Nunca podemos dizer, de nós mesmos, que não faremos coisas de que nos arrependeremos. Não estou aqui defendendo o hedonismo, a busca irresponsável pelo prazer; estou falando aqui da vida que se esvai e de tudo o que fazemos para refrear nossas índoles, em nome de uma suposição que nunca será provada. A mitologia judaico-cristã nos promete um paraíso caso não tenhamos cometido pecados e eles são tantos que jamais poderemos chegar ao céu dos eleitos, do que se depreende que o tal céu deve ser vazio, habitado por entidades perfeitas, impossível para nós humanos comuns. O conceito de pecado preenche nossas vidas. Absolutamente tudo é pecado, de modo que nossa ação fica cerceada, compartimentalizada. Não podemos quase tudo; o simples fato de escrever sobre isto, em si, já é um ato pecaminoso. Muitas piras foram acesas com as tochas do pensamento livre.Já a mitologia muçulmana promete aos fiéis um paraíso eivado de virgens; justifica inclusive o auto-extermínio, em nome da fidelidade cega ao livro sagrado.
Teria o ser humano um fim digno das paródias religiosas? Ou tudo não passa de ilusão massiva e maciça? As teogonias todas foram erguidas, século a século, por hordas de escribas e sacerdotes pios; nada da palavra de um deus que se diz existir, que haveria criado tudo. Multidões oram a Meca; outras multidões se auto-flagelam em nome de entidades vazias. Os templos ficam lotados de pobres seres que enchem os bolsos de falsos padres, tudo com a ilusão perfeita de um dia serem agraciados com o ugar à direita do todo-poderoso.
O que se vê, na verdade, é a legitimação da exploração do homem sobre o homem, e páginas inteiras são escritas na adoração disfarçada de ídolos dourados. Pune-se o pensamento livre, reprime-se o livre pensar e ser. Todos temos de seguir ideologias espúrias. O ser humano já nasceu para ser manipulado! Então, ditadores crescem como ervas daninhas e arrastam populações inteiras para o abismo, não sem antes baterem no peito e afirmarem suas crenças veladas ou não.
Está na hora de o Homem dizer não. Nossa vida é sagrada, nossa espécie é privilegiada; no entanto, vive em um templo maravilhoo que está, paulatinamente, sendo destruído, sendo dizimado. Nossa verdadeira religião é a da destruição. Amamos o caos, a desordem; nada do que façamos parece fazer sentido, se não nos ativermos ao foco de nossa existência no Cosmo infinito. Porque o olho cego nada vê, ou nada se pode esperar dele; porque a nossa sacralidade verdadeira, o milagre da vida, é a verdadeira essência de nosso existir.