Contou Maria do Carmo, que já morreu, que a tragédia ocorreu no município de Catolé do Rocha, Nordeste brasileiro, e teve muito choro, muita morte e pouca vela, por que o armazém pegou fogo, e da igreja não sobrou muita vela para pegar, e os prédios eram vizinhos.
Tudo começou quando Maria de Almeida, que foi a terceira a morrer, mãe do Jonias, mandou o filho, preguiçoso e malcriado, comprar alguma coisa na venda do seu Platão.
O moleque teria dito o nome do homem de forma enrolada, soando como palavrão, ao que Platão respondeu de forma agressiva, atirando um pedaço de pau na cabeça do boca suja.
Jonias, contou ao pai,Jorge, que para honrar o filho, correu para o armazém, e com pontaria de herói furou o coração de Platão.
O soldado Sócrates, chamado para atender a ocorrência, ficou meio louco e atirou na direção de Jorge, mas errou, matando a sogra do homem, dona Joana, que não tinha nada a ver com a encrenca.
Jorge até que gostou, mas sua esposa, Maria de Almeida, foi vingar a mãe e levou bala na perna. Jorge teve que honrar a mulher também, e rasgou o bucho do Sócrates, que era irmão do Platão.
O delegado Aristóteles, que era irmão do Sócrates, portanto também irmão do Platão, perdeu a cabeça vendo o banho de sangue e atirou nas costas do Jorge, que tombou sobre a calçada de pedra.
Nem deu tempo de pensar o povo e o soldado Joacir, que era irmão do Jorge, meteu chumbo no delegado Aristóteles, que esticou a canela no meio da rua, já meio entupida de defunto.
Para completar a tragédia o padre Édipo, que vinha de um enterro recente, deparou com a cena macabra e perdeu o juízo, atropelando com o jipe da paróquia o Joacir e o moleque Jonias, que gritava ao lado do tio pela desgraça da família.
O povo ficou revoltado e correu atrás do padre, que era irmão do delegado, do policial morto e do comerciante, e tentou se esconder na igreja. Em vão. Foi cozido no meio das chamas. Que também consumiram o armazém e a delegacia. Era tudo grudadinho.
Alguém lembrou que era preciso vela para as almas não penarem, e Maria do Carmo, que era prima da Maria de Almeida, correu na igreja para salvar algumas, no meio da fogueira bonita, bem alta inclusive. Pegou mas se queimou, e contou a história para um jornalista um pouquinho antes de morrer, com a pele toda estourada, uns quinze dias depois.
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