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Contos-->Avatar e Úbere -- 12/01/2003 - 22:18 (Luísa Ribeiro Pontes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Ontem descobri aqui duas novas palavras. Levei-as para o meu sono, acordaram na minha boca, amargas no seu estado de desconhecidas. Andei todo o dia com elas no bolso a espreitar, mas sempre confinadas à escuridão prudente do não uso, eivadas da enorme responsabilidade de existirem sem referente, imigrantes clandestinos em terra inculta, qual engenheiros ucranianos a trabalhar nas obras. Confesso delas não conhecer mais do que a esbelta figurinha e essa é saborosa e aquilina. Digo-as com luxúria, maior ainda antes de as vestir de referente: avatar e úbere, úbere e avatar. Bendigo os primeiros utilizadores, dois convidados anónimos do fórum, que isto de empregar sempre as mesmas palavras, com tantas no desemprego, aguardanto ociosas nas fileiras dos Dicionários, alentejanos à porta das tavernas, é como ferreiro a malhar no mesmo ferro, com as palavras por aqui tão sobrecarregadas de trabalho, furada a chapa do ferreiro e já transaparente a escrita. Contratei, pois, mais estas duas, mas antes, como quem não quer a coisa, lá abri o Dicionário nas letras respectivas. Suspirei feliz. Tinham currículo. Passaria agora a usá-las como atracção principal. Escrevi-as no écran e esperei. Não vinha nada! Eram como cantor afónico.

Mas então, com os preversos efeitos da bola de cristal em dias de chuva e de moleza, já por tantos comprovados, depressa comecei a ver adensar-se a bruma, agigantar-se o horizonte e a claridade prestes se fez fumo. Volutas e volutas me encheram o escritório que já não o era mas sim um campo de trigo, úbere de espigas doiradas em época estival, rodeando um cruzeiro em pedra negra, no meio, este, de mágico círculo feito de terra barrenta. Tusso e engasgo-me e com os vórticos espasmos, não diviso logo a populaça que grita e vocifera e ameaça, nem sequer uma pobre figura frágil e delicada, longos cabelos soltos ao vento, rosto esgazeado, presa ao cruzeiro, de palha rodeada e a chama a avançar, na mão de um embuçado, a cruz oscilante, o incenso derramado, e os gritos a encherem o espaço negros e fatais:" À fogueira, à fogueira, queimem a feiticeira"! Quando o rosto perlado de suor e medo me visa, olhar que dispara faíscas, e os traços me ressaltam conhecidos, vejo em pano de fundo, o distinto perfil da minha aldeia, a empolgada e imperante Igreja, as cegonhas lá no alto, ondeantes, as casinhas brancas e mouriscas. Sou eu, não resta dúvida. Estátua úbere, em breve nada, sou eu que vou ser queimada! Quando vou para unir aos dela o meu grito sem som, descubro sem remissão que volto ao presente, se desfazem os fumos e volto a ser gente, e que afinal, não há volta a dar: acabo de descobrir que sou mesmo um avatar!


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