Da minha janela não há mundo que seja visto e só percebi esse descuido hoje, ao me voltar para ela e olhar bem rente ao desejo. Não há mundo, meu deus. Não há. Nem existe aquele frescor de chuva quando quer aparecer. As pessoas não aparecem e o sol se esconde por entre os prédios. Por que logo hoje fui lembrar da janela? Nem a vi passar! No quarto entrei por meia hora e me arrumei e sai. E agora volto, olho e não há nada.
Vinho, cor do amor. Coloco a taça na janela. Quero que ela seja do mundo agora. Bebo, descanso, descanso, bebo e não quero mais um mundo na janela. Alguém me disse que devo fecha-la e me soltar, desaparecer na imensidão que me espera. A janela me espera? Que tipo de ano ela teve? Ainda vou pergunta-la. A taça de vinho está contra janela. Como também está a musica. Toca errado, ao contrario. E não gosto nem um pouco de olhar para trás. Essa mesma janela me cobra o ano, deslizes, amores, o que não fiz, o sentido que levei comigo. Oh, janela ingrata, já disse isso no ano.
Vou, eu vou. Ando para o mundo, pois nele me pertenço. Sou dos copos de vinho, das janelas abertas, do direito de sempre sorrir. Repito palavras como quem quer memoriza-las. Ando contente para ser. E visto aquele manto vermelho de amor para que haja certeza na despedida. Faço gestos com as mãos, sendo admirada por quem admiro. Não respeito quem não faz jus ao meu carinho. Já não tive respeito por tanta coisa que perdi a conta dos deveres de casa: sentar, ouvir, explicar, exclamar e deixar estar, rancorosa, guardando anseios para outros lugares. Não sou mais assim, respeito quem me respeita, nada mais.
E hoje vou, sinto que vou. Pergunto a janela para que seus deveres servem. Ela não me diz, então a fecho. Apenas vou...
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