Meu filho de 7 anos adquiriu um hábito: Ã noite vai na minha cama para "conversar". Faço cara de quem não quer conversa, ainda tenho uma leitura para terminar, mas ele sai com essa: você pode aprender muita coisa comigo.
É verdade. Apelo pra consciência, revejo quantas vezes, durante o dia, o rechacei por estar ocupado, mandei brincar lá fora, falar mais baixo ou mesmo calar a boca. Ele merece essa reconciliação. Não sei bem se eu a mereço.
Começamos pela brincadeira de cabaninha. Fingimos que estamos em plena floresta, abrigados em nossa cabana (debaixo do cobertor). As feras rugem lá fora: leões, tigres, elefantes...Quando estou muito cansado, termino o encontro nessa parte: vamos dormir, amanhã temos de acordar bem cedo para caçar.
Um dia, começou a me pedir para contar anedotas. Anedota é uma coisa que a gente não consegue lembrar na hora. Resolvemos a questão inventando a "anedota sem graça". No início, é parecida com a tradicional, só que não tem o final surpresa, humorístico, aquele que desata a gargalhada do ouvinte. É muito fácil, qualquer pessoa com QI igual ou superior a 10 pode criar uma na hora: "dois bêbados se encontram no bar. Um pergunta pro outro - o que você está fazendo? O outro - de copo na mão, a voz enrolada - responde: estou bebendo." Aí, morremos de rir. Seguindo o ritual anedotístico, ele comenta: esta é boa! Lembrei de uma melhor ainda - respondo.
Às vezes, brincamos de "show do milhão". Perguntinhas óbvias e uma bateria de respostas com três opções absurdas e uma correta. Tento imitar o bordão de Silvio Santos: vamos à pergunta que vale 100 mil reais. Meu filho sempre acerta, é claro, e com isso fica feliz. Se não aprendi alguma coisa como ele pretendia, ao menos vou dormir mais leve.
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