Os verbos estão calmos e os fatos políticos são evidentes nesses dias que antecedem a posse. Há uma espécie de paz na política brasileira, mas uma calmaria cheia de articulações que formam a nova face do governo.
O período é de entressafra. Fernando Henrique não decide porque está encerrando o seu mandato. Lula, futuro presidente, também nada decide, porque ainda não assumiu. Enquanto FHC viaja para receber seus prêmios "honoris causa" Lula como um "pop star" distribui autógrafos pelas ruas desse país. E, logicamente, anuncia os nomes dos ministros que terão a co-responsabilidade de conduzir os destinos da nação.
Lula conduz uma engenharia política para sustentação do futuro governo no Congresso Nacional. Um jogo de xadrez em que cada peça antes de ser mexida é pensada exaustivamente. Certo ou errado, agradando uns, descontentando outros, os interlocutores de Lula estão dando aulas de negociação e política.
O presidente eleito está muito bem. Foi perfeito em todas suas aparições na mídia. Completamente consciente das suas responsabilidades e do futuro que o aguarda.
Ao ser diplomado, como presidente, Lula demonstrou que é gente. Gente no sentido mais puro da palavra. E gente simples e que não esqueceu suas origens. Emocionado falou, afastando para o lado os papéis com o discurso preparado.
"Sempre fui cobrado pela falta de diploma e o primeiro diploma que recebo é o de presidente do meu país". Lula foi, simplesmente, pura emoção. E o momento era propício a emoção.
Não assisti as imagens ao vivo, mesmo vendo a reprise no noticiário da noite, foi difícil não nos emocionarmos com a diplomação do ex-torneiro-mecànico.
O presidente chorou porque foi impossível conter a emoção. Choramos todos. Qualquer cidadão do povo nas mesmas condições lembraria dos pais ausentes e dos percalços da vida sofrida. Numa fração de segundos, Lula deve ter pensado nos momentos mais marcantes de sua trajetória. Fagulhas do passado reacenderam sua memória. Ficaram nítidas diante do diploma as imagens das prisões dos companheiros, das assembléias do sindicato no estádio de futebol, imagens da repressão militar nas ruas de São Bernardo. Perfeitamente nítidas, as caravanas da cidadania, o povo que sorri, tem o olhar de esperança e o aceno de uma mão calejada. Ecoaram sons do passado nos gritos de "Diretas já". Imagens das bandeiras que animavam os comícios. Imagens de uma criança que corre em direção ao futuro.
Realmente, um discurso de cinco minutos para marcar a diplomação era muito pouco. Tinha que ter emoção. E para ser emotivo não haveria necessidade de palavras soltas em um papel branco. O que são simples palavras diante de um gesto? O que são palavras diante de uma lágrima? Bastam recordações, um rosto judiado, uma voz embargada e mãos trêmulas. E uma frugal tentativa de minimizar os olhos marejados de emoção. Impossível. O abraço e um lenço fecham a cena porque a emoção é colorida e cheia de esperança. Pra que discurso? O povo brasileiro sabe e viu que nós temos, definitivamente, um presidente.