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Contos-->a idade de cristo -- 17/01/2003 - 20:34 (PEDRO VIANNA NETO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
a idade de cristo


Eu não estava muito a fim de sair, mas como ela insistiu, e como já fazia muito tempo que eu não via meus velhos amigos, resolvi ceder. Vesti uma roupa qualquer enquanto ela terminava de dar uns retoques num quadro em que vinha trabalhando, e fiquei no computador esperando ela se arrumar. Até hoje não entendo como as mulheres conseguem demorar tanto tempo se vestindo. Abri meu maldito e-mail e nada. Ninguém mais me escrevia há umas duas semanas. Acho que eu estava me tornando insuportável até em minha correspondência – antes eu não tivesse bloqueado aqueles e-mails de produtos eróticos e ofertas de trabalho, ao menos assim ainda receberia algo. Ela terminou de se produzir e botamos o pé na rua. Como tínhamos pouca grana resolvemos andar até o prédio do Onurb e depois voltar de táxi. O Onurb estava fazendo aniversário, 33 anos, e me ligou pedindo que eu fosse a casa dele com a Enaesoj. Porra cara eu to meio quebrado, não sei se vou poder ir. Se tu não vieres tu tá fodido na minha mão; vai estar todo mundo aqui cara. Tá bom eu vou ver o que eu faço, mas eu não garanto nada. Mesmo assim vou ficar te esperando.
Chegamos na portaria do prédio. Aquele era um dos prédios mais altos de Méleb, e nós por várias vezes já tínhamos subido até o terraço para fumar maconha e observar a cidade. Dava para ver quase toda a cidade dali; era uma vista e tanto. Apertei a tecla do interfone e o porteiro abriu o portão elétrico. Aquele cara ainda se lembrava de mim, apesar de eu não aparecer lá há muito tempo, e me deixou subir sem problemas. Entramos no elevador, e eu percebi que a Enaesoj ficou meio nervosa. Porra, eu odeio elevadores. Relaxa faz parte do mundo moderno. É eu sei, mas mesmo assim não gosto de ficar trancada numa caixa de ferro olhando pra essa merda de numeração indicando a altura de onde podemos cair. Às vezes eu penso que tu és meio doida. Agarrei-a pela cintura e dei-lhe um beijo. Os números não paravam de aumentar no mostrador. Nosso beijo durou 13 andares. Mal a porta se abriu pudemos ouvir o som de vozes vindo da direita. Eu tinha passado grande parte de minha adolescência na casa daquele cara ouvindo musica, bebendo e enlouquecendo, por isso tive a sensação de já ter passado pela mesma situação várias vezes.
A porta da sala estava aberta, e logo fui avistado pelo Orimar que vinha voltando da cozinha com um copo de gelo na mão; logo ele veio em minha direção com a mesma calma de sempre. Ordep, seu filho da puta a gente já pensava que tu não vinhas mais. Pois é, eu só decidi vir agora. Vai entrando que a galera tá lá no sofá. Aquele apartamento era um verdadeiro luxo. Logo na entrada, um bar com todos os tipos possíveis de bebida erguia-se imponente como um oásis depois de minha longa caminhada. Tratei de pegar um copo para e mim, e um para a Enaesoj, e completei-os com gelo e vodka. Não havia ninguém na sala além do Orimar e não era difícil adivinhar onde os outros estavam. Sentamos no sofá e logo a porta de sacada abriu deixando entrar uma espessa nuvem de fumo. Ordep, Ordep, eu sabia que tu não ias furar; cuida vem logo dar uns pegas aqui. Valeu cara, mas eu não tô muito a fim não. Então espera um pouco que a gente já tá terminando. Fiquei conversando com o Orimar e dando uma olhada nos cds sobre a mesa. A sala, bem mais desarrumada do que da ultima vez que eu estivera ali, ainda mantinha um ar aristocrático. Depois que os pais do Onurb tinham morrido aquilo ali tinha se transformado numa verdadeira boate, era farra atrás de farra, e não fosse pela herança pomposa que o Onurb recebera ele já estaria fodido há muito tempo.
Depois de fumar o baseado todos entraram na sala. Cara, tu continuas o mesmo. Eu sei, tu também não mudaste muito, e por falar nisso parabéns. Valeu, esse aniversário tá sendo um dos melhores que já tive, tá todo mundo aqui. Logo aqueles rostos, assombrações do passado que eu jamais esperava ver novamente começaram a aparecer um atrás do outro com os olhos vermelhos e um copo na mão. Todos ali já tinham, no mínimo, passado por uma pequena situação insólita comigo, e muitos acredito que ficariam gratos por não me verem nunca mais. Fui cumprimentando todos da melhor forma possível. Alguns me abraçaram, outros mal me dirigiram o olhar na hora de apertar as mãos. Eu pouco estava ligando. No fundo eu só tinha aparecido por insistência da Enaesoj, que não queria perder a farra de forma alguma. Por mim teria ficado em casa assistindo algum filme idiota. Há algum tempo eu estava afastado daquele meio pseudointelectual burguês.
Muitas garrafas de cerveja e doses de vodka tinham rolado quando o Onurb levantou com um monte de papeis na mão. É isso aí gente, hora da poesia; vou ler pra vocês alguns poemas que escrevi em Londres. Todos ficaram em silêncio enquanto ele enchia nossos ouvidos com uma baboseira inacreditavelmente sentimental. Simplesmente ridículo. Sempre detestei saraus ou leituras de poesia. Não existe nada mais sacal do que um mau escritor tentando impressionar, impondo seus escritos com uma entonação messiânica. Depois de ler ele veio para o meu lado com um sorriso de orgulho incontido. Agora é a tua vez. Para com isso. É sério...Pessoal o Ordep vai nos honrar com algum de seus poemas agora. Porra meu eu não tô nem um pouco a fim disso. Para com isso Ordep, deixa de frescura. Tá bom, foi tu que pediste. Dei mais um gole na vodka e comecei:

o escritor não se toca, o escritor não se toca,
tic toc,
o escritor não se toca,
tic toc.

o escritor não se toca
tic toc,
toque minhas mãos
veja meus pés

veja esta rês

tic toc,
o escritor não se toca,
tic
toc

tic.

Todos ficaram em silêncio. Parece que eu tinha decretado a falência da festa. Mas que porra de poema é esse Ordep? É um poema...sei lá, é a primeira coisa que me veio na cabeça. Ele ficou me olhando de um jeito piedoso. No minimo ele estava pensando que eu tinha endoidado. Mas cadê o amor cara? o sentimento sabe? Olha Onurb tá aqui o meu sentimento. E botei o pau para fora sem a menor cerimonia.
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