Quando eu parei para olhar, não pude acreditar.
A vida em câmera lenta, uma cidade desatenta.
Na vitrine, minha imagem refletida era nada.
Ao mundo, um alento inútil, ao extremo fútil.
Gostaria de transcender, ao menos entender.
Não, não era loucura.; era poesia.
Somente árvores notaram.
Só as mais atentas ousaram.; delataram.
O momento surdo em que alcei vôo.
Abandonando o corpo na calçada
Ninguém viu minha alma penada.
Somente algumas árvores sussurravam
dizendo a Deus (que soprava o vento)
Um humano acordou do tempo!
Saiu voando pelo céu cinzento.
Que protestava contra o movimento
Das pessoas desatentas ao firmamento
Cada qual com sua pressa, seu atraso estéril
rodando no mar de asfalto com seus barcos de metal
Vi um amor se rompendo num sobressalto
Pelas ondas de rádio de um celular
Que esconde covardemente um tenro olhar
Ora, mas que cidade desatenta
Pude notar em meu vôo manso
Carteiras grandes, diálogos curtos
A raiva inútil, risos recalcados
Um artista na praça por poucas moedas
Autoridades armadas, pessoas famintas
As salas lotadas, tv´s ligadas, gente hipnotizada
Vi pombos satisfeitos, brigando por migalhas
Velhos conformados, dividindo suas migalhas
A pobreza analfabeta, ignorando os cartazes de paz.
Vi a bomba em Hiroshima, ecoando cartas com antraz.
E subi além céu alado, calado, estupefato
Do alto, não vi as fronteiras como nos mapas
Vi a Muralha da China na real proporção
Arquitetura sinuosa, discreta na vastidão
Notei a toada serena do Tempo que nos consumia
Fugindo do relógio pelo contorno leviano do retorno
de seus ponteiros burros, às horas que não se repetem
Retornei do vôo, retomei minha caminhada.
Caminhando, olho ao lado e vejo Deus, chamando-nos a atenção.
com seus anjos, seu messias, seus raios e trovoadas.
E sigo pela estrada.
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