Acho que foi no dia em a dona Gertha morreu. Talvez. Havia uma multidão no fim do cemitério, ali perto da pedra grande.
Helga correu entre as pedras e achou uma florzinha brotando próximo da pedra maior. Parou para ver uma abelha colhendo néctar.
A abelha foi embora e Helga voltou os olhos para a multidão.
O silêncio e o respeito comunitário foram interrompidos brevemente por uma oração do pastor. Em alemão.
A comunidade era toda descendente de imigrantes da região da Alsácia-Lorena. Dona Gertha era uma das últimas pessoas que haviam chegado ao Brasil enquanto crianças. Alcançou os 89.
Fraulein Helga. 15 anos. A pela clara se destacava no meio da paisagem. Cabelos dourados ao vento, pele levemente sardenta. Na cabeça um enfeite típico alemão.
O pastor luterano entoou um càntico, que a fez esquecer do enterro. Falava de verdes pastos verdejantes, do vale onde o mal não chega.
Ficou imaginando como seria o vale. Mais bonito do que Pomerode ou Blumenau? Talvez. Frida andou por lá certamente. Morreu no ano anterior. Vítima de uma pneumonia.
Desde então buscava uma nova melhor amiga. Hildegard não era exatamente o que desejava. Falava muito.
Também tentou com Karin, mas não houve acerto, pois falava de menos.
Nesse ínterim conheceu Guilherme, que tinha nome de imperador. Frederick Guilherme. Podia ser nome de imperador, mas ali em Blumenau era só o filho mais velho do pastor Rupert.
Gostava do rapazote, mas era severamente vigiada pelos pais, para evitar qualquer deslize.
Um último acorde e um último càntico a trouxeram de volta ao cemitério. Flores espalhadas ao redor de sepulturas lembravam que a morte ronda a vida.
Acompanhou os movimentos de Guilherme enquanto as pessoas começavam a se dispersar. Tinha que compartilhar a tristeza.
Não aguentou o fato de ver o jovem pelo caminho da tristeza. Correu em sua direção e sapecou-lhe um tremendo beijo na boca.