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Contos-->DEPRESSÃO,PREGUIÇA OU MANHA? -- 08/02/2003 - 23:58 (lira vargas) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

DEPRESSÃO, PREGUIÇA OU MANHA?

O sol brilhava nos jardins suntuosos de minha casa. As montanhas coloridas pôr flores pareciam competir com o mar estendido com barcos à vela, era o espetáculo da chegada do verão. Os pássaros cantavam, tudo isso acontecia, eu sabia, mas não levantava de minha cama. Dora, uma empregada paraguaia, autoritária, alegre, acho que ela pensava que era minha mãe. Entrou em meu quarto, colocou as mãos na cintura e dizendo que ia abrir a janela para eu ver que dia lindo, colorido com show exclusivo para mim, já passava das dez horas. Destampei meu rosto, senti raiva dela, mas contive, perguntei pôr meu marido, Dora responde que ele não viria almoçar, mas que eu observasse que já era a terceira vez naqueles dias que ele não vinha. Senti ciúmes e ao mesmo tempo um certo alívio, teria mais tempo pra ficar sozinha, curtir minha solidão, os choros convulsivos, o sono insaciável.
Com muito esforço, entrei no banheiro, a banheira já preparada pôr Dora, despertou apetite de desfrutar daquela espuma perfumada. Tirei minha camisola, quando ia entrar na banheira, olhei o roupão, vesti-o, e saí do banheiro, caminhei sem rumo pôr minha casa, fui até o jardim e sentei nos bancos ao redor da piscina, experimentei uns três para sentir conforto. Já eram onze e meia da manhã. Dora foi até a piscina trazendo um suco e frutas, pão, queijo, geleia etc., tudo que pudesse destruir-me na bandeja. Comi, comi, parecia que muito tempo não comia assim. Ela informa que o almoço já estava quase pronto. Fiquei silenciosa, uma lágrima rolou em meu rosto, trazendo outras e outras, a montanha e o mar assistiram aquele choro e permaneceram lindos e silenciosos.
Retornei para meu quarto, resolvi tomar um banho, abri o chuveiro, a banheira ficou ali preparada para nada. Brevemente Dora mandaria alguém esvazia-la, e pôr ralo a fora ia toda aquela espuma perfumada.
Retornei para a cama, antes fui até a janela e cerrei as cortinas.
A noite Orlando chegou, e foi até meu quarto, ainda deitada, e quando ele entrou no quarto com aquela expressão de pena, comecei a chorar, e pedi que deixasse-me sozinha. Orlando obedeceu.
Foi numa tarde, ainda deitada, Orlando ligou informando que tinha um jantar, se eu quisesse ir, que ele passaria as oito horas da noite. Foi horrível aquele convite, mas Dora ajudou-me na arrumação de minha roupa e cabelos.
Orlando chegou, eu já estava pronta, percebi que meu marido já não sentia pena de mim, ele estava indiferente aos meu choros, preguiça ou depressão, sei lá. Quando descemos as escadas dos jardins, senti um certo receio, medo de insetos, ratos, achei que alguém estava escondido nos jardins, mas não falei nada. Quando chegamos na garagem, o motorista se prontificou para entrarmos no carro, Orlando recusou, disse que ele poderia descansar, ele mesmo iria dirigir. Senti um calafrio, senti medo. Orlando dirigia calado, a cada lanterna de freio dos automóveis que acendiam, eu levanta da cadeira do carro, apoiava as mãos e dava um impulso, senti os estômago responder ao meu pavor, pedi para parar o carro, quando ele ia encostando, gritei, que tinha que ser em um posto de gasolina, ali era perigoso. Orlando obedeceu silencioso. Continuamos a viagem calados, o medo não passava, tinha certeza que algo iria acontecer, e no pensamento prometia nunca mais sair de casa. O jantar foi no restaurante de um hotel, os diretores da empresa se reuniram, depois percebi que era uma tentativa de ajudar-me. Quando cheguei, percebi os olhares curiosos, parecia que eu era alguém de outro planeta, mais gorda, pálida, fingia um sorriso. Torcia que aquela reunião animada demais para meu gosto acabasse para retornar pra casa.
Quando chegamos em casa, senti um certo alívio, tentei um carinho em Orlando, esse retribuiu, mas sem aquele entusiasmo de antigamente. Fizemos amor, e cai em sono profundo. Na manhã seguinte, na mesma rotina, Dora entrou em meu quarto e falou do dia, estava chovendo, as folhas e flores estavam mais coloridas. Nada respondi e quando ela saiu, levantei da cama e fui até a janela. Olhei para o mar, cinzento, frio, olhei para as montanhas, a chuva deixou-a embaçada. Passei minhas mãos pela vidraça da janela, olhei para a cama, para o banheiro, caminhei lentamente e lembrei de meu passado, das coisas ruins que aconteceram em minha vida, e como um arquivo velho, pastas cheias de ácaros, clipes enferrujados, gavetas empenadas, sentei na beira da cama, e num pulo, peguei todo meu passado resumido naquele arquivo, aproveitei que estava chovendo, joguei tudo pela janela, percebi naquela manhã que o passado estava num arquivo imaginário, eu nada podia fazer, nada podia mudar, eu não tinha força para isso, eu não tinha culpa de nada, se eu sofria é pôr que não me fora dado o poder de fazer diferente, e se me tivessem dado, eu teria feito, mas não fiz porque não pude fazer. Se estava enchendo-me de remorso pôr algo que fiz. Fiz e daí? Já fiz, não podia mudar, já fiz. E se não fiz, e daí? Não fiz porque não pude fazer e daí? que eu era fraca? sim e daí? Que eu não tinha olhos azuis, e daí? Se eu não tinha olhos pretos e daí? Se não tinha altura e daí? Se não tinha amigos, ia tentar Ter, se não forem como gostaria que fossem e daí? Se não era bem sucedida na minha profissão, fazer o que? Não tinha esse poder, se perdi alguém que amei, perdi não tem mais jeito, não mudarei o fato, se perdi a pessoa que não amava mas que tinha que amar, perdi, não tem mais jeito, se cometi uma injustiça, tem jeito vou pedir desculpas, vou despir-me do medo, fazer uma ligação ou mandar um e-mail, ou uma carta. Se não tenho filhos, e não posso Ter e daí? Posso pegar algum pra criar, se meu filho enveredou para o caminho da droga, não sou culpada, vou tentar traze-lo de volta, mas se não consigo...fazer o que? Lutar. se trabalho num local de pessoas falsas ou chatas, problema delas, não posso muda-las. Se não tenho um avião particular, e daí? Mas tinha um céu lindo para lavar as folhas e um sol poderoso para secar, bronzear e ajudar no curso natural de cada manhã. Eu não sei mudar, não posso mudar e nem quero mudar o mundo, dá muito trabalho. Pôr que tinha que chorar, para pensarem que sou uma coitadinha? Para que chorar ? lágrima não é guindaste, lágrima não é trator, lágrima não é laboratório, lágrimas em excesso não resolve, apenas marca ainda mais a alma, e alma sofrida marca o rosto. Pensei nos hospitais de doenças incuráveis, pensei no dia a dia que os doentes vencem, nas dores intermináveis, nos sedativos alucinógenos, na carne se abrindo, nos órgãos se deteriorando pela doença, na impotência dos médicos, e as vezes na impaciência das enfermeiras, das famílias que estão cansadas, e naqueles que perdem e partem para outro mundo, na mãe que perde um filho em assalto, em acidente ou com doenças, pensei em empresários que perdem a empresa e chora, pensei na mulher que perde o amante, o marido que perde a mulher, no motorista que perde o carro, na jovem que perde o vestibular, gostaria de reuni-los para entenderem o que entendi naquela manhã chuvosa, cair em depressão não resolve, resolvi ir a luta, levantar uma bandeira para uma guerra de paz, de luta e mudança.
E eu não sabia nada da vida. Lembrei de um e-mail que uma amiga enviou quando perguntei o que fazer com minha vida.
“Não sei filosofar, não sei nada da vida, pois há cada dia que amanhece é um mistério, sei apenas que é bom levantar da cama respirando espontaneamente, sei que é bom levantar da cama com nossas pernas, sei que é bom acordar, abrir os olhos e olhar o teto de nosso quarto, olhar a janela e assistir de graça o espetáculo do céu, do mar, da mata, sei que é bom pensar silenciosamente o que quiser, dar asas aos pensamentos, viajar de graça nas lembranças, sei que é bom caminhar pelas calçadas sem pressa, sem medo da polícia pela liberdade que tenho, sei que é bom olhar para quem está do nosso lado e saber que é um companheiro que nos defende se alguém tentar nos derrubar, sei que é bom Ter amigos para bater papo furado, mesmo que esse amigo não mereça a confiança de saber que algo está errado, sei que é bom Ter um trabalho “ sem o seu trabalho o homem não tem honra, sem a sua honra, o homem chora Raymundo fagner “ Sei que é bom Ter filhos mesmo que eles não tenham aprendido a caminhar sozinhos, sei que é bom Ter netos, para perpetuar a família, sei que é bom morrer, para descansar. Amigo, não sei se consegui levantar você, mas que tentei...tentei”
Fui ao banheiro, tomei um banho quente, vesti uma roupa há muito guardada, desci o jardim, o chofer veio ao meu encontro, recusei, pedi um taxi.
___Moço, leve-me até o Hospital do Câncer.
Fazem oito meses que trabalho como voluntária.
Orlando colabora com meu trabalho, e estamos muito felizes.
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