Sentia saudade do convívio com o pai. Desde que os pais se separam, ela se encontrava pouco com ele. Lágrimas deslizaram do rosto dela. Dois pingos caíram sobre os rascunhos do livro em construção. Robert olhou. Teve vontade de recolher os dois cristais derretidos, e sorver como Martim a alma inocente de Iracema.
— Rasguei um capítulo inteiro, e joguei no lixo! — disse ela.
— Não deveria. Lygia jogou manuscritos fora e se arrependeu. Mário, quando sentia a impulsão lírica, escrevia sem pensar tudo o que seu consciente gritava. Pensava depois, não só para corrigir, como para justificar o que escrevia. Andrade procedia do mesmo modo. O texto nunca chega pronto e acabado; recebemos uma imagem, ‘uma palavra ou um cenário que vêm no delírio de uma febre,’ desenvolve-se o enredo e depois, é só burilar o texto, refazê-lo a partir de uma ideia central. Às vezes sobra pouco do que se tinha antes. É assim que funciona.
***
Adalberto Lima - fragmento de Estrada sem fim...
|