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Contos-->O pecado de ser criança -- 28/03/2003 - 11:50 (Marcos Woyames de Albuquerque) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

O pecado de ser criança

Final de tarde, o sol já não era visto no horizonte, mas o véu negro da noite ainda não dominava o ambiente.

Na rua, nós crianças brincávamos enquanto nossas mães não nos chamavam para o banho antes do jantar.

Fazíamos uma alegre e tranqüila algazarra.

Era mais uma tarde de outono. Uma brisa fresca soprava e, apesar disso, nenhum de nós a sentia. O calor da brincadeira aquecia nossos corpos.

Todas as tardes de outono, quando a chuva não nos mantinha guardados em casa, juntávamos em torno do jogo de queimada.

Ainda éramos crianças. A vida ainda não nos impunha suas obrigações. Exceto os deveres escolares, o restante do tempo era dedicado ao prazer de brincar.

Assim foram os primeiros anos. Assim foi minha infância.

Lembro-me perfeitamente no dia em que Jaime caiu e bateu a perna no meio fio. Foi um baque surdo, um grito de dor e um chorar sem parar.

A princípio ficamos em silêncio, paralisados pelo grito de dor.

Corremos até ele e, sem consciência do erro, tentamos levantá-lo. Jaime ficou de pé, apoio-se na perna machucada e caiu. Um grito maior ainda saiu de sua boca e ecoou por toda a rua. Um filete de sangue correu pela calçada.

Aflito corri rápido, o mais rápido que pude e feito um alucinado gritava o nome de seu Jorge, o balconista da farmácia.

- Corre, corre, o Jaime está sangrando, ele vai ficar seco!

- Calma filho, o que aconteceu?

- Corre seu Jorge, socorre o Jaime, ele está perdendo sangue, ele vai ficar seco!

Quando finalmente retornamos ao lugar onde Jaime se encontrava, a quantidade de sangue me parecia muito grande. Jamais vira, em toda a minha vida, tanto sangue assim!

- Alguém vá buscar a mãe do Jaime, chamem D. Carmen, rápido!

A pobre mulher, assustada já veio em prantos e só não piorou a fratura exposta, porque seu Jorge não a deixou pegar o filho no colo.

- Um médico, alguém chame um médico.

O alvoroço na rua era tão grande, que alguém já ligara para a polícia dizendo ter havido um atropelamento. Descreveram o veículo atropelador e até as vestes do motorista.

Muita gente em volta, muita falação e o pobre do Jaime secando, em sangue e em lágrimas.

Custou muito até que alguém tomasse sentido da situação. Finalmente ligaram para o socorro. Naquele tempo, nestes casos, ligava-se para o pronto-socorro e pedia-se uma ambulância.

Alguns minutos e o grito salvador da sirene era ouvido por todo o quarteirão.

Jaime foi colocado na maca. O sangue de sua perna sujou o branco do lençol. Jamais tinha visto tanto sangue em minha vida.

O resto do dia não houve mais brincadeira. Muitos de nós fomos chamados para dentro de casa. Alguns levados pelas orelhas puxadas pelas mães aflitas.

Outros poucos, dentre eles eu, ficamos sentados na calçada especulando o que seria do pobre Jaime.

- Certamente ele vai morrer, perdeu muito sangue

- Se não morrer, ficará aleijado para sempre.


- Eu também acho, você viu como o pedaço de baixo da perna dele ficou virado prá trás?

- Eu não acho, Jaime é um menino bom, vai na igreja todo domingo, Deus vai ter pena dele!


- Ele vai na igreja, mas fala palavrão!

- E o que tem isso, todo mundo fala!


- É pecado, falar palavrão é pecado, o padre até mandou eu rezar cinco ave-marias.

A noite chegou, a hora do banho, a janta e fomos nós para nossas camas, cada um com o Jaime no pensamento.

No dia seguinte soubemos que ele havia sido operado e que logo estaria entre nós.

E, no dia seguinte...

- Viu... Deus teve pena dele!

- Falar palavrão pode até ser pecado, mas ele deve ter rezado muita ave-maria!


Quer falar com o autor? Escreva para mwoyames@ibge.gov.br
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