BEATRIZ
Alice era muito magra, muito pálida e muito calada. Caminhava se encolhendo, tentando se esconder. Alice e o seu corpo era uma dificuldade. Ele a limitava, a aprisionava, a castrava.
Mas, Alice era uma sonhadora. Bastava ficar em frente a seu espelho que ela se transformava.
Para ela, a única coisa real na vida era aquele espelho. Ele, sim, é que refletia a sua verdadeira natureza e essência. Assim, sua vida era toda desenrolada na frente dele.
Nele, ela realizava sua história. Despia-se à vontade. Ria, chorava, cantava, gesticulava, fazia amor, segredava suas fantasias. Enfim, o espelho era a única coisa concreta em sua existência.
No espelho ela via sua beleza, sua força, seu talento, sua bondade, seu destino. Ele era mágico, pois, tudo nele era realizável. Nele, ela se reconhecia. Nele, ela se completava.
Toda vez que ela se via refletida nele Beatriz aparecia. Suave, encantadora, verdadeira. Beatriz levava Alice ao céu. Criavam asas e subiam, subiam, subiam...
Era Beatriz que conduzia Alice pelas ruas. E, quando Alice estava com Beatriz, se abria, se iluminava. Apossava-se da rua. Andava solta, livre, leve, segura.
Alice só se sentia verdadeira, autêntica, poderosa, quando estava com Beatriz. Quem era Beatriz? Alice sabia que Beatriz era ela mesma, mas as pessoas não reconheciam isto.
Um dia Alice foi tão absorvida por Beatriz que nunca mais conseguiu ser Alice novamente. Alice sumiu definitivamente. Foi absorvida pelo espelho. Alice tornou-se pura luz, como Beatriz.
Sua mãe, ao entrar no quarto à sua procura, só viu um brilho fantástico vindo do espelho. Até hoje procuram Alice, quando deviam, antes, procurar por Beatriz.
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