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Contos-->Alô! É da Polícia? -- 07/03/2003 - 12:55 (BRUNO CALIL FONSECA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Alô! É da Polícia?
— Sim! Plantão — 190.
— Dá pra vocêis arrumá um jeito de vim de mim pegá aqui no Joanadarqui? Meu nome é Wilson. Sou foragido da Colônia Penal. Devo pena por assalto. Mas desde dezembro do ano passado estou aqui, do lado de fora, sentado à beira da calçada a meio metro de uma sarjeta que fede mais do que as latrinas da colônia. Pra te dizer a verdade eu nem sei se de fato a sarjeta existe. Mas vocês entendem né! — o que eu digo. As sarjetas são uma constante em nossas vidas e as piores são as invisíveis. Estou a esperar a viatura. Vindo ao meu encontro, não tens como errar. Sou um homem que à luz do dia, às 10h, está sentado na calçada e que consente que errou ao roubar, embora de mim muito mais roubaram. Estou sozinho. Sinto-me discriminado. Não sei se por ter sido preso, julgado, condenado, ou se por ser um foragido de mão vazia, ou se de fato porque a sociedade me cobra esse erro. Não consigo arrumar emprego. Estive trabalhando uns meses de carroceiro, depois de servente, mas quando me pediram a carteira profissional, fui obrigado a deixar o serviço. Até a minha família mais distante me cobra e diz que condenado tem que pagar pena; não querem me ver por perto. Os meus amigos se distanciaram. Se me aproximo deles, eles pensam que a barra pode sujar. Que eu posso chamar a atenção da polícia, de tal sorte a estragar seus esquemas. Então eu fico só, perambulado pelas ruas. O desprezo não tem o peso da corrente sobre os calcanhares, não tem espaço limitado pela grade tão dura que não serre, mas te sufoca. Um homem sufocado não sonha. Prefiro que ate as minhas pernas e as minhas mãos; que me isole, desde que não isolem as possibilidades de sonhar. Estando preso aí, eu posso sonhar com o mundo aqui de fora. Ter expectativas. Pintá-lo ao meu modo. Usar as cores que eu quiser. Sonhar com os bons costumes que eu não tive, trabalhar, trabalhar, para reconstruir o que eu destruí. Estando aqui fora, concluí que não tenho oportunidade de sonhar. Eu sempre serei um foragido. Um eterno foragido. Daí, as pessoas com quem convivo, fazem da minha condição de foragido um escudo contra os incômodos da própria consciência. Escudo esse que alivia a dor que sai de dentro, mas que não assegura a possibilidade de viver. Não quero continuar no crime, não sei se devo continuar no crime, não sei se tenho competência para continuar no crime. Tenho mais de quarenta anos. As crianças andam soltas. Um menino me contou dos meninos da “Cidade de Deus”. Tenho medo dessas crianças. Beira-mar disse a quatro ventos que “está tudo dominado”. Esse mundo aqui fora não foi feito para mim. Sinto-me desajeitado na garupa de uma moto. Tudo é muito rápido. Bons tempos eu vivi nos noventa dias em que ai fiquei preso. Havia muita gente com quem conversar. Retornando, se bem aplicado, eu posso vir a lavar os banheiros; varrer os corredores; trabalhar na horta da colônia penal; fazer amizade com os carcereiros; chamar o delegado de doutor; os policias, de chefia e os advogados que por ai transitam de gentes-finas. Aqui fora eu sinto o frio. O frio da insensatez que corta mais do que a ponta afiada de um caco de iceberg. Insistem que o meu lugar é ai. Por um monte de razões. Mas por um monte de razões também não acreditam na minha recuperação. São quase 11h. Logo mais, estando aí, tenho a certeza de meu prato de comida. Depois dormirei um pouco, e depois de acordar — conversarei. Conversar! Se pelo menos eu tivesse o dom de conversar com as árvores daqui, com formiga que passa rente aos meus pés, com o urubu que me olha atentamente, talvez eu não lhes causava esse incomodo. Há crimes a punir, extremamente piores do que o por mim cometido. Ficaria por aqui. Mas não posso. Só vejo cercas de arame farpado a minha frente; só ouço o som das sirenes; só sinto o cheiro do cachorro podre a se dissolver no capim. Se mastigo a relva, ela está amarga. Se espremo a pedra com a minha mão, sai, por entre os meus dedos, o ódio espremido. O mesmo plástico preto que protege a minha pele, sufoca a minha alma. Quem disse que a lua é minha amiga, e que diferença faz, no meu caso, em ver o sol nascer quadrado? É a única opção de poder sonhar. Para que o sol, se me negam um copo d’água? No bolso, trago um reles dez centavos. Não pagam meia xícara de café, ou meia cachaça, quando muito um cigarro picado vindo do Paraguai. O que eu faço aqui fora? Sou um fugitivo a fugir da própria sombra. Ela me condena. Os meus olhos só vêem olhos que me condenam, porque eles também são condenados. Sou por inteiro condenado. Corpo e alma condenados. Um homem condenado não pode trabalhar em paz, mesmo se sujeitando a mudar de vida. O homem mente, mas...
— Senhor Wilson?
— Sim!
— Desligue o telefone e entre na viatura.

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