Usina de Letras
Usina de Letras
82 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62243 )

Cartas ( 21334)

Contos (13266)

Cordel (10450)

Cronicas (22538)

Discursos (3239)

Ensaios - (10369)

Erótico (13570)

Frases (50639)

Humor (20032)

Infantil (5440)

Infanto Juvenil (4769)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140811)

Redação (3308)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6198)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->Eulália- Capítulo V - Final -- 08/05/2003 - 00:54 (Christina Cabral) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
EULÁLIA – CAPÍTULO V – FINAL

(Depois de longo e tenebroso inverno... Fogos, rojões e bandeirolas! Acabou, para alegria dos meus milhares assíduos leitores. Vamos lá.)

CAPÍTULO V.

Ela voltava para dar-lhe remédio, esvaziar o urinol, trazer-lhe água. Entrava e saía sem falar, mas não deixava de sorrir.

- Abestada ela não é – pensava – faz tudo direito, bem limpinho, mas não fala nada... e fica rindo à toa! Sei não...

O tempo que tudo cura, passou, e Zé Maria recuperou as forças, já caminhava de mansinho, sentava-se ao sol. A casa cuidada e a ordem em suas coisas o satisfaziam, mas, o silêncio entre os dois era insuportável.

Eulália passou a armar sua rede no canto da sala; enrolava-a já bem cedinho e punha-se a trabalhar com gosto. A presença do homem era-lhe agradável e o seu cheiro ficava-lhe entranhado nas narinas, quando ele passou a sair para fazer pequenos serviços ao redor da casa. Na hora certa, ela levava-lhe um alimento ou remédio e voltava a lidar na trabalheira do sitio, como se sempre ali tivesse morado.

A roupa estendida a quarar, o ferro a espocar fagulhas,
a cozinha a recender, foram dando notícias de sua presença e incorporando-a à casa. Um café na hora certa, ou mesmo inesperado... Mas quando um dia, dia radioso, em que Zé Maria se refestelava na rede, de baixo de um cajueiro e ela surgiu de cuia d’água, sabão, uma toalha branca, mais a navalha nas mãos... ele se entregou. Deixou que as mãos morenas espumassem sua barba de muitos dias por fazer, que os dedos gentis lhe esticassem a pele, que lhe raspassem a cara e a escanhoassem. Sorrindo, apenas sorrindo, ela se aproximou e o barbeou com a maior naturalidade do mundo e não se pejou que seus olhos amarelos percorressem o seu rosto e descessem pelo pescoço e mergulhassem, encantados, nas profundezas do seu decote. Sorrindo, sempre sorrindo, ela partiu e deixou-o abismado com o que ela havia feito, sen titubear, sem pedir licença.

Acostumado com a solidão, Zé Maria começou a sofrer. A presença dela punha-o nervoso, alerta; via-se tratado e cuidado, como os muitos animais do sitio; com segurança, eficiência e rapidez. Depois tornava a ficar sozinho, a senti-la pela casa, a buscá-la com os olhos pelos cantos. Passou, então, a se afastar, para cuidar da horta, da roça e, mesmo assim, ela vinha trazer-lhe um angu bem feito, um copo de leite de cabra e partia, deixando o seu cheiro empastado nos seus sentidos,agora já bem alertas.

As noites tornaram-se longas. Enquanto ela se entregava a um sono reparador, ele se retorcia na rede, a imaginá-la e senti-la na sala...

- Ela é minha mulher... – pensava – mas se eu toco nela o padre não vai poder levá de volta... ela já andou por aí... mas eu não posso abusar de quem me cuida! Home devia ser como bicho: sujeita a fêmea e, pronto!

Um dia, ele acordou bem cedo e partiu para roça, sem se alimentar. Dormira muito mal. Queria espairecer a noite de insônia.

Logo depois, Eulália veio ao seu encontro e trazia, como sempre, o seu alimento. Vinha séria e, enquanto ele comia, sentado na grama úmida de orvalho, ela sentou-se ao se lado e falou:

- Seu Zé, eu vô embora hoje, com o padre. O senhor já tá bom, já pode se cuidar sozinho. Num é home que precise de mulher, não; eu tô atrapalhando a sua vida.

Parou um pouco de falar e, olhando com muita tristeza, completou:

- Vô voltá pra zona...

Zé Maria fitou-a estarrecido. Seus olhos percorreram aquele corpo bonito, desceram pelas suas pernas, contemplaram os pés pequenos e, num rompante, deixou cair o prato e se atirou sobre ela. Derrubou-a sobre o mato ralo e procurou-a com as mãos frementes. Eulália envolveu-o com carinho e se entregou com doçura.

As folhas da relva estalavam, se amassavam. O cheiro do mato esmagado misturava-se com o cheiro de seus corpos; havia fúria, fome, ânsia no seu encontro. Beijos estalados fendiam o ar, resfôlegos e gemidos os acompanhavam... Depois a lassidão, o repouso, aquela moleza, aquele cansaço gostoso...

Tendo ainda o corpo de Eulália junto ao seu, aquela beleza de corpo recendendo a sabonete, Zé Maria fitava as nuvens: quanta paz! Quanto prazer! Mulher é bicho bom demais!

Os olhos amarelos de Zé Maria voltaram-se para os negros e profundos olhos de Eulália:

- Tu ainda pensa em voltá? – perguntou, suplicante.

- Pra zona?

- Sim.

Lentamente, manhosamente e sorrindo, como era o seu natural, ela foi se levantando. Arrumou os cabelos, ajeitou a saia, juntou o prato e a colher e, cheia de felicidade respondeu:

- Num carece mais...

E partiu com a mesma naturalidade com que havia chegado.


THE END




Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui