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Contos-->O Elevador -- 28/01/2003 - 16:00 (William Henrique Pereira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


O rapaz entrou no elevador, dentro do qual se sentava um acensorista. Este era um homem comum, sem traços marcantes, e sua atitude era neutra, impassível. Ele apertou um botão que fez a porta se fechar, e em seguida perguntou:
- Qual o andar?
- Terceiro andar, por favor – respondeu o rapaz, muito educado, retribuindo a prestatividade do acensorista.
Ficaram então ambos em silêncio, pois não havia nada para ser dito. Porém, o rapaz sentiu o impulso de iniciar uma conversação durante a subida do elevador.
- O senhor trabalha aqui como acensorista?
- Trabalho.
- E o senhor aprecia o seu trabalho?
- Não sei se aprecio, e não penso a respeito disso. Sou pago para conduzir o elevador. Não estou muito satisfeito com meu salário, se é isso que quis dizer com sua pergunta. Mas não posso fazer nada, é o emprego que tenho.
- Este prédio tem somente três andares, não é mesmo?
- Isso mesmo.
- As pessoas utilizam o elevador, mas não acha que é um serviço descartável, considerando-se que o prédio somente tem três andares?
- Nunca pensei a respeito disso, pois não me pagam para refletir sobre isso. Pagam-me para conduzir o elevador.
- Muito bem, mas, mesmo considerando-se que o elevador seja, talvez, fundamental neste prédio, o senhor não acha que seria desnecessária a presença de um acensorista no elevador? Não acha que são tão poucos andares que bastaria para as pessoas simplesmente controlarem elas mesmas o elevador?
- Meu rapaz, sou pago pra fazer o meu serviço, já lhe disse. Nada mais.
- Sim, o senhor está certo, mas é que geralmente colocam acensoristas em elevadores de grandes prédios, e de grandes elevadores, onde cabem várias pessoas e, por este motivo, quando o elevador fica cheio as pessoas não têm como alcançar os botões do canto, que controlam o elevador e as levam aos diferentes andares. Além disso, o acensorista coloca ordem e disciplina no elevador cheio. Se não existisse tal pessoa, haveria muita confusão e todos tentariam ir primeiro ao andar que desejam, não considerando a ordem de descida em diferentes andares. Estou certo?
- Creio que sim, meu rapaz.
- Pois então, veja bem: neste elevador cabem, no máximo, três pessoas. Quando existem três pessoas dentro de um elevador, é muito simples para estas mesmas três pessoas apertarem o botão de seus respectivos andares, sem maiores complicações.
- Talvez esteja certo.
- Então não concorda comigo quando digo que a presença de um acensorista aqui é desnecessária?
- Talvez sim, não tenho opinião formada a respeito disso. Mas sei que este é o emprego que consegui, e, se, conforme o senhor disse, minha presença não for necessária aqui, e se os donos do prédio pensarem assim, com certeza serei demitido e não precisarão mais de mim. Serei mais um desempregado no mundo, assim como o era antes de conseguir este trabalho.
- Sem dúvida.
O rapaz refletiu durante alguns instantes sobre o que tinha ouvido. O elevador ainda não tinha percorrido todo seu trajeto até o terceiro andar.
- Então, poderíamos pensar, sem erro, que a situação de empregado do senhor se deve somente ao fato de ter ocorrido um engano, ou talvez uma incoerência da parte dos donos do prédio? E que, talvez, eles ainda não se tenham apercebido da desimportância de sua função?
- Talvez possamos assim pensar.
- Desculpe me intrometer, mas o senhor tem alguma instrução?
- Fiz até a quarta série primária, rapaz. Meu baixo status econômico não permitiu que, no meu crescimento, eu obtivesse suficiente ensino na escola. A educação, para mim e para outros tantos de cidadãos, é inacessível.
- E o senhor sempre foi acensorista de elevador?
- Não, é meu primeiro emprego nesta área. Eu fui pedreiro, pintor de paredes e porteiro durante anos.
- O senhor trabalhava como porteiro deste mesmo prédio?
- Sim.
- E por que não é mais o porteiro?
- Porque outro homem foi contratado no meu lugar, meses atrás.
- O seu empregador, que deve ser o dono deste prédio, lhe deu algum motivo para a sua demissão?
- Nestas situações temos apenas que aceitar o que eles dizem. Sabe, eles são meus superiores aqui. Então, recebo ordens apenas, e não questiono. Ele não me deu motivo, apenas me disse que eu seria substituído por um outro homem, que, aliás, é tio do dono do prédio. Um senhor de idade, quase idoso, acredito, e doente.
- O senhor diz que ele é idoso. Seu empregador, então, não optou por deixar o cargo de porteiro com o mais qualificado para o trabalho, ou o mais apto, o mais preparado.
- Creio que não, pois o tio dele, o velho, é doente e já aposentado.
- Mesmo assim, ele deu o emprego a ele e tirou do senhor. Será que o motivo disso não seria o grau de parentesco dele com o velho? Será que ele não considerou exclusivamente a afeição que tem pelo tio doente e, querendo ajudá-lo, não demitiu o senhor sem haver necessidade?
- Não sei, meu rapaz.
- Seu trabalho como porteiro era satisfatório para seu patrão?
- Sim, pelo menos nunca ouvi nenhuma reclamação dele.
- E, quando o senhor foi transferido para o elevador, o que achou disso tudo?
- Não achei nada, pois tive que agradecer muito ao dono do prédio por não ter me deixado na rua sem emprego. Não tenho o que achar. A minha situação é a mesma de antes, até que seja demitido.
- Seu salário aumentou ou diminuiu?
- Diminuiu pela metade, mas não posso reclamar. Tenho emprego.
- O dono do prédio não teria cortado seu salário pela metade devido ao fato de ter aumentado, talvez, o do porteiro, que é tio dele? Será que ele não priorizou ou favoreceu o tio dele?
- Não sei, meu rapaz.
- Quando o senhor veio para o elevador, já havia antes um outro acensorista?
- Sim.
- E o que aconteceu com ele?
- Foi demitido.
- Posto na rua?
- Não. Saiu do elevador e foi trabalhar no serviço de limpeza do prédio.
- O senhor conhece este faxineiro?
- Sim, às vezes o vejo fazendo seu serviço, mas somente quando entro e quando saio daqui.
- Sabe quanto ele ganha agora?
- Sei, pois almoçamos outro dia juntos e ele comentou comigo.
- Quanto ele ganha?
- Metade do meu salário.
- E ele está satisfeito com isso?
- Não reclama e nem se mostra satisfeito. Apenas faz seu serviço, assim como eu.
- Compreendo. Compreendo tudo perfeitamente. Mais uma coisa... o tio do dono do prédio está satisfeito com o trabalho que tem? Afinal, há de se considerar que é desempregado, e não precisaria mais trabalhar, mas o faz porque quer.
- Não. Ele não trabalha porque quer, é que as coisas não andam bem na família dele. O dinheiro falta. Ele ajuda como pode.
- Mas a família dele é a mesma do dono do prédio, não é?
- Sim. A mesma família, e esta família passa por dificuldades financeiras, assim como a minha.
- O senhor conhece mais alguém da família de seu patrão?
- Conheço seu cunhado.
- Quem é ele? Trabalha em quê?
- Na verdade, esteve aqui faz pouco tempo, conversava com meu patrão. Ele é casado com a irmã de meu patrão, e creio que irá ficar desempregado em breve, pois é encanador e não anda ganhando bem.
- E o que seu patrão pretende fazer a respeito, para ajudar o cunhado dele?
- Não sei, pois isto quem resolve é ele.
- Sim, eu sei. E sei também que, daqui uns dias, o senhor vai é ter que aprender a limpar o chão. Obrigado, e tenha um bom dia.
O elevador finalmente chegou ao terceiro andar e o rapaz saiu de seu interior, deixando lá dentro o acensorista, com a mesma expressão passiva de antes no rosto.


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