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Contos-->Gaúcho macho -- 30/01/2003 - 01:21 (Paulo Eduardo Gonçalves) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Sentado na sala do apartamento, ouvindo Chopin, subitamente vieram-lhe à memória lembranças da infância na estância. Sentiu novamente o cheiro dos pampas, do gado, ouviu novamente o grito dos peões, o cantar dos pássaros, o latir dos cães e os passos pesados das botas do pai ecoando pelos cômodos da casa. E como lembrava do pai! Homem austero, sisudo, que deixava transparecer na aparência e na voz sua condição de dono, seu orgulho de proprietário. Lembrava das palavras do pai:
“-- Um pai só quer o bem de seus filhos. Posso te exigir e ser duro, mas será sempre para o teu bem.”
Lembrava de como quando contava oito anos, meses após a morte da mãe, o pai entrara em seu quarto, e sério como sempre dissera:
“-- Guri, vou te ensinar uma coisa. Tu faz direito que te recompenso. Pega aqui no baguá.” E ele pegou, e foi recompensado. Duas notas de dinheiro. Dormiu contente, e dali por diante ficava feliz quando o pai aparecia em seu quarto ao cair da noite e ele podia pegar e chacoalhar o baguá e ganhar dinheiro.
Continuaram assim por uns dois anos, até que um dia o pai lhe ensinou uma coisa nova. “—Abre a boca.” Foi o que ele disse. E dessa vez ganhou o dobro de dinheiro. Por ele nem precisava. Gostou tanto dessa coisa nova que resolveu mostrar para o Baltazar, filho do capataz, que gostou também. E ele vivia feliz assim, de tarde com o Baltazar na boca, de noite com a boca no baguá do pai.
E com dinheiro! Até o dia que o pai pegou os dois no celeiro. Foi um bafafá!
“—Bicha! Viado! Pederasta! Putão!” Era isso que o pai dizia, a cara vermelha e as veias do pescoço inchadas, enquanto batia e chutava o guri, que o Baltazar, como estava de pé, tivera tempo de correr. Quase morreu. Só se recobrou depois de quase um mês de cama. Nunca mais viu nem Baltazar nem capataz. Ficou magoado. Quase um ano sem falar com o pai. Até o dia em que ele
apareceu no quarto, de noitinha. Explicou que tinha sido rígido, mas que na família nunca teve fresco, que o homem tinha que ser homem! E se reconciliaram. Na verdade, o guri sofrera muito durante esse tempo sem se falar. De falta de carinho, de afeição paterna, e de um dinheirinho pra gastar. Por isso, nem pensou em recusar essa oferta de paz.
Foi pouco tempo depois disso que o pai disse que ele já tinha idade, tava na hora de provar a macheza da família. E explicou pro filho que uma grande recompensa não vem sem um grande sofrimento, e que agüentasse a provação, por que se fez as coisas que fez, e faria o que iria fazer, era por amor. E assim foi. Enquanto provava para o filho todo seu amor, ouvindo os gemidos do coitadinho, achando que ele ia desistir, disse:
“—Güenta! Güenta, índio véio, que eu sei o que é isso, e daqui a pouco fica melhor!” Sábias palavras do pai. Ele dizia e acontecia. Como foi bom! Dali por diante, nunca mais brigaram, vivendo numa verdadeira lua de mel. Até que um dia teve que partir da cidade natal, para estudar na capital, e ter chance de passar no vestibular para jornalismo.
Tantas recordações o levaram às lágrimas, e a ternura foi tanta, ao pensar no velho pai, que sentiu vontade de ouvir uma música mais tradicionalista, que o recordasse de suas raízes. Levanto-se, trocou o cd e sorriu ao ouvir a voz do cantor pronunciar:
“Eu sou gaúcho/gaúcho macho/comigo é bala no bucho e o buraco é mais embaixo”
E enquanto pegava no sono, ouvia ainda, entrecortadamente:
“gaúcho.../macho.../no bucho.../mais embaixo!”

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