Eu sabia que aquele negócio não ia prestar. Avisei ao vivente. A guria tava quieta na calçada, olhando prá lua, tentando descobrir se o céu tinha tantas estrelas quanto sua face tinha cravos e espinhas. Coitada. Tinha um nome que chamava o problema. Aquininha.
Mas o teimoso foi lá, tirar um sarrinho besta, do tipo desnecessário.
A guria era feia, no conceito do Galileu Galilei, mas sabia lutar caratê, e o Vital apanhou no meio da rua, na frente de todos os amigos.
Foi uma surra das boas, daquelas que o indivíduo conta prá todo mundo como se fosse um troféu. Deu hospital pro sem-vergonha. Escoriações generalizadas e um braço quebrado.
Apanhou, foi vaiado e ainda teve que ser atendido em hospital do governo, só prá aprender a deixar de ser bobo.
Mas Aquininha era boa moça, embora sua face fosse um tanto quanto judiada. Coisas de intestino diziam os mais velhos, sem convicção. Foi visitar o boboca no hospital. Ainda pediu desculpas pela agressão; jurou que nunca mais faria aquilo.
Nem precisava. A turma do futebol ficou santa, e as meninas maldosas viram o efeito da luta marcial no lombo do Vital. Apanhou feito gente grande.
O engraçadinho depois da surra pegou uma infecção hospitalar, e por pouco não morreu.
Aquininha, com seu coração de ouro, foi uma gigante no atendimento ao convalescente, que nem era lembrado pelos amigos.
Houve consenso que Vital teve o que mereceu. Amigos, amigos, burrices à parte.
Vital ficou bom, depois de sessenta dias. E grudou na Aquininha. A surra despertou um sentimento nobre no bagual.
Sem intenção de ofender, passou a pesquisar tudo sobre o problema da guria; estudou muito e se tornou dermatologista. O melhor do Rio Grande.
Curou a guria, ganhou muita humildade e esta lá, ajudando milhares de jovens a superar os traumas de infància.
Claro que casou com ela, que foi campeã brasileira de caratê umas duas ou três vezes.
O que não prestou mesmo foi a surra que o infeliz levou no início da história. Mas nem tudo que começa mal tem final triste. A guria tá mais bonita que a mulher do Juvenal. O conflito com o Vital foi decisivo para um final feliz.
