim Alves, Antônio do Timbó e Maria com o filho; numa do Sr. Figueiredo, Antônio Baptista, Ignácio Castro, Joaquim Bentes Sant’Ana; em outra fui eu, o Sr. Figueiredo, o filho do mesmo, os pretos Antonio Salgado e Benedito Antonio de Souza que com o Sant’Ana embarcaram-se na casa de Cláudio, donde partimos já às 2 da tarde; todavia juntos pernoitamos na Poraquêcuára, onde já achamos os índios Próprio e João, que acompanharam ao mulato Vicente a quem tínhamos pedido por falta de cômodo, que levasse uma parte da nossa farinha. Neste lugar embarcou mais o preto Lautério.

 

18, 5 feira. Pelas 7 da manhã seguimos e chegamos ao tronco das cachoeiras pelas 11 do dia e já aí achamos Felippe e Antonio d’Oliveira e Manoel Vicente, também nossos companheiros; porém haviam vindo pelo Cuminá-mirim. Reunidos na abandonada choupana do francês Mr. Caillat, passamos o resto do dia e o seguinte 19 (6ª feira). O Sr. Figueiredo, porém, neste dia expediu uma sua montaria para passar além das Cachoeiras, serviço que foi incumbido ao Sant’Anna, Antonio Baptista, Benedito de Souza e Manoel Vicente.

 

20 (sábado). Começou-se a viagem de terra assim distribuídos: acompanharam a condução das bagagens o Tenente Leonel e o Dr., ficando a confecção da picada a meu cargo e do Sr. Figueiredo, levávamos conosco o preto Antonio Salgado, Joaquim Cosme e Anselmo dos Santos. Fomos nós, os da picada, noitar atrás da cachoeira do inferno em uma baixada denominada do Coatá.

 

21 (domingo). Chegamos à cachoeira pelas 8 da manhã e aí passamos o dia 22 (2ª feira). Tendo ajudado aos nossos companheiros a passar a canoa voltar a continuar a nossa picada, duas horas distante da cachoeira e fomos pernoitar junto e ao sul da alta serra do Sarnaú.

 

23 (3ª feira). Continuando passamos com a picada pela frente da serra buscamos o rio, aonde chegamos às cinco da tarde e pernoitamos na ilha do Surubim acima da cachoeira do mesmo Inferno.

 

24 (4ª feira). Margeamos o rio e pernoitamos sobre a cachoeira do Cajual.

 

25 (5ª feira). Proseguindo encontramos pelas 10h com os da canoa, que tendo chegado ao Igarapé Grande, de lá traziam uma picada a nos encontrar como se havia convencionado, e juntos com estes chegamos às 11 h. ao Igarapé Grande, onde ficou e pernoitou o Sr. Figueiredo com os da picada, voltando eu com os da canoa e vim pernoitar na ilhinha do Cacáo fronteira a ilha do Surubim.

 

26 (6ª feira). O Sr. Figueiredo continuando a picada foi abarracar-se em um lugar dito Fortaleza, e eu vindo à barraca onde se achava o Tenente e o Dr. fui com este ver a serra do Carnau e viemos pernoitar na ilha do Surubim, enquanto que o Sr. Tenente que veio por outra picada, não alcançando o rio, dormiu na baixada do Coatá.

 

27 (sábado). Tendo chegado o Sr. Tenente fomos pernoitar a margem direita do rio em uma enseada entre a ilha do Surubim e a cachoeira do Cajual, e o Sr. Figueiredo chegou ao Macaco, sítio de Taurino, pouco acima do igarapé dito Sucumaúna, donde não se retirou, senão para seguir aos centros.

 

28 (domingo) O Tenente, o Dr. comigo prosseguindo fomos dormir sobre a cachoeira do Cajual, aonde chegamos às 3 da tarde e a canoa, que conduzia as bagagens ao Macaco e devia para ali levar o Tenente chegou já às 6 da tarde.

 

29 (2ª feira) Não tendo embarcado o Sr. Tenente embarquei-me, e cheguei ao Macaco, ficando ele e o Sr. Dr. que foram dormir na boca lgarapé Grande. Não retirei-me mais deste lugar, senão para os centros.

 

Novembro de 1877

 

30 (3ª feira). Passaram o Sr. Tenente e Dr. na boca do lgarapé Grande, donde saiu o Sr. Dr. a 2 de novembro e chegou ao Macaco e o Sr. Tenente saiu a 3 (sábado) e também chegou ao Macaco, onde já estava reunida toda a bagagem, porém alguns companheiros, só chegaram no dia seguinte pela manhã.

 

4 (domingo). Estando reunidos, ouvimos o S. Sacrifício da Missa.

 

5 (2ª feira). Ficando no Macaco o Tenente, Dr. e Marcos Careca, Joaquim Alves, Luiz, Manoel Vicente, Maximiano e Lautério, que de lá voltou para casa, partimos para os campos o Sr. Figueiredo, eu, Francisco de Figueiredo, Joaquim Bentes, Antônio Baptista, Antônio da Cruz, Felipe d’Oliveira, Ignácio Castro, Joaquim Cosme, os índios João Porfírio, Anna com o filho, Joaquim Sant’Ana e os pretos Antonio Salgado e Benedito. Tendo retirado do Macaco toda a nossa bagagem para a margem do igarapé Sumaúma cuja direção é N. E. e E. que já por algum tempo margeamos, pernoitamos em um lugar pouco distante da nossa bagagem o qual ficou chamado Iacami, nome dado pelos primeiros que passaram.

 

6 (3ª feira). Saímos passando uma serra e fomos pernoitar à margem do terreno que aí é admiravelmente plano, por isso chamamos o lugar do repouso Dormitório da planície — a nossa bagagem, porém, ficou pouco atrás, o que motivou que aí ainda passássemos a noite seguinte do dia 7 (4ª feira). O curso deste igarapé não tem nem pode ter toda a beleza do Grande Cuminá, toda a bonança e prazer, mas como o Cuminá é ele extenso, tem cachoeiras, a vegetação que cobre suas margens é a mesma, a mesma fertilidade de seu solo, a abundância de aves e de outras caças. Quanto aprazível é ver-se em tempo de verão os peixes pelos poços, especialmente as traíras estendidas sobre areias no fundo duma água cristalina! Apenas mal sentem um movimento n’água que se lançam esfaimados para essa parte, procurando devorar essa causa sem temor algum.

 

8 (5ª feira). Pernoitamos em um lugar, que denominamos dormitório do Jenipapo, por aí se achar uma árvore deste nome; e porque embaraçou-nos o mau tempo, não se pôde transportar toda a bagagem e tivemos de aí pernoitar a noite seguinte de 9 (6ª feira).

 

10 (sábado). Prosseguindo passamos pela ponta de duas serras sobre o igarapé e dormimos na terceira coberta de castanheiras e precedidas dum córrego por isso chamamos dormitório da Ponta da Serra.

 

11 (domingo) - 12 (2ª feira). Saímos já tarde, todavia a picada passou cinco serras e conduzindo-se a bagagem uma boa extensão pelo igarapé mesmo, fomos pousar no meio do igarapé sobre o quarto banco da cachoeira, onde reunimos toda a nossa bagagem.

 

13 (3ª feira). Pusemo-nos em marcha às seis e meia da manhã. Passamos uma cachoeira muito maior que as precedentes, pois teria mais ou menos 15m de altura a qual denominamos do Socó por se ter aí morto uma ave deste nome. Fomos nos abarracar a margem do rio pouco antes da ponta duma serra, e ficou chamado o lugar da pousada — Dormitório da Salsa — por aí se achar um pé deste vegetal.

 

14 (4ª feira). Dali margeamos um pouco, passando pela ponta duma alta serra a mesma acima dita, até frontear a um banco de cachoeira. De lá porque o igarapé seguisse à E. desviamo-nos dele ao centro, tendo passado 3 altas serras, pernoitamos no centro em uma baixada e chamamos o lugar do repouso - Dormitado do Socorro, por nos ser necessário ajudar os condutores das bagagens.

15 (5ª feira). Continuando a nossa tarefa transpomos uma alta serra, passando pela ponta duma outra, chegamos ao igarapé que margeamos um pouco e pernoitamos na margem direita sob uma árvore de cajuaçu, por isso chamamos o lugar — Dormitório do Caju-açu.

 

16 (6ª feira). Pelas 7 da manhã pusemo-nos em marcha até a um banco da cachoeira, onde o igarapé tomando outra vez a direção E. e o nosso rumo sendo 20 ao N. desviamo-nos dele nesta direção: todavia pernoitamos em sua margem aonde chegamos já às 4 da tarde; este lugar ficou chamado — Dormitório do Jacu. Matou-se, com efeito, aí duas destas aves.

 

17 (sábado). Neste dia passamos 6 serras margeando o igarapé as duas últimas mais altas e pernoitamos a margem direita, onde ouvimos Missa e passamos o dia 18 (domingo). Este lugar ficou chamado Dormitado do Anzol Recobrado, porque pescando-se, uma traíra cortou com os dentes a linha, levou o anzol, porém, lançando-se n’água um outro, foi a mesma puxada e achou-se no ventre o anzol perdido.

 

19 (2ª feira). Deste lugar o igarapé toma a mesma direção acima dita de E. e seguindo o nosso rumo desviamo-nos dele ao centro, passamos 4 serras ás duas ultimas mais altas, descemos em um igarapé, que por ser um pouco estreito, nos fez suspeitar que não era o Sumaúma, como já era tarde dormimos à margem direita sob uma grande sumaumeira e chamamos o lugar — Dormitório do Macaco Espantado.

 

20 (3ª feira). Muito cedo examinando-se o igarapé, verificou-se que não era o Sumaúma, mas um braço dele com direção ao N. O.: enquanto que o Sumaúma que não dista deste lugar, segue sempre a E. prosseguindo nesse rumo, nunca mais o vimos e depois de passar 5 serras duma altura média descemos a um vasto plano, cortado por um regato quase totalmente seco, em cuja margem abarracamos, e ficou chamado o lugar do abarracamento — Dormitório da Baixada Grande.

 

21 (4ª feira). À hora do costume pusemo-nos em marcha, atravessamos o vasto e pitoresco plano, depois subimos duas serras d’altura média, descemos a um córrego com poços com água, e aí pernoitamos e chamamos este lugar — Dormitório do Porco, por se ter aí morto dois destes animais.

 

22 (5ª feira). Neste dia passamos somente duas serras: a última é, sobretudo enfadonha, pela altura, comprimento, pelos frequentes regatos sem água: muitos dos quais cheios de rochas e cipoais, o que torna a marcha dificílima. Pernoitamos ao O. dela em assaizal, onde encontramos água, cavando.

 

23 (6ª feira). Não obstante a sede, pois a água achada era péssima, tínhamos força para transpor serras ainda as mais altas, quais as que passamos neste dia em número de seis. A 3ª, sobretudo era composta de rochedos imensos e escarpados; ali pareceu-me ver um desânimo nos picadores, não sei se era natural ou fingido. Tomando a dianteira, subiu-se a serra, fiz dobrar a picada que tomou então a direção N. Pernoitamos em uma baixada de tabocal, onde também houvemos água cavando, porém melhor que a precedente. Ficou este dormitório chamado do Tabocal.

 

24 (sábado). Quanto mais escabroso se mostrava o terreno, tanto mais firmes e intrépidos caminhávamos, que me parecia uma porfiada luta com o elemento; pois até as cinco da tarde tínhamos passado seis serras a 1ª e a antepenúltima bem altas. Descemos enfim em uma baixada, onde encontramos sob altos e formidáveis rochedos uma fonte d’água tão pura e cristalina quanto frígida e saborosa. Aí abarracamos e passamos o dia seguinte (domingo 25) chamamos este lugar — Dormitaria das Pedras.

 

26 (2ª feira). Apenas raiou o sol que começamos a nossa tarefa. Três somente foram as serras que neste dia percorremos; mas as que tínhamos já passado, junto destas pareceram apenas colinas. Fomos à margem direita de um regato belíssimo já pela frescura e cristal de suas águas, já pela áurea areia de seu leito, já por uma notável laje, que descobrindo uma boa extensão, representava um pequeno campo; por isso chamamos este lugar — Dormitado do Campinho de Pedras.

 

27 (3ª feira). O indício de campos que nos deu a laje deu-nos também esperança, e com ela novas forças. Passamos neste dia seis serras, entre a 2ª e a 3ª um cristalino ribeiro. Ao aproximar-nos da baixada da última serra, rapidamente passamos da maior satisfação e alegria a mais profunda tristeza e confusão. Eis o motivo: achando-nos no cume da última serra e o sol já a pôr-se enviava seus raios por entre os arvoredos e se iam refletir sobre as árvores duma outra serra pouco distante, de tal maneira, que a representava como coberta de campos com carnaubeiras. Aí está o objeto de nossas fadigas ex-clamamos! Chegamos enfim ao termo dos nossos desejos! Oh! Corramos, vamos já estender as vistas sobre esses belos quadros, gozar dessas mágicas perspectivas! Cada um apressado escorregava pelo declívio da serra, buscando ser o primeiro a pisar sobre as mimosas relvas, que de longe divisava. Apenas chegados na baixada que se dissipa a ilusão, qual o sereno matutino ao sopro do vento, e mostra-se a realidade! Que decepção! Risos foram o bálsamo de que se lançou mão para mitigar a dor da chaga, que na nossa alma angustiada e confundida abriu o ilusório e maligno fantasma; pois a serra era igual à primeira, coberta de robusta e verdejante floresta; e porque já fosse tarde abarracamo-nos à margem direita do ribeiro sobre unia ribanceira, eis porque chamamos o lugar — Dormitório da Ribanceira.

 

28 (4ª feira). Não foi inferior o trabalho deste dia ao dos precedentes, pois passamos 5 serras, assim como um regato notável pela abundancia de peixes, que nele vimos. Subimos ainda a sexta, a que denominamos — cansa-canelas, formidável, certo, não só pela sua extensão como também pela sua imensa altura. Pernoitamos no meio dela em lugar sem fonte d’água, por isso denominamos o lugar — Dormitório da Sede.

 

29 (5ª feira). Neste dia terminamos a imensa serra, passamos outra mais baixa, e descemos em uma baixada, onde encontramos cacaueiros e ficamos, e é o Dormitório do Coatá, porque esta caça nos serviu aí de alimento.

 

30 (6ª feira). Deste lugar costeamos a mesma última serra, descemos e atravessamos um terreno plano de castanhal, cortado por três córregos, e subimos a serra do galo, igual senão superior a do cansa-canelas, tanto em altura como em extensão, sobretudo pelo íngreme e escabroso de sua elevação. Do cimo e do meio desta famosa serra dobramos o rumo, que segue para N.O. buscando o rio Cuminá. Ao descer no rumo indicado, achamos igualmente cacaueiros em um córrego quase coberto de medonhos rochedos em cuja margem direita abarracamos e é o nosso dormitório denominado do Galo da Serra, nome a que deu lugar uma destas aves, que se aí viu. Pouco adiante deste lugar deixamos uma parte da nossa bagagem, para maior facilidade de nossa marcha.

 

Dezembro de 1877

 

1.° (dezembro) de 1877 (sábado). Saindo um pouco tarde, passamos ainda duas altas serras e descemos um córrego onde achamos água sob umas pedras assim arranjadas, que representavam um caixão, o que fez chamar este lugar — Dormitório do Caixão de Pedras.

 

2 (domingo). Ao sair logo subimos duas serras, depois mais 4, das quais uma somente alta a do veado e pernoitamos a margem esquerda dum ribeiro, e por que por duas vezes neste lugar alimentamo-nos da carne de veado, ficou sendo o lugar — Dormitório do Veado.

 

3 (2ª feira). Neste dia escalamos 9 serras, somente mais baixas as 3 primeiras. Dormiu-se sobre a margem dum córrego sem água. Neste lugar ou por engano ou propósito, houve uma viravolta, o que ocasionou chamar este lugar — Dormitório do Viravolta.

 

4 (3ª feira). Às 7 da manhã pusemo-nos em marcha, passamos a 1ª serra, uma segunda quase pelo cume, descemos em uma baixada, onde correm dois córregos: o último coberto de ubinzal. Subimos uma terceira serra, donde descendo seguimos por um terreno plano e de castanhal até a margem do horrível e ditoso Cuminá. É inexplicável a satisfação e prazer que experimentamos ao estender a vista sobre grandes praias e extensos estirões dum grande rio. Sem dúvida, que aí também se vêm medonhos rochedos; mas o horizonte é mais largo, o ar que se respira é mais puro e mais suave. Assim a saída da nossa picada acha-se no segundo estirão acima do antigo mocambo dito Sant’Ana; a ilha do Sarapé fica-lhe um pouco abaixo e acima no fim do estirão a boca do Igarapé Grande, onde se acha uma maloca, segundo provas que se aí viu.

 

NOTA — Neste dia depois da 5ª serra encontramos 3 vastos descampados, ocasionados por 3 lajes de pedra granítica. É notável não só pelo horizonte que dela se descobre como, também, pela duração e igualdade da laje.

 

5 (4ª feira). O estirão onde saímos segue a N.E.. Pelas 11 do dia apartei-me do Sr. Figueiredo, que ficara para seguir em ubá. Meus companheiros foram: Antonio Baptista, Francisco de Figueiredo, Felipe de Oliveira, Joaquim Bentes, Ignácio Castro, o índio João e preto Salgado. A direção então de nossa picada era 20 ao N. e porque o rio segue esta mesma direção até o estirão denominado Grande, margeamos até lá. Neste dia pernoitamos quase no fim do estirão que precede o estirão grande.

 

6 (5ª feira). Porque o estirão no começo não se desviara tanto do nosso rumo ainda nos foi possível vir pernoitar á margem e no meio dele. Entre o dia precedente e este passamos o número de 11 serras.

 

7 (6ª feira). Neste dia depois de passar duas altas serras descemos em uma baixada onde demos com caminhos de gentios; mas pouca atenção e lhes prestou. Buscamos a margem para o mesmo fim do dia precedente; reconhecemos que já estávamos muito desviados do rio; encontramos barracas de gentios á margem dum pequeno igarapé, que por algum tempo seguimos, buscando o rio; e porque já era muito tarde pernoitamos na 2ª barraca.

 

8 (sábado). Pela manhã observando, vimos pelos indícios que periodicamente vinham pescar neste igarapé, cuja boca via-se no rio pouco acima do estirão grande e chamamos — o Igarapé da Maloca. Continuando a nossa picada atravessamos a estrada dos mesmos índios, saindo outra vez nela mais adiante a seguimos, não obstante vermos que seguia ao N.E.; mas queríamos levar a fim. Com efeito, depois de três horas da manhã, saímos na primeira maloca, que evitamos para não surpreendendo-os, espantá-los. Mas apenas passamos a maloca que encontramos a continuação da mesma estrada, pois a mesma era a direção, seguimos por ela, passamos 4 serras, e pernoitamos junto da estrada à esquerda de quem a segue em uma gruta, onde conserva-se uma fonte d’água deliciosa.

 

9 (domingo). Ao amanhecer seguimos a mesma estrada que fazia bem compreender quão hábeis são os gentios em percorrer os matos, pois a estrada evitava as maiores elevações, as escabrosidades, as voltas inúteis, o que demonstrava que, antes dela traçada, o terreno tinha sido bem estudado. Chegando a outra maloca vi que já estava muito fora do nosso rumo; pensando que a minha demora causaria cuidado ao Sr. Figueiredo, que supunha já ou quase no Urucuiana, onde lhe tinha fixado que devíamos nos encontrar, fez-me dobrar a picada já com direção ao N. e não procurar os gentios, a quem somente se deixou objetos, demonstrando que lhes queríamos falar. Depois de passar, sobretudo três grandes e altas serras descemos em um plano, aonde vimos cacaueiros, velhas choupanas e outros arranjos de gentios, atravessado o plano pernoitamos à direita da nossa picada em uma gruta ao subir duma serra, donde corre uma abundante fonte de pura água.

 

10 (2ª feira). Seguindo sempre ao N. passamos entre outras três serras mais notáveis, fomos nos abarracar em um açaizal, onde houvemos água cavando.

 

11 (3ª feira). Neste dia não fomos mais felizes quanto à água, a procurando sempre não a encontramos no lugar da pousada e abarracamo-nos sem ela; porém à luz da goma da maçarandubeira foram Francisco de Figueiredo e Felipe tirá-la de cipó. Deus também quer os homens, que em seu proveito e utilidade criou as cousas ainda as mais insignificantes! Quem olhando para um cipó tal poderá imaginar-se que é ele uma fonte de saborosa água? Entretanto, entre outras, vós nos destes vida esta noite. Quão terno pai, por toda a parte vós vos mostrareis, meu terno Criador!

 

12 (4ª feira). Entre o dia precedente e este, calando umas pequenas merecem menção somente sete serras mais notáveis por nós percorridas; e foi este o último, em que ainda jantamos com farinha, o que muito entristeceu aos companheiros, que até então desconheciam uma má necessidade; mas era forçoso viajar, como foi pernoitar esta noite em mui lugar sem fonte, valendo-nos o salutar e providencial cipó.

 

13 (5ª feira). Lutando com altas serras que até à tarde foram em número de 4, pela primeira vez almoçamos sem farinha a carne assada d’um quati e do mesmo modo ceiamos à noite a carne dum veado.

 

14 (6ª feira). Continuando a nossa pesada, mas gloriosa e bem-dita tarefa através três escabrosas serras pernoitamos ainda sem fonte d’água numa baixada de açaizal, valendo-nos sempre o incomparável cipó. Deste lugar ouvimos distintamente o rouco sussurro das cachoeiras da Paciência, o que alentou a nossa murcha esperança e despertou energia naqueles a quem ouvi dizer que as moscas nos haviam de cobrir, como cobriam os restos do veado...

 

15 (sábado). Tendo passado uma serra e suas diversas pontas, descemos a uma baixada, onde achamos castanhas, o que muito nos alentou; seguindo através a baixada descemos em um córrego que seguimos e à uma hora da tarde saímos à margem do rio, pouco acima da formidável pancada do Resplandor, e fomos pernoitar em uma ilha junto a do Inajá pouco abaixo do último banco das cachoeiras.

 

16 (domingo). Pelas 8 da manhã chegamos á boca do rio Urucuiana com os corações cerrados de tristeza, por não encontrarmos aí o Sr. Figueiredo, como esperávamos e pela incerteza de que teria ele vindo em ubá e encontrado grande tropeço? Ou teria resolvido a seguir-nos por terra como tinha dito? Nesta incerteza confiamos tudo á misericórdia Divina, a cujo serviço estávamos consagrados.

 

17 (2ª feira). Pelas 10h ouviu-se um tiro e logo a tristeza sucede uma doce alegria em nossa alma bem amargurada; ao ouvir um segundo: são os nossos companheiros, clamam todos. É o Sr. Figueiredo que chega. Responde-se logo com outro tiro; apressados, corremos a abraçá-lo e vermos outros companheiros de seu séquito, tendo rápido atravessado o nó do Urucuiána, que tinha pouca água, atenta a grande seca d’então.

 

18 (3ª feira). Passamos no mesmo lugar, procurando cascas de jutahizeiros para ubás.

 

19 (4ª feira). Não obstante não nos ter sido possível aprontar as ubás que se preparavam na boca dum pequeno igarapé mais acima, saímos margeando o rio pelo lado esquerdo. No começo do terceiro estirão encontramos poço, que ficou por nós chamado dos Patos, pela quantidade desta ave, que aí vimos; e fomos pernoitar em uma ilhinha d’areia e pedras no meio do rio, quase na volta do mesmo estirão, onde chegaram alguns dos nossos companheiros à noitinha e outros de manhã em ubás.

 

20 (5ª feira). Segui por terra com alguns companheiros, com outros o Sr. Figueiredo em ubás, dormimos em uma vasta e linda praia, junto a uma enseada ao lado esquerdo, sob uma barreira.

 

21 (6ª feira). Segui com o Sr. Figueiredo em ubá, indo alguns companheiros sempre por terra, fomos pernoitar acima da hora do grande afluente Murapí, sobre uma praia à margem direita do rio Paru, que é o mesmo Cuminá, que, depois da boca do Murapi, toma esta dominação.

 

22 (sábado). Continuando a nossa viagem mais lenta que a do ano passado, não chegamos a nossa pousada d’então quanto mais à boca do Igarapé-açú: dormimos numa praia ao lado esquerdo, onde temendo a fome tivemos fartura.

 

23 (domingo). Neste dia encontramos duas antas no rio, atacamo-las e as matamos; pagaram-nos assim as provocações d’outras nos dias precedentes, em que encontramos muitas do mesmo modo. Disseram-nos que neste tempo é costume elas abundarem pelos rios. Este fato impediu-nos de chegar neste dia a Maloca; e pernoitamos na vasta e deleitosa Praia da Linha.

 

24 (2ª feira). Deste lugar o Sr. Figueiredo, eu e alguns companheiros seguimos por terra, ao meio dia chegamos à primeira casa, cuja vista em lugar de alegria e prazer não nos fez experimentar senão tristeza pelo silêncio e solidão, que aí reinavam e sobretudo pela devastação e aridez, que se aí via. Fomos nos abarracar defronte sobre uma praia, onde levantamos um Altar e ouvimos a Missa do Natalício do Senhor.

 

25 (3ª feira). Com o Sr. Figueiredo foram: Sant’Ana, João Bentes, Francisco de Figueiredo, Porfírio e o preto Salgado: fomos à velha maloca, onde nova decepção foi o fruto do nosso trabalho, pois não achamos ninguém, nem mesmo os socorros do ano passado. Bananeiras caídas, canas mirradas, manivas secas, desfolhadas pimenteiras, igarapé ou poços sem água, tudo nos demonstrava o flagelo, que sobre esta população pesara e que nos precipitava em grandíssima necessidade. A vista deste quadro de horror ocasionado por um verão abrasador, nada mais nos restava senão a resignação aos desígnios da Providência, como sempre praticamos, e resolvemos nosso regresso, tanto para o abarracamento como para fora, deixando temporariamente esses belos e aprazíveis lugares.

 

26 (4ª feira). Neste dia dispostas as cousas, partimos distribuídos do mesmo modo, que quando subimos; porém todos sofrendo gravemente do ventre e estômago, ocasionado pela grande quantidade de timbós lançados n’água pelos gentios conforme vimos; fomos pernoitar na boca do igarapé dito Aimarára, em cuja margem no centro é situada a velha maloca.

 

27 (5ª feira). Ao amanhecer cuidou-se logo em preparar duas ubás, visto como segundo o nosso estado de saúde não podíamos fazer por terra a viagem. Terminadas as abas às 3 da tarde partimos e fomos nos abarracar distante dali 4 estirões sobre a margem ao lado direito.

 

28 (6ª feira). Neste dia a nossa marcha por toque lento pode-se alcançar a espera do — bacabal — onde pernoitamos.

 

29 (sábado). Tendo preparado de calafeto uma das nossas ubás, somente partimos ao meio dia e pernoitamos defronte do lago dos patos, dois estirões acima da boca do Urucuiána.

 

30 (domingo). Às 8 da manhã achávamo-nos almoçando, abaixo do Urucuiána, sobre os rochedos que formam os diversos bancos de que consta a cachoeira da Paciência. Não obstante todo o cuidado perdemos duas ubás, ficando-nos apenas uma e às 5 da tarde chegamos defronte da cachoeira do Resplandor, onde dormimos.

 

31 (2ª feira). Se com todas as ubás lutávamos com grandíssima dificuldade ela cresceu ainda depois de perdidas duas. Tínhamos um dos nossos companheiros gravemente enfermo dum tumor que lhe apareceu na curva da perna, que o privava de andar. Resolvemos então que indo por terra iriam somente em ubá Felipe o doente, Ignácio, sobrinho do mesmo, o índio Porfírio e o preto Benedito. Assim dispostos pusemo-nos em marcha, e fomos pernoitar, além de todos os bancos das cachoeiras da Paciência ao lado direito do rio, defronte da ilha do Alumáni, onde dormiram os da ubá. Vendo o estado lastimoso, em que nos achávamos, resolvi-me a pedir ao Sr. Figueiredo que fosse adiante na ubá, a fim de nos buscar a farinha que tínhamos deixado no centro, e mandei chamar o preto Benedito, por quem mandei comunicar ao Felipe que era o Sr. Figueiredo, que partiria na ubá no dia seguinte, e que ele desceria depois junto comigo.

 

Janeiro de 1878

 

1° (3ª feira). Qual não foi a nossa surpresa, quando pelas 7 da manhã procurando-os na ilha já se tinham furtivamente retirado! Reconheci então que Felipe é um mau homem, indigno de estima: seduzir o preto e o índio, a este ato infame, junte-se outro — o negar ele anzol para pescar-se para ele mesmo comer. Passamos este dia ocupados em preparar ubás.

 

2 (4ª feira). Terminadas as ubás partimos a uma h da tarde, chegamos às 7 da noite na boca do Igarapé das Traíras e ficamos.

 

3 (5ª feira). Á vista da falta d’água no rio que punha em descoberto tanto as praias como as pedras, bem compreendemos que seria lenta a nossa viagem a qual, todavia era urgente apressar, atenta a nossa grande necessidade.

 

–  Livro

 

O livro “Desafiando o Rio–Mar – Descendo o Solimões” está sendo comercializado, em Porto Alegre, na Livraria EDIPUCRS – PUCRS, na rede da Livraria Cultura (http://www.livrariacultura.com.br) e na Livraria Dinamic – Colégio Militar de Porto Alegre.

 

Para visualizar, parcialmente, o livro acesse o link:
http://books.google.com.br/books?id=6UV4DpCy_VYC&printsec=frontcover v=onepage&q&f=false
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Solicito Publicação

 

Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva

Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA)

Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS)

Vice-Presidente da Academia de História Militar Terrestre do Brasil/Rio Grande do Sul

Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS)

Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional

Site: http://www.amazoniaenossaselva.com.br

E–mail: hiramrs@terra.com.br

 

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