O fluxo de automóveis entre Itapuã e Ariquemes era intenso. Um pouco depois da entrada da cidade, um pequeno tumulto de carros desviando de um objeto. Em forma cilíndrica, chamava a atenção dos motoristas, que temiam um acidente. Mais ou menos 19h.
No mato, cheio de ansiedade, Gérson amaldiçoava sua noite. Queria voltar para pegar o peixe, mas não tinha jeito. Havia muito trànsito. Sentia dores.
Era uma piraíba de mais de dois metros, pescada em águas da represa do Samuel. Pesca escondida, pois não é permitido o acesso ao lago da barragem. Assim dizem, mas...
Gérson lembrou do sacrifício que foi arrumar um barco, enfrentar os jacarés, piranhas, e, principalmente, enganar os funcionários responsáveis pela fiscalização do local.
Usou um pedaço de carne de boi para atrair o monstro, que lhe deu muito trabalho para cair na armadilha. Pensou até que fosse um jacaré, criatura monstruosa da região, que não titubeia em comer distraídos.
Caboclo forte, sofreu para alojar o pescado na embarcação. Mais ainda para jogar aquele peso todo nos ombros e caminhar de volta para o sítio.
O único obstáculo que não calculou foi a passagem da BR- 364. Domingo era um calmo, então não havia necessidade de preocupação.
Comera muitas frutas durante o dia, bebera uma garrafa de pinga, além de consumir um pouco de carne-de-sol. Estava pronto para andar os vinte e cinco quilómetros com seu troféu.
Faltando apenas dois quilómetros para chegar ao sítio, o momento fatal. Um ónibus cheio de torcedores de um time de futebol passou em alta velocidade. Nem viram o homem com sua carga pesada.
A piraíba caiu na estrada. Gérson no mato. Fratura de costelas, espinha, agonia.
O peixe na estrada, sem serventia nenhuma, o caboclo antevendo o encontro com a morte. A noite cresceu sobre o homem. A estrada sobre a piraíba. Uma carreta apressada eliminou a marca da transgressão.
O corpo do pescador encontrado no dia seguinte. Sem testemunhas da glória e da ingratidão do destino. |
