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Ensaios-->Fazimento -- 03/01/2017 - 16:12 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



Tomou os originais de seu  livro, ainda em construção, e dirigiu-se à casa de Robert. Logo que sentaram, surgiu o primeiro impasse: Pelo gosto de Ravenala, declinaria o nome de todos os colegas do Marista, até o gol de José Américo que deu ao colégio o título de campeão em 1980, merecia registro. Haveria de conseguir algum papel para muitos colegas, mesmo que fosse uma ponta, uma passagem rápida, como figurantes em telenovelas. Robert examinou os rascunhos, e deu seu parecer:


— A primeira coisa a ser definida é o público-alvo, depois, constroem-se as cenas, escolhem-se personagens e traçam-se perfis, cenas  e cenários.


— É preciso introduzir cada capítulo, sem, contudo fazer um prefácio dele. Cuidar da arte como se cuida de um filho em tenra idade — interferiu Ravenala.


— É necessário  colocar uma pitada de sal e outra de açúcar, levedar a massa e produzir um alimento de agradável sabor.


— Ora, Bobby! Isso me parece uma receita de bolo.


O escritor deve retirar as amarras, deixar  o cavalo solto no pátio, de modo a permitir que os leitores também cavalguem.  Personagens precisam sair das páginas como Raquel e Alvarenga, para socorrer Biba  acidentada na calçada. É a fantasia denunciando a realidade, fazendo o lado social da literatura.  A história não pode ser estanque:  não se deve esvaziar o tinteiro, para que, com o resto da tinta, o leitor possa pintar novo quadro e recontar a história. ‘Não leste Carrero?  Ele tomou por empréstimo a deusa mitológica dos gregos. E apresentou Osíris na carne de Leonardo em relacionamento incestuoso com Isis. Confira o Livro dos livros, e descubra onde Alencar encontrou o mel para colocar nos lábios de Iracema!  Onde pensas que Homero pegou  Helena de Tróia e a entregou a  Páris?... Ora, Dina, a filha de Jacó, nas mãos de Homero, tornou-se Helena de Menelau. Páris  pode ser o príncipe de Siquém que raptou Dina.   Simeão e Levi estão representados por Aquiles e Agamenon em   guerra para libertar Dina, a filha de Jacó, que se tornara Helena de Homero. A  intertextualidade é essencial para provocar a verve do  leitor.


— Sem dúvida, os cruzamentos literários enriquecem a obra. No entanto, cuidado com o Anjo Negro! Mude a denominação do anjo. Podes ser processada por segregação. Racismo. Anjo das trevas parece mais adequado.


— Anjo das Trevas não tem  o mesmo efeito literário que Anjo Negro.  Teológico, talvez tenha. Literário, não! Ademais, negro é cor. Não raça.


— Vais escolher então, o efeito teológico ou literário?


— A Bíblia pode ser considerada como literatura?


Robert ficou embaraçado.


— Isso é polêmico. Os livros bíblicos apresentam a estrutura literária praticada na época em que foram escritos. Sob essa ótica, é literatura. Mas... se fosse literatura, não estaria comprometida com a verdade, a não ser que se trate de Artigo Científico. A religião não é uma ciência. Nem a Bíblia, um livro. Embora etimologicamente o seja, a Bíblia é uma pessoa. A palavra de Deus é a verdade.


— Que é a verdade?


— Essa pergunta foi feita há mais de dois mil anos por Herodes, e ainda hoje, muitos não conhecem a Verdade.


— Luto para transformar o negrume em brancura. E colocar um ponto de luz na escuridão.


— As trevas também me assustam. Anjo das trevas me assusta mais que anjo negro.  Treva é a ausência de Luz, como no princípio. Negro é ausência de cor. O anjo mau é anjo de luz, decaído. Anda na escuridão com sua luz fosfórea, competindo com o Acendedor de Lampião. Manterei o Anjo Negro, e já deixo, aqui, por antecipação, minha defesa. Negro não remete a raça nem etnia. Negro é cor, ou ausência de cor. É dúbia interpretação, pensar de outro modo.


— Não te lembras daquele teu poema? Não pôde participar do Concurso de Poesias do Marista, com o título  ‘Mulatinha’.  E mesmo sendo uma alusão à beleza negra, o título foi assinalado como "não politicamente correto".


— O Brasil tem essas coisas. Se por um lado, peca por excesso de zelo, por outro, relega a plano inferior a própria vida. ‘Vem cá meu dengo...vem cá meu nego...’ não é tratamento carinhoso com que alguém se dirige à pessoa amada?  Ora, mulata já não significa mais  a filha de escravo e escrava sexual do patrão. Não é isto. Mulata é delicada, tem pele morena, cheiro de cravo e canela. Mulata é Ravenala, mulata é Gabriela.


— Nunca vi mulata branquela.


— Também não é preconceito chamar loira de branquela? Se não for, há uma balança com dois pesos e duas medidas na Lei. Afinal somos a mistura de muitas raças. Mas cor não é raça.  Todo sangue é vermelho, portanto o sangue de Caim era igual ao de Abel. Um era mau, o outro bom, e em nada dependeram da cor de suas peles para serem bons ou ruins. Esaú era cabeludo. O irmão não o era. Um era mau, o outro bom, e em nada dependeram da ausência de pelos, ou presença de cabelos no corpo para serem bons ou maus.


— Há muita patacoada cômica e  célula-dramática  demais em teu ensaio, digo conto, ou melhor, romance...Vais transformar o romance em novela? Já emendaste a alça do intestino de vários contos entre si, para obteres o romance. Agora queres eliminar episódios? Preocupa com classificação não! Deixe isso para os críticos. Nem todos os países usam o mesmo critério. O que é romance aqui pode ser  novela lá. Quantas páginas terá teu livro? Quantas palavras? Deixemos a classificação  de lado. Conclua a obra. E quando estiver pronta...


 Ravenala permanecia calada, apenas  movia os olhos como que falando através  deles, sem falar. Então, Robert continuou:


— Por que não um romance de ideias, de modo a  permitir a  Nietzsche reconhecer que Deus está vivo!  O sexto selo já foi aberto, não sentes esta manifestação do final dos tempos: o aquecimento global, o martírio dos cristãos, e a matança de crianças inocentes...


— Não quero fazer  Nietzsche chorar.


— Tens muito fôlego. Vejo isso nas braçadas de seus parágrafos. Neste caso, transforme teu  ensaio em Romance de formação.


O retrato de James Joyce é grande demais! Não cabe na moldura de minha parede.


— Nietzsche está morto. Não queres tratar de parusia, então por que retomas temas escatológicos?


Robert assumia a função de catalizador, ora sugeria cortes, ora tentava impedir que Ravenala o fizesse. 


— Afinal, escrevemos um conto ou romance ou novela?


— Deixarei que outros  classifiquem. Não quero compromisso com esta ou aquela estrutura. Quero contar histórias minhas e dos outros. O que vi o  que li ou ouvi. A todas essas coisas, acrescentarei uma pitada de humor.


***


Adalberto Lima - Estrada sem fim...


Imagem: Internet


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