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Artigos-->PRISCILA E OS POETAS CANADENSES -- 17/09/2019 - 17:03 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

PRISCILA E OS POETAS CANADENSES

bill bissett, Nancy Passy, Lenore A. Pratt, Linda Sandler, Hans Johnsen e John Mcleod

 

 

L. C. Vinholes

 

Depois de duas experiências no Japão, atravessei o Pacífico e comecei uma longa estada no Canadá. Não foi nada difícil acostumar-me com a nova vida em Ottawa, onde pude desenvolver um trabalho sumamente gratificante, pelo menos no relativo à divulgação das artes plásticas produzida por artistas brasileiros. Inúmeras vezes, meus contatos no Brasil facilitaram a obtenção de apoio e material diversificado e rico, apreciado por um público que se tornou cativo, mas que, também, adquiriu número expressivo de obras. Ao mesmo tempo, procurei conhecer o ambiente cultural canadense, concentrando meu interesse especialmente no relativo à música e à poesia. Mas foi a poesia que mais me chamou a atenção, por estar sempre presente, especialmente nas páginas de jornas e em publicações especializadas, como a The Canadian Forum, fundada em 1920, na Universidade e Toronto, publicação considerada esquerdista, abrangendo assuntos culturais e políticos e que encerrou suas atividades no primeiro ano deste século, depois de, por décadas, publicar textos sobre os pintores do Grupo dos Sete e textos literários e poesias de figuras da importância de Margaret Atwood e Early Birney.

 

Acompanhando o que trazia o The Ottawa Journal, chamou minha atenção a frequência dos poemas de Nancy Passy, com marcante afinidade com a poesia clássica japonesa conhecida como haikai, não na forma, mas sim na leveza do seu texto, na afinidade e delicadeza, quando lidando com as caraterísticas das estações do ano do hemisfério norte. Escolhendo vinte e seis poemas, em 1979 organizei a, até hoje inédita, miniantologia bilíngue Bosquejos dos Quatro Ventos, edição datilografada com cinco cópia e encadernação artesanal, dividida em quatro partes, cada uma iniciada com uma sazonal ilustração, também de autoria da poetisa canadense.

 

 

Na The Canadian Forum os poemas eram sempre de diversos poetas, não tão conhecidos, e a eles também me dediquei com interesse e curiosidade. Na expectativa de, eventualmente, criar um elo de contato com os autores, sempre que terminava a tradução de um poema enviava uma cópia para o endereço da revista e, dentro do mesmo envelope um outro envelope endereçado ao autor do poema, contando com a intermediação dos editores. Embora nunca tivesse recebido resposta ao meu gesto, não abandonei meu plano. Por intermédio da bibliotecária Janet McGregor, obtive exemplar do livro de poemas da celebrada poetisa Susan Musgrave, dedicado ao público infantil, tratando das aventuras do gato Gullband e seus parceiros: Grim, um sapo de boca grande, e Thrum, estranho no seu aspecto, resultado do “cruzamento de um lagarto com um bicho qualquer”. Chama a atenção o poema Gullband ao Brasil e a ilustração mostrando o gato com cabeça e meio corpo enfiados em um calçado masculino feito de couro de jacaré que, como curiosidade, traduzi, chamando a atenção passagens tais como a que, em verso livre, diz:

 

“As crianças no Brasil

nunca tinham visto um gato,

elas colocaram-no em uma gaiola

e deram-lhe de comer

bananas”.

 

 

Experiência gratificante foi a com o poeta de Vancouver bill bisset, assim, em minúsculas como deseja, poeta “não convencional” que conheci em 27 de março de 1979, quando ele visitava Ottawa para, na Galeria Saw, participar de evento para leitura de poesias. Convencido por seu pragmatismo em querer “quebrar todos os sistemas rígidos, incluindo gramaticais e linguísticos”, o que pratica na redação dos seus textos, e pela sua importância no âmbito da nova poesia canadenses, escolhi o primeiro bloco de um poema da antologia Medicina, minha boca em fogo, para texto da minha composição Tempo-Espaço XIV (1978), com partitura de leitura-preparada para vozes e flauta solo:

 

suk a

soul lik tjs

soul eatin ths soul

ya sukkin ths

heer soul

soul suk

suk a soul

.

 

Sobre esta composição, o professor Paulo Cesar Moura, no seu livro Música Informal Brasileira (2016), fez os seguintes comentários:

 

“Nesta obra, a realização instrumental deverá acontecer simultaneamente à leitura do poema “Suk a ...”. O autor estabelece uma correspondência entre as letras utilizadas no texto e uma escala cromática, criando assim módulos equivalentes às palavras/vocábulos, e que podem ser executados na sequência e intensidade desejada pelo intérprete. A possibilidade de repetição de cada um dos módulos depende do número de vezes que as palavras/vocábulos equivalentes aparecem na poesia. A notação aqui utilizada é tradicional e determinadas notas podem ser executadas em qualquer oitava. Para a leitura do poema o autor criou uma partitura esquemática a partir de sua espacialização por meio da divisão por sílabas ou letras em dez linhas, cabendo a cada pessoa ou grupo de pessoas a leitura horizontal de cada uma delas. Timbres, alturas, intensidades e andamentos ficam a critério dos intérpretes. A formação vocal é livre, podendo ocorrer qualquer mistura de vozes masculinas, femininas ou infantis. A ordem do poema é fixa e o autor sugere que seja feito um crescendo lento e gradual”.

 

 

Como testemunho do permanente contato com bisset, recebi, autografadas, as antologias de poemas: Sailor (1978), Soul Arrow (1980), Beyond Even Faithful Legends (1980), Animal Uproar (1987), What we have (1988), sublingual (2008), bem como o romance a quarto mãos griddle talk - a year uy bill n carol dewing brunch (2009), produzido com a parceria de Carol Malyon, e o intitulado novel, “um romance reunindo poemas e ensaios” (2011). Juntamente com obras de Early Birney, bpNichol e a memorável antologia Four Parts Sand (1972), com poemas de Earle Birney, bill bissett, Judith Copithorne e Andrew Suknaski, as obras de bisset hoje fazem parte da Coleção Vinholes, do Centro de Referência Haroldo de Campos, na Casa das Rosas em São Paulo. Esclarecendo o porquê do l.c. nas dedicatórias de bisset, registro que ele e Lloyd Stanford, coordenador e produtor da Rádio Comunitária CKCU FM 93.1 da Universidade Carleton, de Ottawa, parceiro dos programas de música e poesia brasileira de meados de 1982, intitulados Mosaico da Literatura do Brasil, são os únicos canadenses que sempre me trataram pelas iniciais do meu prenome: elece, em inglês élci.

 

Recentemente, colega e amiga contemporânea de parte dos anos vividos no Canadá presenteou-me com xerox de originais e cópias datilografadas das minhas traduções de cinco poemas canadenses, material por ela guardados durante décadas: Amor não correspondido (1978), de Nancy Passy e que não consta da citada miniantologia e Insinuação (1978) de Lenore A. Prates, publicados no The Ottawa Journal; História para o vencido / pode bradar alas, de Linda Sandler; Franklin / Nevasca no amanhecer (para Dave West), de Hans Johnsen; e Priscila e João P, de John Mcleod, nas páginas do The Canadian Forum.

 

Depois de uma rápida revisão, coloquei lado a lado os originais e as traduções destes poemas que aqui figuram recuperados:

 

 

POEMAS CANADENSES DE 1978

 

 

UNREQUITED LOVE

Nancy Passy

 

Don’t shrug your shoulders at my love

Which lingers in your garden of enchantment,

Where sincerity is just a whisper away,

While your seasonal love,

Echoes from a distant cloud

 

Ottawa Journal, October 10, 1978.

 

AMOR NÃO CORRESPONDIDO

Nancy Passy[i]

 

Não dê as costas ao meu amor

Que permanece no teu jardim de encanto,

Onde sinceramente é apenas distante murmúrio,

Enquanto teu amor sazonal,

Ecoa de uma nuvem distante.

 

Ottawa Journal, 10 de outubro de 1978.

 

 

 

INTIMATION

Lenore A. Pratt

 

Days before the end of summer

In this still air comes intimation

Of approaching autumn.

Cabrapples have a pale bloom

Like that of ripened grapes and hang

Ready for gathering on laden branch.

Barries of Mountain Ash are tinged

Each day dipper with tint of ochre:

This year’s flock of robins

Already claims the fruitfull tree.

 

Some small creature scurries

Daylong over the rooftop seeking

Snug winter crevice under the eaves.

From time to time a sig le leaf

Drifts reluctant to the grass.

Moonlight lies unbroken by a ripple

On glassy water of Mooney’Bay.

 

We who know each season well,

Sense approach of autumn

In noonday lilt of goldfinches,

Brief garden visitants, this memory

A beauty to cherish, a beauty

All too soon to go.

 

Ottawa Journal, August 23, 1978.

 

INSINUAÇÃO

Lenore A. Pratt

 

Dias antes do fim do verão

Neste ar tranquilo vem insinuação

De outono chegando.

Macieiras bravas têm um florir pálido

Como o das uvas amadurecidas e pendem

Prontas para carregar em galhos repletos

Amoras do Monte Ahs pintam

Cada dia mais com tinta ocre.

Os bandos de tordos desse ano

Já reivindicam a árvore frutífera.

 

Algum ser minúsculo dispara

O dia inteiro na cumieira procurando

Confortável abrigo invernal sob o telhado.

Vez por outra uma folha só

É levada relutante para a grama.

O luar permanece inabalado pela ondulação

Na água cristalina da Baia de Mooney[ii].

 

Nós que conhecemos bem cada estação,

Sentimos o aproximar do outono

No canto de pintassilgos ao meio-dia,

Visitantes apressados do jardim, esta lembrança

Uma beleza a acariciar, uma beleza

Toda tão pronta a findar.

 

Ottawa Journal, 23 de agosto de 1978.

 

HISTORY TO THE DEFEATED/

MAY SAY ALAS

 

Linda Sandler

 

You dealt cards in a candlelit barn

and turns up spades;

you lay all night in your apartment

watching the darkness

 

Now luminous hands on the dial

say your hour has come;

you turn back the badecover,

seconds elapse like days

 

and you take nothing with you

you ae running half bent

for the exit

You look up and there are

flaming trees

Towers are gutted , they fold

like clams

 

and the earth receives them

 

This is sunrise hour and arid sun

hangs on the  edge of the sky

The city becomes an hypothesis

and you are becoming

 

a melody, a halftone on the flute,

an historical footnote

 

A woman descends on a silver wire,

she is Queen of  Spades

You remember days of perfect communion

and you are afraid of nothing:

 

you mouth shapes her name,

your lips touch,

you rediscover romantic love

and a silver

wire

 

detonates inside your skull

 

The Canadian Forum

Vol. LVIII nº 683, September 1978.

 

HISTÓRIA PARA O VENCIDO/

PODE BRADAR ALAS

 

Linda Sandler

 

Carteias num barracão iluminado à velas

e dá espadas;

deitas a noite toda em teu apartamento

espreitando a escuridão

 

Agora mãos luminosas sobre o mostrador

dizem tua hora chegou;

puxas as cobertas,

segundos passam como dias

 

e nada levas contigo.

Disparas meio curvo

para a saída

Olhas para o alto e lá estão

árvores em chama

Torres são destruídas, elas se dobram

como amêijoas

 

e a terra as recebe

 

Esta é a hora do nascer do sol, e o sol árido

pende no canto do céu

A cidade vira uma hipótese

e estas voltando

 

uma melodia, um meio-tom na flauta,

um rodapé histórico

 

Uma mulher desce num fio de prata,

ela é a Dama de Espadas

Recordas dias de perfeita comunhão

e estás preocupado por nada:

 

tua boca balbucia o nome dela,

teus lábios tocam,

redescobres amor romântico

e um fio

de prata

 

detona dentro do teu crâneo

 

The Canadian Forum

Vol. LVIII nº 683, setembro de 1978.

 

FRANKLIN /  EARLY MORNING BLIZZARD

(FOR DAVY WESTER)

 

Hans Johnsen

 

this morning

a veil of snow

draws over the face

of the

sun

 

in the tent

the men

still burry their eyes

in sleep

 

even the dogs

howl in fear

of their sight frozen of

 

I lie awake

scratching the dream

from the eye of my mind

to record the light

falling away

 

perhaps in all

this is the best place

to grow blind

 

The Canadian Forum

Vol. LVIII, nº 684, September 1978.

 

 

FRANKLIN / NEVASCA O AMANHECER

(PARA DAVE WEST)

 

Hans Johnsen

 

esta manhã

um véu de neve

cerra sobre a face

do

sol

 

na barraca

os homens

ainda sepultam seus olhos

no sono

 

até os cães

uivam de medo

de suas vistas congelarem

 

estou deitado desperto

cossando o sonho

desde o olho de minha mente

para registrar a luz

desfigurando

 

talvez de todos

este seja o melhor lugar

para crescer sego

 

The Canadian Forum

Vol. LVIII, nº 684, setembro de 1978.

 

PRINCILLA AND JOHN P

John Mcleod

 

After

a lifetime with John P

Priscila

became made

I’m note saying

eight children

and a diet of porridge

left marks

but

the truth is

near the end

Priscilla

was made

 

Her life

had been a life of order

mumbling prayers

in  the confessional

and taking her medicine

with John P

 

Priscilla

was the one

who ordered the farm

ordered the man of the town

directed the roads

commanded the night lights

pressed down the skirt pleats

pushed down the hills of the valley

said her piece

and called God

twice a day

 

But near the end

she took a burning shirts and smiling

scattering flour o the floor

peeking from behind books

confessing to the strangest things

not wearing bloomers

and spreeding her legs

In the olddest fashion

 

The Canadian Forum

 Vol. LVIII nº 682, August 1973.

 

PRISCILA E JOÃO P

John Mcleod

 

Depois

de uma vida inteira com João P

Priscila

ficou doida

não quero dizer

que oito crianças

e uma dieta de mingau

deixou marcas

mas

a verdade é

que perto do fim

Priscila

estava doida

 

Sua vida

tinha sido uma vida de ordem

murmurando preces

no confessionário

e tomando seu remédio

com João P

 

Priscila

era

quem mandava na fazenda

mandava no homem da vila

 mostrava os caminhos

controlava as luzes da noite

passava as pregas da camisa

aplainava as colinas do vale

dava seu palpite

e chamou a Deus

duas vezes por dia

 

Mas perto do fim

ela passou a queimar camisas e sorrindo

espalhando farinha no chão

espiando por trás de livros

admitindo as coisas mais estranhas

não vestindo calções

e abrindo suas pernas

à moda antiga

 

The Canadian Forum

Vol. LVIII nº 682, Agosto de 1973.

 

 

 

Um registro que me parece complementar é sobre Priscila, não a com dois ll do poeta canadense, mas a que foi fiel depositária de meus poemas, crítica de algumas das minhas traduções e parceira dos horários de almoço no tempo em que estávamos lotados na embaixada do Brasil em Ottawa. Com Licenciatura em Letras pela UFC, Priscila é filha de Antônio Girão Barroso, cearense do Araripe, escritor, poeta, jornalista e professor da Universidade Federal do Ceará, membro fundador do Grupo Clã na década de 1940 que reuniu os expoentes do modernismo cearense. Carlos Augusto Viana sintetiza sua última fase poética quando diz que se interessou pela “busca do coloquialismo da fala brasileira; daí a valorização dos versos livres e brancos ou, então, a combinação de versos variados”. Priscila é irmã do também amigo Oswald Barroso, figura sempre envolvida com a defesa e promoção da cultura cearense, poeta, jornalista, teatrólogo, dramaturgo, autor de mais de quinze livros e membro do corpo docente da Universidade Estadual do Ceará, reuniu escritos dos últimos 30 anos, na obra Ceará Mestiço, lançada em abril de 2019. A amizade com Priscila se consolidou não só no ambiente de trabalho, mas também graças à coincidência de interesse pela cultura e pela arte. Prova disto é que, no início de 1978, participamos de um curso prático de técnica de vitral, na galeria You Frame It, com resultados preliminares satisfatórios.

 

Certa vez, na volta do almoço, Priscila e eu passamos em uma galeria da Rua Albert onde adquiri escultura de um pássaro esculpido em pedra-sabão preta, criação da inuit Anirnik Ragee, esquimó de Cabo Dorset, no norte do país. Paralelamente ao cuidado que dedicava aos seis filhos, esporadicamente esculpia pequenos pássaros que vendia para suplementar a renda familiar. Fiquei com o pássaro, mas à Priscila dediquei o poema Voo Impossível:

 

pássaro de pedra

que o céu não conhece

não olha o céu

não sabe voar

 

 

pássaro de pedra

nem pedra nem pássaro

o céu não te espera

não tentes voar

 

Embora de pedra e não podendo voar, o pássaro preto, em voo de migração, mas sem volta, cruzou as Américas e hoje encontra guarida no Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo, de Pelotas (RS).

 

Durante os anos em que Priscila esteve lotada em Praga, dá Primavera de 1994 até o final de 1997, ela foi minha ponte de contato com Stanislav Hrubý, flautista da Orquestra Sinfônica Checa, com quem, durante curto período e enquanto as autoridades do regime lá vigente permitiram, troquei comedida correspondência. Hrubý chegou a ser professor de flauta de Érica, a filha mais moça de Priscila. Descobri Hrubý em um dos verbetes da enciclopédia International Who´s Who in Music, de 1977. Escrevi a primeira carta e enviei a partitura da peça dodecafônica Existencialismo (1958), para flauta solo, trilha sonora para a coreografia homônima da estadunidense Mary Mackinney, e a resposta chegou em janeiro de 1978, registrando impostas limitações:

 

“I appreciate your friendly attention. I can interpret much more exacting compositions too, but not publicly. I am only an orchestral player. For activity of soloist I have not already a disposals, I regret deeply that I cannot send you a joyfuler note”. (Aprecio sua amistosa atenção. Posso interpretar composições muito mais exatas também, mas não publicamente. Sou apenas um músico orquestral. Para a atividade de solista ainda não tenho qualificação. Lastimo profundamente não poder enviar para você notícia alegre).

 

Em julho de 1978 veio a surpresa desagradável que ditava o fim do nosso relacionamento:

 

“Unfortunately, I must not already be in correspondence with foreigners without cognizance of our offices. May by it is the measure temporary. Excuse me that I shall not write for the present”. (Infelizmente, não devo agora corresponder-me com estrangeiros sem o conhecimento de nossos superiores. Talvez a medida seja temporária. Desculpe-me que não escreverei por enquanto).

 

Em carta de março de 1994, Hrubý confidencia que “On the past I was warned before consequences of the private correspondence” (No passado fui advertido sobre as consequências da correspondência pessoal). Revela seu plano pessoal não atingido: “I want work and live for a love and beauty legal but I did not find an understanding” (Desejo trabalho e viver por um amor e beleza legal, mas não encontrei compreenção). Queixa-se da precariedade da saúde: “Long years I’m not in good health. I know not good doctors and medical specialists. My efficiency is very limit” (Há muitos anos não estou bem de saúde, não conheço bons médicos e especialistas em medicina. Minha eficiência é muito limitada). E, no final desta carta, depois de me deixa saber que estivera no Brasil, tocando na orquestra de câmara, no Rio de Janeiro, em São Paulo e Porto Alegre (“In Brazil I was playing with the chambre orchestra too Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre), revela: “Now I´m unfortunatly in an old-age pensions” (Infelizmente, agora estou em uma pensão de velhice).

 

Tentando reatar os contatos com Hrubý, valendo-me de Priscila que voltava para seu posto em Praga, em abril de 1995, enviei carta acompanhada de maços de cigarro e barras de chocolate, atendendo a antigo pedido. A encomenda chegou, mas Hrubý estava aposentado, levando uma vida de sonhos frustrados. Sentindo-me compartilhando o desaponte e os sofrimentos do amigo do Leste Europeu, cheguei a imaginar que a ingratidão, muitas vezes, não nos permite ter poesia em nossas vidas.

 

Uma vez que se está falando de poesia, é plausível que se registre duas exposições de poesia concreta brasileira realizadas em Ottawa e Toronto, com a intenção de mostrar ao público canadense em geral e, especialmente, à geração universitária da década de 1980, o que criavam os poetas brasileiros.

 

A primeira exposição foi realizada de 4 a 17 de novembro no Centro Universitário e de 4 de novembro a 2 de dezembro de 1983, na Biblioteca Morisset e na galeria do Pavilhão Simard, da Universidade de Ottawa, com farta documentação sobre a produção dos três poetas fundadores do Grupo Noigandres, Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari, e dos associados à nova linguagem, nascida em meados da década de 1950. Antologias, recortes de jornais, fotografias e paineis permitiam ao público conhecer também poemas de Edgar Braga, José Lino Grünewald, Luiz Pinto, Pedro Xisto, Alcides Pinto, Ronaldo Azeredo, Manuel Bandeira, Mario da Silva Brito, Clarival do Prado Valadares, Dora Ferreira da Silva, Marcelo Moura, L. C. Vinholes, Antônio Girão Barroso, Eusébio Oliveira, João Adolfo Moura e Marcelo Moura, os quatro últimos poetas do Ceará. Míni-cartaz bilíngue, produzido e distribuído graças ao apoio do professor Ives Blair, chefe do Escritório de Animação Cultural, Línguas e Literaturas Modernas, divulgou a mostra. Em duas vitrines do Pavilhão Simard, visando chamar a atenção dos visitantes e valendo como merecido reconhecimento pelo interesse pela poesia concreta brasileira, foram exibidas fotos e antologias dos poetas japoneses Kitasono Katsue, Fujitomi Yasuo, Niikuni Seiichi, Uchida Toyokiyo, Akito Otsu, Horiuchi Reiko e Shimizu Toshihiko, bem como antologias dos poetas canadenses que figuram da antologia Four Parts Sand. Na ocasião contou-se com a participação do doutor Claus Clüver, Professor Emérito, do Departamento de Literatura Comparada da Universidade de Indiana, em Bloomington, Estados Unidos da América do Norte, que proferiu conferência sobre o tema A poesia concreta: uma perspectiva internacional. Retomando a estratégia anterior, a segunda exposição de Poesia Concreta Brasileira no Canadá foi realizada de 10 a 30 de janeiro de 1985, nas acolhedoras vitrines do Salão de Eventos da Biblioteca Robarts da Universidade de Toronto, com todo o material da mostra de Ottawa relativo aos poetas brasileiro. Recebeu apoio do Grupo Brasil e do Seminário Brasil daquela universidade e contava com a ativa presença do leitor brasileiro, professor Ricardo Sternberg.

 

Diferentemente do que aconteceu no Japão na década de 1960, depois da I Exposição de Poesia Concreta Brasileira no Museu de Arte Moderna de Tokyo, com repercussão na imprensa e nos meios ligados à poesia contemporânea de vanguarda, resultando no surgimento da poesia concreta japonesa, as ideias do concretismo poético brasileiro que posteriormente floresceu também na Europa e nos Estados Unidos da América do Norte, não mereceram acolhida no Canadá. A poesia canadense da época, salvo válidas exceções, continuava ligada à concepção poética e às escolas da poesia inglesa clássica.

- + -

Nota: Ampliando os registros acima sobre a nova poesia canadense que conheci, são os artigos A Miniantologia de Nancy Passy, A poetisa e escritora Susan Musgrave e poemas de Passy, Musgrave e Sandler, disponíveis no sítio <www.usinadeletras.com.br>. O artigo Um novo poeta canadense: bill bissett, foi publicado no Diário Popular, de Pelotas (RS), em 22 de agosto de 1982. Do mesmo sítio figura o artigo Um flautista chamado Stanislav Hrubý, de 07 de agosto de 2012.

 

 

 



[i] Nancy Passy frequentemente publicou seus poemas no Ottawa Journal que, embora, quanto à forma, nada tivessem com os haicais japoneses, contudo, com estes, tinham a afinidade e a delicadeza quando lidando com as caraterísticas das estações do ano. Contando com quatro ilustrações produzida pela poeta, organizei uma pequena antologia bilíngue ainda inédita.

[ii] Em 24 e dezembro de 2017 este nome foi dado à estação Baia da Confederação, em Ottawa, Canadá.

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