Quis escrever um conto. Papel e caneta na mão, sem nem mesmo saber para que, e uma idéia na cabeça. Uma idéia não, pois como escritor, teria que ser um tema. É do que vivem/sobrevivem:de inspiração, de temas... Eis aí, minha maior dificuldade - como se outras dificuldades não citadas - fossem menos significativas.
Tinha também o regulamento do concurso (com prazo de entrega inclusive) a queimar-me as mãos. Ruim? Ruim era ter como tema, "Tema Livre". E mais, tanto podia ser contos, como poesias, ou cronicas ou toda e qualquer forma de expressão literária.
Danou-se. Se fossem apenas contos... Não, não, seria pior! Melhor assim. Até porque nem eu, e nem a quem eu consultei, e isso inclui dois dicionários da Língua Portuguesa, sabemos o que difere uma crónica de um conto e vice-versa. Eu mesmo tenho como amiga uma escritora admirável, e o que ela me diz?
- Se tiver diálogo é conto,se não, crónica.
Certo? Certa, certíssima! Tão certa quanto Mário de Andrade: "Conto é tudo o que o autor chamar de conto".
Taí o que me faltava! Vou escrever um conto e ponto (conto? Ponto? Isto tá me cheirando a poesia!) E tem outra definição (só mais uma!) do Rubem Braga, a melhor de todas a meu ver: "(...) A crónica é subliteratura que o cronista usa para desabafar perante os leitores. O cronista é um desajustado emocional que desabafa com os leitores, sem dar a eles oportunidade para que rebatam qualquer afirmativa publicada. A única informação que a crónica transmite é a de que o respectivo autor sofre de neurose profunda e precisa desoprimir-se . Tal informação, de cunho puramente pessoal, não interessa ao público, e portanto deve ser suprimida ."
Ótimo! Com um respaldo deste posso mesmo escrever uma crónica e inscrevê-la como conto. No rodapé transcrevo os comentários, cito as fontes e passo a responsabilidade...
Só mais uma pedra no caminho (ou seria uma pedra no sapato?), o número de linhas: "Em versos, não poderá ultrapassar 45 (quarenta e cinco) linhas, contando-se as linhas que separam os versos e, em prosa, o limite é de 2.500 toques, contando-se os espaços." Pronto, mifu (mifu de sifu) , ou me fu... Contar as linhas até que é fácil (???), mas contar os toques...
Começo então desta forma:
"Tenho meu conto à minha frente e, como se médico-residente fosse, que pela primeira vez vivenciasse a morte retirar pela boca a vida que teimava em ir-se..." .
Maravilha! Ainda me sobram 18 toques para encerrar minha crónica com cara de conto.
Ponto final.
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