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Cronicas-->Mesa Redonda de Usineiros (sai Kless entra Milene Arder) -- 24/10/2002 - 14:45 (U.S.I.N.A.) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Mesa Redonda de Usineiros (sai Dom Kless começa depoimento de Milene Arder)

Calor...

Muito calor...

Um calor infernal, era o que sentia! O sol erguia alto chamuscando casas, carros, haciendas e animais. No centro da cidade, uma multidão aglomerava-se na Plaza de la Revolución: mulheres, crianças, homens, velhos... Um mar de rostos sofridos - em alguns podia-se vislumbrar a loucura, em outros, uma lucidez perene, cristalina. Todos dirigiam-se apressadamente para o palanque cuidadosamente montado onde, dentro em breve, ouvir-se-ia o discurso.

Seis de outubro de 2001... data a ser muito lembrada. A turba aglomera-se enquanto mais e mais pessoas chegam ao local. Vida difícil, vida sofrida. Falta tudo, menos a alegria bem característica deste povo que sobrevive sendo ignorado pelo mundo. Mesmos os loucos daqui refletem uma leveza e paz de espírito dificilmente encontrada em outro lugar. Eu os odeio! TODOS! Pobre visão maniqueísta a minha! Me impede de enxergar o orgulho, o prazer que flui desta mistura de gueto e cidade... p´ra mim são todos ratos, marionetes guiadas pelas mãos comunistas.

Havana. Como vim parar aqui? Odeio este lugar! Vejo-me no palanque, o microfone berrando: "Compatriotas: A história, caprichosa, transita por estranhos labirintos. Há 25 anos, nesta mesma praça, nos despedíamos de uns poucos ataúdes...". Que diabos está acontecendo? Não deveria estar no Brasil? Olho para a multidão orgulhosa que se espreme. Olho para os lados. A multidão torna-se um mar de rostos infinito.
"... Não foi inútil o sacrifício de suas vidas..." . O calor me toma. Mesmo sob a proteção da tenda, sinto o sol queimando-me a nuca. Um silêncio sepulcral tomou conta da praça, quebrado ocasionalmente pelo passaredo que voa em busca de locais mais amenos. Olho novamente em volta e vejo que todos me encaram... olho para baixo e vejo que calço botas, traje militar de gala e, subitamente, reparo na minha própria barba grisalha... mas... eu sou o Fidel?! NÃÃÃÃÃÃÃO! Eu odeio o Fidel! Ou melhor, quero odiá-lo! Mas, na verdade, admiro este meu parente... como posso continuar a mentir que abomino tão distinta personalidade?! Malditas convenções! Malditas! Sinto a loucura estender seus tentáculos pelo meu cérebro, envolvendo-me tal qual um manto negro. Acalentador... mas negro...
"...A injustiça começa a tremer, diante de um povo enérgico e viril, que há 25 anos chorou de indignação e dor, e hoje chora de emoção, de esperança e de orgulho ao recordá-los. A história, caprichosa, o quis assim. Compatriotas: Em nome dos mártires de Barbados: Socialismo ou Morte! Pátria ou Morte! Venceremos". As palavra saem da minha boca sem que eu sequer me esforce para articulá-las... a turba urra de alegria e orgulho, aplausos ecoam pelas ruas: "Cuba! Viva Cuba! Viva Fidel!". Seu brado retumbando por toda a cidade, buzinas anos 50 soando por todos os lados. Quando olho para frente, o desfile da infantaria passa por mim, ritmado. Reparo no Oficial e vejo que ele tem meu rosto: Cara de Fidel?! Não! Cara de Kless! Dom Kless! Como num passe de mágica, toda a tropa me encara e vejo meu rosto reproduzido em cada face... o mundo se tornou Dom Kless! Os oficiais riem para mim enquanto um menino vem me abraçar, com a bandeira cubana na mão.. olho seu rosto e vejo um Klessinho...

"Porra! Acorda Dom Kless!". Félix dá uma porrada na mesa. "Vai me dizer ou não o que viu?!"

"De-desculpa senhor Félix! Eu não sei de nada... vim aqui disfarçado de cabo-man somente para ver se conseguia descolar uma matéria para o meu jornal: Gazeta Tradição, Família e Propriedade " .

"Onde você estava na hora do crime?"

"Eu... eu...". Subitamente, me recordo da bandeira de Cuba que surrupiei do bar quando o garçom estava distraído.... "uma Cuba-libre só de coca..." o garçom se vira e ZAP! Pego a bandeira e escondo dentro da minha sacola, eles não podem descobrir! Me lembro da minha casa, o quarto escuro, milhares de fotos e bandeiras de Cuba, Fidel, Che, Havana... maldição! Olho por trás de Félix e vejo Che Guevara me fitando, barba desgrenhada, olhos de morto... "Klessito, no renuncie a la revolución, mi hijo...". Começo a suar. Tantas mentiras, tantos engodos.

"ONDE?!"

"Eu-eu pe-pedia uma cuba no bar, o garçom pode confirmar... aí ouvi um grito...". Mentiras! Um mundo de mentiras! "Judas! Malandrín!". Che me fita, seu rosto seco, ossos destacando-se, a barba caindo pelo chão... "Tu me traíste otra vez... más una...". Lágrimas escorrendo pela face cadavérica. Começo a chorar. "Eu... eu..."
Klaus se aproxima e põe sua mão no meu ombro. Ayra lança um olhar que poderia ser de piedade ou de desprezo... Che se resumiu a ossos. A ossada de Che me vem à mente, plena. Olho para o lado e vejo sua caveira caminhando em minha direção, a fitar-me, os olhos vazios... "Dom Kless, hay que endurecer, pero perder la ternura jamás". AHHHHHHHH! Saio gritando pela sala...

"Devuelvan Elian... Puercos imperialistas!", gritava Dom Kless enquanto corria.

"Peguem este maluco!". Félix grita e Domingos sai correndo atrás de Dom Kless.

"Pirou! Pirou o cabeção..."

"Não vamos interromper o interrogatório por causa disto Bruno... quem é o próximo?"

"A próxima". Milene caminha austera, postando-se à frente de Félix. "Creio que posso ajudar". Curada do porre devido a doses cavalares de café consumidas nesta última meia-hora, ela estava lúcida. "Um pouco antes de subir para o quarto, Madalena me encontrou. Estava feliz por me rever, mas com vergonha... não por causa da profissão que adotou, ela não é dada a este tipo de frescura... vergonha de ter se tornado uma escrava deste local... só vivia repetindo que ELA não a deixaria sair nunca, que Hórus não poderia sequer imaginar que ela falava DELA comigo.... súbito, parou, olhou por cima de meus ombros, arregalou os olhos e me passou discretamente um papel, ` esconde isso e lê somente quando sair daqui, senão sua vida estará em perigo!´. Saiu apressada para as escadas. Peguei o papel e guardei-o na minha bolsa. "

"E onde está a sua bolsa?"

"Este é o problema! Quando paramos a filmagem, eu deixei-a ao lado do bar, numa cadeira. Fui procurá-la agora e sumiu...".

"Ninguém se mexe! Vamos procurar esta bolsa, Milene...."

Finalmente os assistentes conseguiram alcançar Dom Kless na esquina, e pularam em cima dele que gritava "Laguem-me, catrefa sapista! Soy Libre!" para impedir sua fuga...

"Você é maluco! Não vai a lugar nenhum!", interrompia Gezus com seu semblante instável...

"Facistas! Desgraçados! Puercos!", gritava o inconformado Dom Kless.

"Sem essa Kless... Você não vai a lugar nenhum até descobrimos quem é o assassino!", disse-lhe Zocca que permanecia em pé ao seu lado.

"Não matei ninguém... Não roubei bolsa nenhuma!"

"QUE BOLSA!?", indagaram em uníssono.

Ficou descoberto que Dom Kless, num acesso de raiva, havia jogado a bolsa Vitor Hugo, num protesto involuntário contra o consumismo e o capitalismo norte americano, responsável pelo embargo a Cuba. Sua mente entortava cada vez mais...

"Fui yo si! Eu joguei a bolsa fora, no lixo da cozinha...", e não disse mais nada, recusando-se a prestar depoimento. "No hablo mas nada que possa me comprometer...".

A Vitor Hugo da Milene estava lá mesmo onde Kless indicara, no lixo da cozinha. Milene pegou-a apressadamente e verificou se não faltava nada...
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