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Artigos-->Minhas ainidades com a poesia - conhecer, produzir, divulgar -- 23/06/2023 - 11:31 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Minhas afinidades com a poesia

Conhecer, Produzir e Divulgar[i]

 

L. C. Vinholes

Revisão 2012

Difícil é lembrar como comecei - ou como não devia ter começado -, a interessar-me por poesia. Meus primeiros trabalhos datam de 1947, quando tinha 14 anos de idade e, pelos textos que se conservaram, dá para ver o romantismo no qual já estava mergulhado e no qual voltei a afogar-me nessas últimas décadas, talvez como forma de compensar o racionalismo que alimenta meu pensamento. Daquela mesma época são meus primeiros estudos de música à qual me dediquei com enorme afinco, buscando consolidar carreira como compositor.

Recordo que, no início, me interessavam as poesias publicadas nos jornais Opinião Pública e Diário Popular de autores conterrâneos e de outras plagas e que, algumas delas, atraíam-me a tal ponto que as decorava e as repetia com enorme prazer. Lembro-me das seis quadras intituladas Olhos Verdes (1950), assinadas por Lygia Simões Lopes da Silva. Na Biblioteca Pública de Pelotas, lia com avidez antologias com obras de Castro Alves, Gonçalves Dias, Cruz e Souza e outros clássicos, bem como vasculhava a coleção de jornais do final do século XIX e do início do XX.

Sem contar os portugueses, os primeiros poetas estrangeiros que conheci foram os de língua espanhola (Santa Tereza de Jesus) e inglesa (Lord Byron), lidos e discutidos nas aulas do Colégio Gonzaga pelo saudoso amigo e mestre lassalista Ignácio Fernandes Gonzalez, o irmão Gabino Gerardo. As letras das músicas populares brasileiras, das regionais, dos tangos e dos boleros dos anos 1940 foram, também, objeto da minha curiosidade.

Meus primeiros trabalhos publicados foram Meu Brasil e Minha Terra, em junho e agosto de 1952, na Revista do Ensino[ii] da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul. Naquele ano, participei das reuniões do Grupo Teatro de Ensaio de Pelotas integrado pelos amigos Luiz Carlos Correa da Silva, Carlos Alberto Vieira Motta, João Carlos Tavares e Hélio da Silva, todos com destaque nos palcos brasileiros. Em um dos saraus do Grupo, onde a poesia era ponto forte, João Carlos, que terminou seus dias em teatros de São Paulo, foi responsável pela primeira declamação pública de uma obra minha, Juventude, em 20 de setembro daquele ano, trabalho recém-publicado pelo Diário Popular. Como colaborador deste jornal e da Opinião Pública nos onze meses que antecederam minha mudança para São Paulo (março/1952 a janeiro/1953) publiquei vinte e uma de minhas poesias.

Durante os cinco anos que freqüentei a Escola Livre de Música da Pró Arte, em São Paulo, tive oportunidade de conhecer os poetas Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari que, mais tarde, formariam o grupo Noigandres de poesia concreta; o intelectual pernambucano Pedro Xisto Pereira de Carvalho, poeta que muito fez pelo movimento da poesia concreta no Brasil; Dora Ferreira da Silva, Theon Spanudis e tantos outros que aguçaram meu interesse por uma nova poesia.  Solidifiquei amizade com o pintor Samson Flexor, líder do movimento da arte abstrata nos anos de 1950, ponte de minha relação fraterna com o artista plástico Kenzo Tanaka parceiro na criação da Sociedade Internacional de Artes Plásticas e Áudio-Visuais (ISPAA-1962) em Osaka, promotora de exposições, incluindo poesia brasileira, no Japão e Coréia.

Por ocasião do IV Curso Internacional de Férias da Pró-Arte, em Teresópolis (1954), onde, ao lado da música, os participantes familiarizavam-se com outras áreas da cultura, atendendo à uma orientação multidisciplinar, os poetas e pintores concretistas paulistas - destaque-se Valdemar Cordeiro e Luís Sacilloto -, foram convidados a proferir palestras, tendo ainda a presença de Guyla Kosice[iii], poeta e artista plástico argentino líder do Movimento Madi, de Buenos Aires, ao qual, visando conhecer melhor as obras dos seus membros, passei a pertencer por alguns anos.

Antes e depois da Exposição da Poesia Concreta Brasileira que organizei e montei no Museu de Arte Moderna de Tokyo (abril/1960), com a colaboração do arquiteto João Rodolfo Stroeter, mantive intenso contato com dezenas de poetas japoneses pertencentes aos grupos VOU, Pan Poesié e ASA - órgão da Associação para Estudos da Arte -, liderados pelo teórico da “ideoplastia” Katsue Kitasono (1902-1978), Shuzo Iwamoto (1908-1975) - autor da letra do hino que compus para a Escola Primária Ohtani de Suzu, Província de Ishikawa -, e Seiichi Niikuni (1925-1977); do grupo Almée, que reunia os poetas da região de Fukuoka e do norte da ilha meridional de Kyushu; poetas das cidades de Kanazawa (Keizuke Jimbo) e Niigata (Tatsuya Tamura, Yosiaki Toyosaki e Takao Kurata), todos eles interessados em conhecer as novas ideias da poesia brasileira dos anos 1950.

A mostra de Tokyo mereceu telegrama da Agência France Press (20/04/1960) distribuído para jornais da América do Sul, comentário na primeira página do jornal Asahi Shinbun (1960), ilustrado com meu poema “tempo/pó” e motivo de notícias publicadas nos jornais de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Pelotas. A repercussão da citada exposição, que teve decisivo apoio do diretor do museu Atsuo Mayusumi - ex-comissário do Japão na Bienal de São Paulo -, causou interesse também às revistas especializadas de Tokyo que, graças à intermediação do poeta e designer Shukuro Habara, publicaram a antologia de poesia concreta brasileira, com layout do arquiteto carioca Alex Nicolaeff e introdução do poeta e tradutor da obra de e. e. cummings Yasuo Fujitomi, onde figuraram meus poemas “caminho ...”, “es ...”  e “ de . a . ...”, ao lado de poemas de Alcides Pinto, Augusto de Campos, Clarival do Prado Valladares, Décio Pignatari, Dora Ferreira da Silva, Edgar Braga, Eusélio Oliveira, Haroldo de Campos, José Lino Grünewald, Maria José de Carvalho, Mario da Silva Brito, Pedro Xisto, Roberto Thomas Arruda e Ronaldo Azeredo (Desing nº 27/1961).

O artigo com reprodução de poemas, documentos e textos relativos ao movimento concretista brasileiro, inclusive reprodução da capa da revista Noigandres nºs 1 e 2, e informações cronológicas  por mim compiladas (Graphic Desing nº 18/1965); e a versão japonesa do artigo Nova Linguagem-Nova Poesia, de Luiz Ângelo Pinto e Décio Pignatari, transcrito do jornal O Estado de São Paulo (1954), da revista Granta (Cambridge/1964) e da revista Invenção (1965), com poemas semióticos dos autores (Design nº 73/1965). Foto panorâmica da mostra com nota assinado por Augusto de Campos foi publicada na página Invenção do jornal Correio Paulistano (junho/1960) e no Diário Popular, de Pelotas (julho/1960).

Outras exposições de poesia foram organizadas em Kanazawa (1962) e Niigata (março/1963), patrocinadas pelos grupos de vanguarda DA e HI e com o apoio dos poetas Yoshiaki Toyozaki e Tatsuya Kurata; na Biblioteca da Universidade de Tenri (1965) incluindo palestra de Kenzo Tanaka sobre A Modernidade de Brasília; na Galeria do Jornal Mainichi e na Galeria Nunu de Arte Contemporânea, ambas em Osaka (1963, julho/1965). Esta última mostra foi depois montada no Museu de Arte Homma de Sakata (agosto/1965), com apoio da ISPAA.

Visando dar mais subsídios ao bom entendimento pelo público japonês da evolução da poesia brasileira da segunda metade do século XX, publiquei na revista ASA nº 2 (1963) artigo sobre o tema Manuel Bandeira + Cassiano Ricardo + Poesia Concreta (1962), ilustrado com os poemas concretos “rosa tumultuada” e “gagarin”, experiências desses dois autores.

 Ampliando os horizontes da poesia de vanguarda para atender ao público japonês, organizei a Exposição Internacional de Poesia Concreta (1964), com a participação do Instituto Goethe de Tokyo, no Salão do Sogetsu Kaikan - sede da instituição de vanguarda da moderna escola de ikebana homônima -, não só mostrando a produção alemã, brasileira, francesa, japonesa e suíça, mas, também, o papel de liderança que o Brasil desempenhava influenciando poetas de outros países.

Em mesa redonda paralela à mostra, foram lidos os originais e as respectivas traduções para o japonês e português do poema-livro Servidão de Passagem (1961), de Haroldo de Campos, feita em parceria com Niikuni, e da antologia Kemuri no Chokusen (Reta da Fumaça/1959) de Kitasono, que traduzi (1964) e, graças à intermediação do poeta e professor Boris Schneidermann, foi publicada, no original e em português, pela revista Através (janeiro/1983), da Editora Martins Fontes, de São Paulo. Uma edição bilíngüe mimeografada das duas obras foi distribuída ao público que compareceu à mostra. Para concretizar esses eventos contei sempre com a colaboração à distância de Haroldo de Campos, representando o trio paulista, com o qual trocava correspondência e recebia farto material, bem como de Pedro Xisto, Edgar Braga, Mario da Silva Brito, José Lino Grünewald, Wladimir Dias Pino e Ronaldo Azeredo.

Meses antes de concretizar o plano para realização da exposição no Sogetsu Kaikan, fui ao templo Mie, no cimo do monte Hiei às margens do lago Biwa, província de Shiga, e visitei a urna funerária de Ernest Francisco Fenellosa que, na segunda metade do século XIX, se fixou no Japão e colaborou na modernização do país. Uma das fotos dessa visita foi publicada pelo Suplemento Literário do jornal O Estado de São Paulo (julho/1964) com minhas traduções de Poema/Vento, de Fukiko Kobayashi, Ninfa da Chuva, de Akito Osu e traduções de Haroldo de Campos de Sinal de Beira-mar e Poème, respectivamente, de Reiko Horiuchi e Kitasono.

Para atender aos interesses dos poetas japoneses, busquei outras fontes de informação e troquei correspondência com os cearenses liderados por Antonio Girão Barroso, Eusébio Oliveira, Alcides Pinto e João Adolfo Abreu Moura; com o Grupo Tendência de Minas Gerais, liderado por Affonso Ávila e Affonso Romano de Sant´Anna, que acolheram meus próprios poemas e versões em português de trabalhos de Kitasono, Osu e Kobayashi na exposição da Semana Nacional de Poesia de Vanguarda (agosto/1963), em Belo Horizonte.

Em dezembro de 1961, na Reunião do Grupo Shinjinryugaku (Nova antropologia), liderado pelo poeta Tatsushi Okunari, no auditório do Hibiya Mitsui Hall, em Tokyo, mostrei aos japoneses a possibilidade de leitura coletiva de determinados textos concretos, tendo preparado “partituras” específicas para os poemas “vento/folha” de Pedro Xisto e “rua/sol” de Ronaldo Azeredo, utilizadas pelos quatro setores em que dividi o público. Esta novidade foi motivo de extenso comentário do poeta Fukao Sugai na Revista Josai nº 11 (março/1962).

Continuando a movimentar o favorável ambiente de relacionamento com os poetas japoneses, apresentei Niikuni ao poeta francês Pierre Garnier, editor da revista Les Lettres, contato esse que resultou na produção, “a quatro mãos” e bilíngüe, de poemas que amalgamavam ideias e conceitos estéticos e gráficos desses dois poetas, publicados em Tokyo e Paris. Aceitando os parâmetros sugeridos por Pierre Garnier e sedimentando contatos com o grupo de poetas franceses, Niikuni, Kitasono, Fujitomi, Toshihiko Shimizu e eu decidimos assinar, juntamente com poetas da Alemanha, Inglaterra, Bélgica, Finlândia, França, Holanda, Suíça e Tchecoslováquia, o plano-piloto do Manifesto Internacional do Espacialismo divulgado em Paris (agosto/1963), “frente única para a poesia experimental”.

Além dos poemas da antologia Zero On (1963) de Niikuni, que teve o Um Lago publicado na revista Comoran y Delfin (1966), de Montevidéu, traduzi, ainda, os poemas Corredor, de Toyokiyo Uchida do Grupo de Kobe, e Quadrado Branco, de Kitasono, publicados no Suplemento Literário do jornal O Estado de São Paulo (1974) e na Revista da Academia Brasiliense de Letras (2000), de Brasília.

Para divulgar aos poetas não-japoneses a presença da poesia concreta brasileira no Japão troquei correspondência também com Mary Ellen Solt (EUA), Mirella Bentivoglio (Itália), Amanda Berenguer (Uruguai), Julian Blaine (França), Ian Hamilton Finlay e Mike Waver (Inglaterra).

Verificando que era patente o interesse dos poetas japoneses pela nova poesia brasileira, por duas vezes colaborei na tradução do Plano Piloto da Poesia Concreta dos Noigandres, primeiro por Kitasono e depois por Niikuni, publicadas nas revistas VOU nº 25 (1964) e ASA nº 3 (1968).

Em 1967, trabalhos dos poetas Niikuni, Fujitomi, Shimizu e meus, como representantes da ASA, e obras de pintores e escultores da ISPAA foram exibidas na galeria da super-loja Sinseke de Seoul, Coréia do Sul, com patrocínio do jornal Joong Ang Ilbo e da Rádio Dong Yang.

Quando morei no Paraguai (1969-1974) fui contemporâneo, por algum tempo, do poeta João Cabral de Melo Neto com quem tive o privilégio de diálogo em torno da produção literária e poética brasileira, além de compartilhar minha experiência com os poetas japoneses na primeira permanência em Tokyo (1957-1968). Em Assunção não encontrei ambiente propício à divulgação da poesia mais ousada e condições alheias aos meus interesses não permitiram familiarizar-me com a produção literária paraguaia da época, embora tenha conhecido Mário Halley Mora, Dora Gómez Bueno de Acuña e Josefina Plá.

 Quando o grupo ASA comemorou dez anos de atividades (1974), seus participantes eram Niikuni, Fujitomi. Shimizu, eu - membros fundadores remanescentes -, Kamimura Hiro, Mukai Shutaro e Kagiya Yukinobu. Nesse período, passaram pelo grupo Iwata Kyoshi, Ishii Yutaka, Seki Seinichi, Kajino Hideo, Sunada Chima, Yoshizawa Shoji, Tanabe Hiroshi e Yamanaka Ryojiro.

No IX Colóquio de Estudos Luso-Brasileiro realizado na Universidade Nanzan, em Nagoya (1975), patrocinado pela Associação Japonesa de Estudos Luso-Brasileiros, valendo-me de minha condição de membro honorário, apresentei a dissertação Intercâmbio, Presença e Influência da Poesia Concreta Brasileira no Japão[iv], posteriormente publicada nos Anais daquele ano.

Durante anos, estudei o haicai japonês (pleonasmo), as traduções destes para o inglês e o francês e aqueles escritos em outras línguas. Quanto a esses concluí que, embora a maioria fossem trabalhos de exemplar beleza e de indiscutível valor, nada tinham da originalidade do haicai. Minha vivência no Japão e meus conhecimentos da língua não me permitiam tentar escrever em português aquilo que, com o passar do tempo, acreditei ser possível apenas em japonês. Esta minha posição não deve ser confundida com a aceitação ou não valorização daqueles “haicais” que os não japoneses escreveram em seus idiomas. Pelo contrário, apreciei trabalhos de vários autores e, prova disto, é que iniciei os lançamentos da Editora Shin Nippaku, por mim criada no Japão, para divulgar a cultura e as artes brasileiras, com o a publicação 8 Haikais de Pedro Xisto (1960)[v], autor que dedicou a este gênero literário todo seu saber e habilidade. Dele guardo, como relíquias, originais manuscritas de seus “haicais” mais conhecidos e belos.[vi]

Como sempre fui interessado em formas econômicas, minimalistas, encontrei nos nomes femininos japoneses o arcabouço formal de estrutura poética pequena. Os primeiros resultados dessa experiência foram divulgados em modesta publicação intitulada A GUI(n)SA de Despedida, com doze páginas e oito mini-poemas, quando deixei o Japão pela segunda vez (agosto/1977) rumo a Ottawa. Ginza é o bairro central de Tóquio. Em duas ocasiões, meus mini-poemas e outros trabalhos foram publicados na Revista da Academia Brasiliense de Letras (1992 e 2000). De 1977 em diante, continuei a produzir mini-poemas que resultaram na publicação do polievroma - amálgama alternativo das sílabas dos substantivos poema e livro -, “menina só” (1994) pela Editora Masao Ohno, com apoio da Aliança Cultural Brasil-Japão/São Paulo, obra com ilustrações de Kenzo Tanaka lançada no Salão de Atos da Prefeitura de Pelotas (dezembro/1994) e no foyer da Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional em Brasília (setembro/1996). Exemplos dos mini-poemas estão nas páginas desta antologia.

Durante meus doze anos no Canadá, voltei a montar a exposição de poesia concreta na Biblioteca Morisset e no Pavilhão Simard da Universidade de Ottawa (novembro-dezembro/1983), reservando espaço para trabalhos dos poetas japoneses e canadenses; e ainda na Biblioteca Roberts da Universidade de Toronto (janeiro/1985). Além da exibição de painéis com reprodução de poemas, publicações, recortes e fotos, foi distribuído folheto com artigo - que preparei especialmente para os dois eventos -, intitulado A Poesia Concreta Brasileira: uma Retrospectiva. Para a mostra de Ottawa, obtive apoio para que o professor Claus Clüver, do Departamento de Literatura Comparada da Universidade de Indiana (EUA), fosse convidado e abordasse o tema O Concretismo Brasileiro: Arquitetura e Anúncios, Pintura e Poesia, Música e Modelos.

Por outro lado, aproveitando a sistemática divulgação da poesia canadense pelo diário Ottawa Journal e pela revista mensal Canadian Forum, traduzi para o português poemas de Suzana Musgrave, Earle Birney, bp Nichol, Margaret Atwood, bill bissett - com este, além dos encontros, alimento profícuo intercâmbio epistolar que dura até hoje[vii] -, traduções que enviava diretamente aos autores. Das mesmas fontes, compilei e traduzi (1979) poemas de Nancy Passy que foram reunidos na antologia artesanal inédita que ela ilustrou e decidiu chamar de Bosquejos dos Quatro Ventos. O poema “suk a ...” de bisset é texto de minha peça Tempo-Espaço XIV (1978), para 10 leitores, voz e flauta.

Além do Japão e do Canadá, organizei e montei a mostra de poesia concreta, paralela ao Seminário Texto e Composição Musical, em Santiago de los Caballeros, República Dominicana, durante o X Curso Latino-Americano de Música Contemporânea (1981) do qual participei como compositor convidado.

Finalizando minhas atividades em prol da divulgação da poesia brasileira iniciadas nos anos 1950, em abril de 1999 repeti as exposições montadas no Japão e no Canadá no Salão de Eventos do Instituto Brasil-Itália - cuja criação foi o objetivo de minha permanência em Milão (1996-1999) -, procurando, dessa forma, aproximação com os poetas locais. Assim, foi possível estabelecer contatos diretos, entre outros, com Mirella Bentivoglio, Carlo Belloli, poeta e crítico (esposo da escultora brasileira Mary Vieira), Nanni Balestrini, Luigi Serravalli (Sarenco) e a professora e crítica de arte Lucilla Sacca da Universidade de Florença.

Como poeta convidado, estive no Festival da Palavra (Festival Internacional de Poesia Contemporânea) de Veneza (1997), participando da noite de inauguração com meu trabalho Arquipélago, compartilhada com Umberto Eco, com seu “Giochi  Alfabetici”; no Festival Viva Língua - Noites de Autores com Textos Originais, em Pietra Ligure (1997); e no Festival Internacional de Poesia Visiva, em Mantova (1998), dedicado à produção poética da década de 1960, tendo meus trabalhos publicados no catálogo trilíngue da mostra, juntamente com o artigo e a dissertação acima mencionados, bem como texto sobre minha obra de intervenção urbana Poema-Jardim - Poesia de Volume (1962). Em Veneza estiveram também, entre outros, Haroldo de Campos, Frederike Mayröcker, Biagio Cepollaro, Andréa Zanzotto e os venezianos Gino Pastega, Ugo Stefanutti e Jacopo Terenzio.

Arquipélago, que não faz parte dessa antologia, é um “trabalho” que dá continuidade e amplia o pretendido em Osaka (1967) no qual o público, dando títulos aos meus poemas-painel “boca” e “olho”, colaborou na criação de uma obra poética de produção coletiva. Em Milão, os títulos foram registrados na página que me foi reservada no catálogo distribuído durante o Festival e que, propositadamente, deixei em branco. O que resulta dessa experiência não tem registro gráfico unificado, ocupa espaços em lugares determinados, mas desconhecidos; cria forma que, por razões as mais diversas, se metamorfoseia à medida em que o tempo passa e as circunstâncias mudam; se dissemina por razões que nunca serão conhecidas; tende a desaparecer à medida em que as páginas do catálogo ou o próprio catálogo desaparecerem; e seu término de existência nunca será fixado nem mesmo pelos que participaram de sua criação.

Como produtor e locutor em português e japonês do programa Canta Brasil (1963) da Rádio Kanto, de Yokohama (Japão), patrocinado pela Nihon Sekyu (Companhia de Petróleo do Japão) durante seis meses, cinco vezes por semana, apresentei textos originais de poemas de autores brasileiros, entre eles Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Cecília Meireles, Augusto Frederico Schmidt, Murilo Mendes, Vinicius de Morais, Péricles Eugênio da Silva Ramos e tantos outros. As leituras eram intercaladas com música dos clássicos brasileiros ou tinham como fundo a música popular brasileira da época, especialmente as do nascente movimento "bossa nova". Programa similar, Mosaico Literário do Brasil (1982), foi ao ar pela Rádio da Universidade Carleton, de Ottawa, quando aproveitando traduções para o inglês constantes da antologia bilíngüe Poesia Brasileira Moderna (1972) de Manoel Cardoso e José Neistein, publicada pelo Brazilian-American Cultural Institute, em Washington, colaborei com o professor-produtor Lloyd Stanford. O poema Os Cavalos da Inconfidência, de Cecília Meireles, lidos por ele e por mim na versão de Cardoso e no original, tornou-se ícone do programa.

No Café Salão Fugetsu-do (Salão Vento-lunar), situado na Namiki-dori, no bairro boêmio de Shinjuku, em Tokyo, era distribuído o programa mensal Chambre de la Poèsie et Musique com  informação sobre as exposições de óleos, gravuras e fotografias, projeções de filmes de 16mm e audições de LPs. Estes programas traziam sempre um poema de um dos membros do grupos VOU, Pan Poèsie e independentes. Desde o final de dezembro de 1960, frequentei aquele local visando intensificar contatos com os poetas japoneses e produtores de outras artes. Em fevereiro de 1961 tive a surpresa de ver publicado no programa daquele mês meu poema “de . a .” (1960), o único de autor estrangeiro até então assim contemplado.

Permito-me registrar que quando foram realizadas as exposições homônimas Japanische konkrete und visuelle Poesie (1978/1979) na Kunstverein (Associação de Arte) de Gelsenkirchen (1978/1979) e em Ulm (1980), Alemanha Oriental, ambas por iniciativa do poeta Mukai Shutaro, fui o único poeta não japonês a delas participar e ter o nome constante do convite ao lado de Fujitomi, Habara, Ishii Yutaka, Ito Motoyuki, Jimbo Michio, Kajiro Hideo, Kamimura Hiro, Kitasono, Mukai, Niikuni, Nishino Hiroaki, Shimizu, Shinozaki Koichi, Sunada Chima, Takahashi Shohachiro, Tanikawa Shuntaro, Yamanaka Ryujiro e Yoshizawa Shoji. O catálogo da primeira mostra tem prefácio assinado pelo poeta Siegfried J. Schmidt e reproduz o poema niki = diário (de vigem) que criei em memória de Kitasono e Niikuni.

Embora distante do Brasil por mais de 35 anos, nas atividades que desenvolvi procurando difundir a poesia brasileira, um dos meus objetivos maiores era manter-me em contato e atualizado com respeito ao produzido pelas lideranças nessa área da literatura e, assim, enriquecer meus conhecimentos, na expectativa de ganhar experiência e aperfeiçoar minha habilidade como poeta, expor ao público interessado meus trabalhos acolhidos em publicações e periódicos diversos no Brasil e no exterior.

Finalmente, registre-se que, com relação à poesia, tive sempre como lema Conhecer, Produzir e Divulgar. Por isso, fui permanente consumidor da poesia de autores brasileiros ou não, interessei-me sempre por criar em diferentes estilos e linguagens e, nas minhas andanças pelos cinco continentes, nunca esqueci de levar para outros parceiros o melhor da criação poética dos brasileiros. Se fui feliz nos meus propósitos e se aprendi algo nas minhas leituras e nos contatos que fiz, o leitor desta antologia é quem dirá.

 


[i] Este artigo consta do exemplar da antologia Retrato de Corpo Inteiro (2007) com as seguintes ilustrações: 1) O Interior do Museu de Arte Moderna do Japão, em Kyobashi, Tokyo, com painéis da Exposição de Poesia Concreta Brasileira (16 a 24/04/1960), com os meus poemas concretos “tempo pó” e “caminhos”; 2) L. C. Vinholes, antes de partir para o Canadá (julho de 1977), despedindo-se de Katsue Kitasono (1902-1978), fundador do Grupo VOU e da revista mensal homônima editada em Tokyo; 3) o poeta Haroldo de Campos na visita a L. C. Vinholes, responsável pelo Setor Cultural, de Cooperação e Divulgação do Consulado-Geral do Brasil, em Milão; e 4) Umberto Eco e L. C. Vinholes, momentos antes de compartilharem a noite de abertura do Festival da Palavra do Festival Internacional de Poesia Contemporânea, realizado em Veneza (29/06/1997), na companhia de Helena Maria Ferreira e do poeta italiano Nanni Balestrini, organizador do evento.

[ii] Este contato foi intermediado por minha tia Suzana Burtin Vinholes, professora de francês em Porto Alegre.

[iii] Em fevereiro de 2013, com minha esposa Helena Maria Ferreira, visitamos o Museu Kosice, calle esperança 41, Buenos Aires, e do seu fundador recebi exemplar da antologia Peomas Madí (1941-1952), com a dedicatória: A Vinholes, mi confianza en su creación sin tregua.

[iv] Este artigo, desde 14/02/2007, está disponível no sitio

[v] Os 8 haikais de Pedro Xisto, da Editora Shin Nippaku, foram musicados por H. J. Koellreutter em 1962 e apresentados em memorável concerto no Instituto Goethe de Tokyo.

[vi] Retratos, cartas, recortes, manuscritos, etc. de Pedro Xisto, bem como cópias de cartas deste poeta ao diplomata Gernaro Antonio Muciolo foram por mim entregues, em Brasília, à escritora e poetisa Simone Homem de Mello, doados ao então Centro de Referência Haroldo de Campos para Poesia e Literatura da Casa das Rosas, em São Paulo.

[vii] Hoje, aqui, significando julho de 2023.

Comentarios

Maria do Carmp Maciel Di Primio   - 28/06/2023

Maravilhoso relato de vivências e realizações marcantes do estimado professor e amigo Vinholes!!

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