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Erotico-->Vencedores (Trad. de Strikers) -- 11/04/2003 - 09:51 (Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Vencedores
David Taylor
Trad: Lúcio Emílio do E. S. Júnior


Henderson está levantando a verde e vermelha bola sobre sua cabeça, sua língua pulando para fora de sua boca.
“Olhem para mim”, ele grita.
Ele a joga e ela entra na cesta.
“Sim, cara”, eu digo, “é uma cesta”.
Eu estou farto de piadas sobre nossas partes íntimas. Mas nós não podemos impedir isso. Estávamos realmente curiosos sobre quais de nós são os reais Vencedores da Gonorréia e quais são meramente Respiradores de Placebo. Henderson pegou uma bola de boliche e jogou, derrubou dois pinos.
“Isso são dois, Henderson?” Puccini, disse.
Henderson sentou na cadeira de plástico, e colocou seus braços ao redor do peito. “Como eu posso me concentrar com todo esse barulho?”
“Tente com fluoroquilones!” Eu disse.
Em troca, recebo um olhar vazio.
“Vocês sabem o que significa a resistência à penicilina, não, rapazes?”
“Allen, cale-se”, diz Puccini na cadeira de juiz. “Estamos tentando relaxar por aqui”. Tentando ganhar um jogo”.
Ele ergueu sua mão aberta pela alameda.

O anúncio no Guinea Pig Zero, o mais lido jornal de concursos para voluntários, tinha sido mais vago que o usual. Ele selecionava homens entre 30 e 55 para ajudar a identificar uma doença ainda sem nome. O honorário era mais alto que o costumeiro (mais do que 1.800 dólares), e o telefone parecia ser uma linha no Campus da Universidade Johns Hopkins.
Dr.ª Gordon deixou claras as coisas no primeiro dia. “Ajudando com este estudo”, ela disse, “você vai ajudar muita gente que nem sabe que tem gonorréia ainda”.
Um terço de nós foi inoculado com uma injeção de resistência à penicilina, um terço com uma injeção contra a tetraciclina, um terço não recebeu nada, enfim, fomos o patético “grupo de controle”, para quem nenhum dos remédios oralmente inoculados (grepafloxin e cefinxine) teriam nenhum benefício. De fato, eles nos fariam doentes. Precioso.
Então ele vai nos dividir de novo para ver que drogas trabalhavam para que tipo de resistência.
A doutora explicou tudo isso sentada em sua cadeira, com as pernas cruzadas, suéter azul. Um par de belas e firmes pernas. Nós estávamos ao redor num círculo como abelhas operárias. Ela tinha um dedo erguido, apontando sintomas que nós podemos esperar.
“Primeiro, você vai sentir dor quando urinar”.
“Que tipo de dor?” Eu perguntei. “Aguda, pulsante...”
“Aguda, predominantemente”.
“Até onde? Por toda minha barriga ou...”
Ela riu. “Isso depende, Allen. Você saberá”.
Então ela me odiava. Bem. Alguém vai ter que enfrentar tais coisas. O resto dos outros ficou paralizado. Perfeitos para cobaias. Ela ergueu outro dedo.
“Segundo, você pode experimentar uma descarga da uretra.”
O velho sr. Lee preocupou-se antes. “O quê?”
Eu disse bem alto para todos ouvirem.
“Pô, do caralho.”
“Oh”, ela sentou de novo, de braços cruzados.
“Isso vai machucar, também”?” Henderson disse. Ele em último caso estava curioso.
“Não, dificilmente enfim. Assim que você experimentar os sintomas e vir até mim, vou te dar antibióticos mais fortes para resolver o problema. Não temos interesse em te ver mal.”
Ela disse. Rindo como se estivesse tratando uma louca paranóia masculina.
Dr.ª Gordon nos mostrou a sala de ginástica. Delicada, como sempre, mostrando os fatos primeiro, depois os efeitos.
“Dor quando urinar”, Henderson murmurou. “São todos os tratamentos assim?”
Eu contei até dez, e deixei alguém falar primeiro. Eu estou cansado de ser o cara que responde. Mas ninguém disse nada.
“Não”, eu disse. “Eu estive em quinze pesquisas, seis delas no Hopkins. Ninguém nunca falou de dor no início.”
“Eu pensava que eles tinham acabado com a gonorréia há dez anos atrás.” Henderson, disse ele com sotaque sulista.
“Você escutou o que ela disse”, eu completei. “A gonorréia subiu trinta por cento nos últimos nove anos. Nós devíamos comprar um estoque.”
Henderson estava olhando para mim com uma assustadora tranqüilidade em seus olhos, e seu queixo de John Malkovich.
“É porque estou aqui”, eu sorri.
O cara com o cabelo à escovinha andou até Henderson. “Meu nome é Puccini. Bob Puccini. Sim, eu estava esperando que íamos entrar em forma durante essa experiência. Eu nunca tenho tempo de fazê-lo de outro modo.”
“Certo”, eu disse, “nós todos temos agendas cheias”.
“Esta é minha quarta experiência”, disse Puccini, ignorando-me. “Toda vez que ouço esse zumbido, eu me sinto como Jonas Salk, o doutor que descobriu a vacina para a polio.”
Eu bufei de raiva. Nós esquecemos a Dr.ª Gordon na sala e fomos para a piscina.
“Ah, eu ia esquecendo”, ela disse, subindo nos saltos. “Meus caros, eu estou temerosa que, devido à natureza deste estudo, nós não poderemos deixar vocês usarem a piscina”.
“Por que isso, doutora?” Henderson disse.
Pela primeira vez que a Dr.ª Gordon parecia irritada. “É a sensibilidade que a inoculação cria, mas não há risco”—
“Diga tudo, doutora.”
“A administração sabe que não há risco de transmissão, mas é difícil convencer os outros usuários da piscina. É uma questão de não ter a cabeça aberta, mas...” Suas mãos se moviam como se tivessem de apagar uma explosão de ignorância.
“O quê, então eles ‘tão com medo de que seus paus apodreçam se nadarem na mesma água que nós?”
Não sei porque, mas às vezes quando digo o que todos estão pensando, sou olhado da maneira mais bizarra.
O primeiro cara caiu fora tão cedo que ninguém teve tempo de aprender seu nome. Eu me lembro de alguém chorando no banheiro na terceira manhã, e daí o cara se foi.
Aquilo nos chocou. Henderson andou o dia inteiro pálido. “Jesus, eu não sabia.”
Uma coisa que é muito manjada nestes testes é a seriedade com que escutamos a vida de todo mundo entre duas pizzas no dormitório, da segunda noite em diante. Como garotos levando a sério um acampamento de verão. Os corações nus diante da fogueira. Depois de quinze dessas historinhas eu só queria assistir os filmes, jogar o boliche, rir um pouco, e evitar ser espetado pelos médicos. Mas alguém começou o show de cães e pôneis, ou seja, acabamos falando sobre nossas vidas. Falei sobre casamento e divórcio, Tony começando a escola fundamental, minha carreira como voluntário e ativista na área de saúde, meu trabalho como restaurador.
Mas nem precisei me estender a respeito de minha carreira. Só dois de nós tinham empregos para os quais poderiam voltar. Puccini era o único cara de gravata e terno entre nós. Freqüentou cursos em Maryland à noite, e depois foi demitido de sua firma de contabilidade. Continuava casado também. Observei que sua mulher não sabia da natureza da pesquisa a que ele estava sendo submetido. O Sr. Lee tinha uma pensão governamental, pois era viúvo. Guterman tinha uma história mas esqueci qual era. Henderson estava nessa para sair da rotina: desde que largou o serviço, ele foi de tudo, desde segurança até atendente num cinema em Washington.
“Eu não sei nada sobre cinema”, ele riu. “Então ouvi o anúncio de Hopkins na rádio. Dinheiro fácil por um par de semanas. Então estou aqui. E sou um expert em gonorréia.”
“Use o termo certo”, o sr. Lee apunhalou o ar com o dedo, sorrindo. “Neiserria Gonorrea”.
“Bem, se nós vamos estar engaiolados por duas semanas,” Puccini disse, “gostaria de escolher os filmes que nós vamos ver, garantir vagas para o boliche, tudo isso. Aí então não ficaremos divergindo depois. Talvez nós façamos uma comissão.”
“Cristo”, sr. Lee disse, tremendo como se tivesse mal de Parkinsons.
Alguém gemeu.
“Pôxa, mas nós somos uma comissão”, eu disse. “Nós somos dez pessoas indo para lugar algum. Podemos votar decisões o dia inteiro. Você quer pedir alguma coisa?”
“O primeiro de tudo”, ele disse, “é Puccini, ou Bob”. “Segundo, sim eu quero pedir alguma coisa. Filmes. Eu não vou ficar assistindo Godzilla ou Dead Man Walking só porque não conversamos sobre as opções”.
“Doutora Gordon disse que podemos escolher os filmes.”
“Garganta Profunda”.
“É sério”, disse Puccini, abanando a cabeça.
“Estou falando sério”, eu disse.
“Okay, deixe-me pegar a caneta--”
“Mary Poppins.”
“Espera aí, okay. Garganta Profunda”. Puccini levantou o dedo para pedir novas sugestões. “Mary Poppins?” “Henderson, você disse isso? Tais brincando.”
“Não, não estou. Adoro Julie Andrews”.
“Sim”, eu disse. “Eu e meus camaradinhas aqui queremos papá-la”.
“Você é um porco, Allen”, Henderson sorriu, Henderson sorriu com escárnio. “Dr.ª Gordon não faz seu tipo?”
“Por que ela é ‘velha’ como eu?” Eu disse.
“Não, ela tem esse mesmo olhar”, Henderson disse. “Estes tristes olhos marrons”.
Puccini, que deveria estar na faixa dos trinta anos, nos salvou do baixo nível. “E um Estranho no Ninho?”
“Muito óbvio, pô”.
“Allen, eu te disse--”
Eu sorri. “Eu não quero ver um filme sobre nós. Eu quero escapar.” “Escapar! Escapar!” A palavra foi repetida como um canto, começou de repente e se desmanchou como uma onda no mar.
Mas eu não. Henderson disse que sou um porco. Ele é como meu irmão Sherman. O pequeno Sherm, perdido e acusando os lobbies cinematográficos enquanto eu queria ver Um Lobisomem Americano em Londres. Ele saía durante as cenas de sexo no chuveiro, atrapalhando todos a assistir, fazendo sair do filme após a saída dele. Que merda de puritanismo!
Puccini era um babaca. Andava falando sobre o novo trabalho que ia pegar. Como se alguém ligasse para o que ele fizesse. Ele enchia a cabeça de Henderson de minhocas. Os dois rindo juntos me pareciam duas crianças. Então alguém gritou no corredor que Inski se fora. Alguém o achou caído no banheiro durante a noite.
Na noite seguinte, acordei suando. Eu não me lembrava onde estava. Na escuridão, a sala lembrava um cenário de pesadelo. Eu sentia uma dor, uma lenta dor subindo da minha genitália. Tudo ali embaixo da cintura doía como se ali estivessem agulhas e alfinetes. Eu fiquei acordado por muito, mas muito tempo mesmo, incapaz de me mover por medo de sentir mais dor ainda.
Manhã seguinte eu chamei a Dr.ª Gordon antes que ela chegasse ao escritório.
“Ansiedade noturna”. Ela riu! Então se recompôs. “Se fosse gonorréia, só ia doer quando você fosse mijar”.
Quando eu voltei para o dormitório, Puccini estava vindo pelo corredor.
“Agora é o Henderson”, ele disse.
“O que é que tem ele?”
“Eu estava na ginástica, e Henderson chegou. Então eu vi que ele estava com os olhos marejados. Perguntei se tudo estava bem e ele respondeu: “Estou certo que peguei. Doeu como se eu fosse Jesus na cruz quando eu mijei esta manhã.”
Senti minha pele se irritar. De repente, diferente das vezes anteriores, isto não se parecia com férias pagas e passava a ser uma aflição para toda a vida.
Puccini estava petrificado também. Charlie disse: “isso queima como o inferno. Meu pau ardia e eu tive de me encostar na pia para não cair. Jesus.”
Aquele dia Dr.ª Gordon deu a Henderson uma injeção para neutralizar o vírus – alguém disse que era um coquetel de antibióticos – e o mandou para casa. Foi o bastante para ele.
Aquela noite no boliche as coisas foram diferentes. “Então é assim que vai ser, hein?” O Sr. Lee disse, na hora de jogar. “Eles vão nos derrubando um a um?”
Perplexidade geral. Espanto em todo o boliche.
“Não acredito que a dr.ª Gordon faria isso conosco”, Puccini disse, tentando amenizar o impacto das palavras do sr. Lee sobre nós, aliás, bem mais arrasador do que o de sua bola sobre os pinos. “Ela parece ser gente boa”.
“Vou te falar,” comecei. “Em cada estudo, eles nos enrolam com papos sobre como estamos dando nossa contribuição para a ciência, e patati patatá. Então dividem e conquistam, como seus patrões capitalistas da indústria farmacêutica. Não deixe essas roupinhas brancas te enganarem.” Era o meu usual veneno, mas então eu o vi sair fresco de minha boca, e me choquei com minhas próprias palavras.
Ao sentar em sua cadeira, o cara mais velho disse: “Eu estive em cinco estudos, e eles nunca mandaram ninguém para casa tão ruim.”
“Merda”.
“Precisamos de um plano.” Puccini reuniu seus dedos, colocando seus polegares no joelho.
“Certo”.
“Quem será o próximo?”
Puccini desembuchou: “Acho que sou eu. Estava esperando por Henderson para ir.”
Eu tinha treze anos e Sherman tinha onze, e nós fomos mandados para o mesmo campo no estado de New York, e eu quase o matei. Isto foi o que ele sempre falou, de qualquer jeito. Não me lembro desta parte. O que eu lembro é que andávamos na cafeteria aquela noite, enquanto explodiam na praia fogos de artifício e foguetes. Eu disse para Sherman, “você sabe porque eles fazem todas essas explosões, não sabe? Eles querem fazer aquilo.”
“Aquilo o quê?”
“Fazer sexo, sacou?”
Ele não disse nada. Eu disse, “imagine se o seu pau pudesse fazer isso. Brilhar desse jeito. Muito legal, hein?”
Afinal pensei que seria bacana se eu pudesse flutuar deste jeito no ar, mandar mensagens de luz na escuridão. Como eu gostaria.
Ele dizia que eu tinha uma tinta amarelo néon e estas coisas todas, mas penso que fiquei surpreso como todo mundo quando os meninos passaram a tinta em sua pele, e ele se queimou ao tentar tirá-la, e teve de ir para o hospital.
“Allen, qual o problema? Isto é pesquisa, você já esteve nessa antes. Ninguém está em perigo”.
Dr. ª Gordon soou rigorosa, dura.
“Certo, isto não é nada”, eu disse. “No fim do dia você vai para casa em Felles Point com sua menininha.” Meu braço se estendeu sobre sua mesa. “E qualquer coisa está bem. Mas Henderson foi para casa com uma doença venérea, um punhado de antibióticos e sem emprego.”
“Você queria que eu desse emprego a ele, Allen?”
“Meu ponto é – a coisa não está bem explicada. Não somos parceiros.”
“Estamos te tratando o melhor possível. E você assinou um acordo.”
Eu estava só, sem ser apoiado por Puccini e os outros. Então eu teria que recuar antes ou depois.
“Então o que é que podemos esperar?”
Dr. ª Gordon olhou para mim, sua boca quase aberta, seus olhos levemente abertos com uma questão exasperada.
“Se você desenvolver sintomas, pode esperar o melhor tratamento que o Johns Hopkins pode oferecer. O que inclui antibióticos que são muito mais poderosos que a penicilina. Se você não tem sintomas, vai voltar para casa com seu honorário e sem efeitos colaterais. Como você esperava no começo. Agora, a não ser que haja outras questões...”
“Eu tenho uma pergunta sobre filmes’, Puccini disse.
Eu nem escutei o resto, pois saí da sala.
“Não acredito que você esteja tão aborrecido a respeito do Henderson.” Puccini disse depois na ginástica, para onde me dirigi. “Eu não pensei que você dois tivessem trocado mais de cinco palavras.”
“Talvez, não.” Eu disse. “Talvez só tenha me lembrado alguém.”
Eu estava com a cabeça numa outra coisa. Pensava em Sherman, bostinha, estúpido, ainda posso vê-lo com onze anos, perto do lago, olhando os fogos de artifício e foguetes.
O filme aquela noite era os Dozes Condenados. Eu o tinha visto na TV de madrugada muitas vezes, mas os outros pareciam fisgados. Não pensava que queria vê-lo, então dei uma volta.
Era uma cinzenta manhã de primavera em que até os girassóis pareciam amargos. Qualquer passo que a gente dava molhava o pé na água. Terminei no corredor em frente à recepção. Não seria difícil entrar, e pegar a ficha de Henderson, especialmente a parte que eu estava procurando.
“O endereço de Glen Burnie!” Eu pensei comigo mesmo.
Decidi ver o filme afinal. Lee Marvin deveria estar numa boa, mas eu preferia Telly Savalas.
“Com mil demônios, o cara é totalmente pirado”, Puccini interagia com o filme. Telly saía atirando em todo mundo.
“Dê-me um desses”, disse que o sr. Lee, imaginando ter o revólver automático de Telly.
E então surgiu Jim Brown, fazendo o seu melhor e tomando tiros. Os créditos começaram a passar. Eu disse: “vamos”.
“Para onde?” Puccini respondeu.
“Para fora. Tenho um carro. Nós podíamos visitar Henderson.”
Aquilo levantou um pouco o pessoal, até então pareciam todos mortos. “Nós não sabemos onde ele mora.” Alguém disse.
“Sim, nós sabemos.”
Nós paramos no estacionamento, com a luz azul das lâmpadas de enxofre brilhando sobre nós. Ah, Telly Savalas.
“Allen, isto aqui é um monstro, parece um bote!” Podia se ver que o china estava impressionado com meu automóvel.
“Bom, era casado e....”
“Você e o general Patton lutaram juntos contra Hitler?
“Então, onde estamos indo?” Guterman comentou, preocupado.
“Glen Burnie”.
“Ei, não devemos dizer à Dr.ª Gordon?” Atalhou Puccini.
“Ela nos fez poucas recomendações”, contornei.
Guterman hesitou. “Será que tem alguma cláusula falando de nossas possíveis saídas?” Incomodado pela garganta, mesmo assim continuou . “E se nós não ganharmos nosso dinheiro devido a isso?”
“Guterman”, Puccini disse.
“Só porque não checamos o contrato? Deveríamos”
“Entre no carro.”
Então nós fomos.
Nós andamos um tempo em silêncio, olhando para a massa compacta de árvores próximas da estrada. Mas depois pegamos o espírito da coisa, pensando em maneiras de surpreender Henderson. Em Glen Burnie nos perdemos. Todos os quarteirões escuros pareciam o mesmo. Finalmente nós o achamos e paramos perto do bangalô que tinha o número certo.
“Então devemos decidir o que vamos fazer”, ponderou o sr. Lee.”
Não tinha passado pela cabeça de ninguém.
“Ele tem uma mulher lá, eu sei”, Puccini murmurou.
Então alguém disse, “nós o amarraremos com uma corda e lavaremos suas partes íntimas”. Deve ter sido Guterman.
“Eu não concordo”, a voz da experiência suspirou.
“Atiraremos pedrinhas em sua janela e o colocaremos para fora.” Puccini disse.
Nós todos então ficamos, por um momento, olhando para a luz na sala. As cortinas eram brancas, e a luz era uma lâmpada que deixava um anel branco no teto.
“E o quê diremos”, indagou a si mesmo o sr. Lee.
“Pelo amor de Deus, nós vamos dizer algo no estilo ‘como vai você’ .”
“Certo, certo”.
Abri minha porta e corri para o outro lado da casa. Imaginei Henderson dentro, os portões abertos, e ele estaria na cozinha fazendo um molho de espaguete. Por que eu podia escutar a faca batendo na madeira. Disciplinadamente, sistematicamente cortando. Ajoelhei-me e atirei uma pedra na janela da cozinha. Alguém parou de picar.
Eu vi então uma sombra se mover no retângulo iluminado na grama. Por um momento imaginei que era Sherman, imaginei a sombra do meu irmão na grama molhada.
Então ouvi uma voz na frente.
“Ei, ei, tem alguém em casa?” Era a voz de Puccini.
“Pôxa, que inferno.”
“Eu disse alguém em casa?”
A luz se acendeu e ouvi uma porta ranger.
“Puccini, que diabo?” A voz de Henderson soava alterada.
“O que você teve?” Puccini disse.
“Mas o que você está fazendo aqui.”
“Allen queria tirar as teias de aranhas de seu velho tanque, quer dizer, carro.”
Por agora eu estava na esquina. A rua inteira podia ver Puccini agitar seus braços.
“Vocês também ficaram infectados?” Henderson parecia confuso.
Entrei na casa e acendi a lâmpada. “De jeito nenhum”, eu disse. “Nós não estamos aqui porque a Dr.ª nos disse para ir onde o sol não brilhasse. É nós te encontramos”.
Uma pedrinha bateu na lâmpada e fez barulho.
“Que diabo—“
“Você tem uma mulher aí dentro?” Exclamei. “Jesus, ela não está com medo que você vá”
“Você é o mesmo no mundo aqui fora, né Allen?” Henderson me interrompeu impaciente. “Eu pensava que você era um escroto lá na pesquisa porque você precisava, mas não.”
“Não há como falar sobre esse tipo de doença”, eu disse, dando um passo.
“Mas que inferno. Todos vocês saíram fora?” Henderson arregalava os olhos se esforçando para enxergar no escuro. Dentro da janela vi um movimento na casa. Longo cabelo loiro. Uma pedra soou na parte de madeira.
“Continue jogando pedras!” Henderson gritou irritado.
“E aí, Henderson, quem já chegou aí?”
“Ohh”, provoquei eu, “então isso quer dizer que você não tem nenhuma mulher lá por nossa causa?”
“Vocês garotos devem voltar para o parque de diversões”, Henderson falou bem alto para que todos escutássemos.
“Você está nos mandando embora antes de nos deixar entrar?” Essa foi do Puccini.
“Vocês vêem aqui jogar pedras! Podem voltar para trás.”
“Mas Charlie, estamos contaminados”. O sr. Lee ficou de pé perto da lâmpada, agora com as mãos vazias.
Henderson se virou para ir embora. “Então fica assim”, resmungou ele.
“Ei, eu peço desculpas”, eu disse.
A porta bateu.
“Desculpe!”
Na janela da sala pudemos vê-lo voltar para a cozinha. Todas as portas vibravam uns cinco segundos após sua passagem.
Eu olhei para Puccini e ele: “Que inferno, que diabo”.
“Vamos chamá-lo de novo”, insisti, “não vamos deixar a coisa ficar assim”.
“Esquece”, interveio Puccini. “Vamos embora”.
“Desse jeito?”
“Tem alguém aí com ele”.
“Jesus, que inferno!”
As portas do carro fechando foram como quatro tiros prolongados. Todos ficamos diante da casa, constrangidos. Não girei a chave, fiquei congelado lá também. A luz na janela de Henderson simplesmente existia.
“Vamos para onde, agora?”
Silêncio.
Guterman falou arranhando a garganta. “Você pensa que vão nos deixar entrar?”
Eu podia ver Dr.ª Gordon parecendo ainda mais dona da razão. Gemi.
“Por que não?” Puccini disse. “Nós estamos infectados como sempre. Alguns de nós.”
Nós ficamos lá por mais um minuto, se tanto.
“Okay”, falei, quebrando o gelo. “Mas eu espero que seja a última vez.” Eu girei a chave. Quando eu estava de novo na estrada do parque, sr. Lee começou a cantar com uma voz de cantor de cabaré: “Oh, estou feliz que não sou respirador de placebo. Não preciso de pílulas de açúcar. Sim, estou feliz que não sou um respirador, serei sempre um ser infecto!”
“O que é que temos aqui?” Comentou em voz alta o sr. Lee, enquanto liguei a seta. “A canção dos perdedores?”, indagou. “Não, não se trata disso”, repliquei. Para as pessoas que já trintaram e nunca mais contaram, a gente precisa amenizar algumas coisas.
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