A campanha política corria solta na região. Arregimentados por empresários, muitos dos jornalistas foram deslocados para as caravanas, a fim de narrar os sucessos dos candidatos.
Alguns ficaram de fora dos grandes esquemas, e outros continuaram a rotina das redações, organizando as matérias que chegavam através de releases mal elaborados, com textos contraditórios.
Entre eles estava Dagoberto Traznovas, um dos jornalistas famosos por seus posicionamentos em prol dos governantes de plantão.
Todo texto de assessores que chegava ao seu poder ganhava nova roupagem. Se o assessor dizia que o candidato foi aplaudido, Dagoberto escrevia que foi ovacionado por milhares de eleitores, nem que fosse reunião de paróquia na zona rural. O candidato geralmente ligava para Dagoberto, mandava um quilo de peixe, uma garrafa de tubaína, e quando eleito, uma assinatura de revista Contigo estava garantida.
Dagoberto ganhou fama, insuperável na arte de agradar, e foi assim até o dia em que resolveu tomar uma atitude drástica, parando de elogiar os políticos.
Logo sentiu a falta das bananas e das tubaínas, mas queria se igualar aos demais colegas, que realizavam trabalhos diferentes, buscando a informação sem os exageros bajulatórios.
Na tentativa foi aprendendo nova linguagem, mas sentia falta dos telefonemas de agradecimento, dos sussurros maledicentes dos colegas, da zombaria implícita dos olhares próximos.
Mas, perseverando para se tornar um profissional de respeito, realizou algumas reportagens importantes e começou a tomar gosto pela coisa.
Convencidos pela mudança aparente de Dagoberto, convidaram-no para participar de um debate de candidatos ao governo estadual ,ao vivo pela televisão. Traznovas aceitou prontamente.
Na hora de perguntar, Dagoberto olhou para os candidatos, sabendo da responsabilidade que lhe cabia, pensou nos milhares de telespectadores. Sem titubear, fez cara de mau e lascou: " Digníssimos candidatos, me respondam sem rodeios e pela ordem para que time os senhores torcem." E nada mais precisou perguntar. |