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Contos-->Brincando de Deus -- 23/03/2003 - 21:05 (Raquel Murakami) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Um conto escrito por Raquel Murakami



Brincando de Deus


Um homem olhou para os lados, para baixo e para o céu. Era tudo um espaço infinito e belo para conceber sua vida. Seu olhar se encontrou com olhos imponentes de um ser acima, majestoso e quieto. Quem seria aquele? Ele parecia estar acima de tudo e de todos, acima de qualquer existência e acima de toda aquela vastidão divina.
“Poderia perguntar quem é o senhor?”
O ser então fechou brevemente os olhos gentis e depois respondeu com tranqüilidade:
“Sou a existência. Sou vigente de todo o espaço e tempo que lhes ofereço.”
“Isso quer dizer que você é Deus.”
O ser sorriu, pousando os olhos cansados e cheios de pureza sobre o homem:
“Mais ou menos. Talvez não seja bem uma alcunha. Como os homens crio. Crio o chão, o céu, o tempo. O restante deixo com vocês e observo tudo. São os escolhidos para a continuação de minha imaginação, aqueles que pensam, imaginam e criam.”
“Então nós temos o mesmo poder que o senhor?”
O ser luminoso adquiriu um semblante sério, e o seu olhar penetrante fez o homem tremer:
“O homem cria seus próprios limites. Mas para vocês é muito fácil dominar o ilimitado sem sair de suas fronteiras. Vocês criam e eu observo. Quero ver a existência dos homens ganhar brilho, um brilho tão grande quanto o meu.”
E com essas palavras o ser deixa de ser visível ao homem, dissipando-se no céu como uma névoa. O homem permanece imóvel por uns segundos, pensando em sua conversa com o fabuloso ser, e então decide ver o que os outros homens estavam criando.
Cidades, invenções, culturas. De um espaço tão simples e tranqüilo, os homens criavam a complexidade, os números, as ciências. Mas suas conquistas eram passageiras, assim como suas existências. O homem queria chegar acima de todos, possuir o mesmo poder que o ser supremo dominava. Chegar a controlar o tempo, o espaço e ser tão fabuloso quanto aquele ser.
Para isso precisava conseguir o espaço de outros homens. Precisava de suas invenções, de suas criações, para criar algo maior, mais forte, e mais ousado. Inventou a arma, e resolveu destruir aquilo que lhe interferia e conservar aquilo que bem lhe entendesse. Construiu bombas de alta tecnologia, e as destruía junto com a existência de outros homens. Dominava passo a passo a existência de todos, destruindo, e criando mais armas.
Sentia-se um deus. Era exatamente aquilo que ele chegou a pensar que era. Um deus. Adorado e venerado por todas as outras existências. Ria-se sozinho com a queda de seus inimigos, e observava triunfante o seu espaço de criação aumentar cada vez mais, e mais, e mais...
Até que atingiu o ilimitado, ou ao menos pensava que o era. Sozinho, sobre a imensidão de seus poderes, gargalhava insanamente sobre o tempo e o espaço. Caminhava eternamente sobre seus pertences, sabendo que eles não tinham mais um limite. Finalmente tornara-se deus. Olhou para o céu de maneira vitoriosa, enquanto gritava sozinho:
“Você vê, senhor! Possuo todos os limites e agora tenho o total poder de criação que o senhor concebeu, tenho tudo ao meu favor, o espaço, o tempo, todas as outras existências! Agora sei, e tenho certeza, sou tão imponente quanto o senhor!”
Em resposta aos seus gritos, o rosto conhecido surgiu no céu, com um olhar profundamente triste:
“Você não é imponente. Nunca foi. Olhe em sua volta... Vê algo?”
“É claro que vejo! Meu mundo! Todo o meu mundo que conquistei com estas mãos! Sou imperador da existência!”
O ser, com os olhos fechados, balançou a cabeça pesadamente, em reprovação:
“Não, não dominou a existência, e sim a destruiu. Está vendo algum mundo além do seu? Não. Mas isso não significa que seu mundo seja o maior. Na primeira vez que nos encontramos, disse-lhe que não era preciso sair de seus limites para dominar o ilimitado. Eu repito, olhe em volta.”
O homem, intrigado e desconfiado, olhou em torno o seu imenso mundo. Viu todas as armas, todos os objetos desaparecem um a um, e ao final restar-lhe apenas um branco absoluto.
“O que está havendo? Meu mundo!! O que pensa que está fazendo?”
O ser, inabalável, continuou calmamente:
“Não faço nada. Você destruiu todos os outros, inclusive aqueles que conceberam seus pertences, pois é natural que só lhe reste a única coisa que criou em toda a sua existência, ou seja, a destruição. Destruiu seu próprio mundo ao invés de evolui-lo. Brincando de deus, você só soube destruir os sonhos de outros ao invés de construir os seus. Nada mais.”
O homem fechou suas mãos em punhos e tentou se agarrar à falsa conquista:
“Isso... Isso é mentira!! Eu construí um império de tempo e de espaço só pra mim, não construí? Tenho tudo e todos só para mim, não tenho?”
O ser supremo então lançou um sorriso irônico. O primeiro de sua existência. E ergueu sua mão ao alto, fazendo surgir um painel no céu, com imagens de um lugar completamente diferente àquele.
O homem observou abismado e logo voltou ao controle de si próprio:
“Se isso é um outro mundo, pode deixar que eu irei dominá-lo!!”
“Você não pode.”
“Como assim? Claro que posso! Tenho as armas que podem destruir qualquer coisa!”
O ser gargalhou maliciosamente, em vingança de todos os sonhos que aquele homem havia destruído.
“Não pode destruir esse mundo, porque não foi você que o criou. Este é um dos milhares de mundos que os demais homens criaram sem saírem de seus limites. Cada um deles é incomparavelmente maior que o seu. Os homens sonhavam, criavam mundos próprios que eu vi, e conheci. E eles marcaram minha existência de maneira muito agradável. Portanto, jamais poderão ser destruídos, apesar de você ter destruído os seus criadores. Esses criadores podem não estar mais do seu lado, mas eles continuam existindo, enquanto suas criações continuarem.”
“Mas isso quer dizer que tudo que fiz foi inútil? Que eu avancei, avancei e na realidade não sai do lugar?”
“Exatamente. E nada do que você fez poderá ser lembrado depois de sua existência, pois na realidade, nada foi criado de seu espírito. Por nunca ter brilhado, deixará de ser.”
“Mas...!”
O homem não pôde continuar sua fala, pois logo em seguida, sua existência deixou de ser, desaparecendo completamente. O grande ser observou o sumiço do homem tranqüilamente, enquanto se deliciava com as belíssimas criações restantes em suas lembranças. Todas eram feitas por pessoas que não precisaram sair de seus limites, mas que conseguiram alcançar um mundo onde elas podiam ser plenamente deusas, concebendo seu espaço, seu tempo e toda uma existência.


*FIM*
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