VOLÚPIA - O CALCANHAR DE AQUILES DO HOMEM
João Ferreira
22 de setembro de 2023
É muito oportuno que, de vez em quando, respiremos os ares da cultura clássica e neoclássica para dinamizarmos nosso arquivo mental e enriquecermos nossa cultura.
Um dos textos que me empolgou por estes dias foi a releitura de "Elogio da Loucura" ("Moriae Encomium" no original latino) do holandês Erasmo de Rotterdam(1466-1536), uma das figuras mais destacadas do Renascimento. Trata-se de um livro que marca o alto nível da literatura renascentista.
De minha leitura resultaram alguns recortes específicos. Entre eles, destaco a caracterização que Erasmo faz das personalidades masculina e feminina.
Após a leitura bem refletida de um livro destes, a discussão sobre quem é superior, o homem ou a mulher, torna-se inútil e até boba.
O que Erasmo sabiamente coloca no capítulo XVII é que um sexo não é superior ao outro. A mulher não é superior ao homem e o homem não é superior à mulher. São duas partes do mesmo conjunto, naturais, insubstituíveis. Erasmo ocupa-se em descrever a natureza física do homem e da mulher. Segundo ele, o homem tem formas rudes, a cútis híspida, a barba selvagem e tudo isto o envelhece. Mas é dotado de engenho e sabedoria. A mulher tem a face macia, a voz doce, a pele lisa e, a seu favo, os atributos da juvência perpétua. É característica da mulher optar por agradar ao varão da melhor forma possível. Para isso, ela se desdobra em cuidados, enfeites, banhos, perfumes, penteados, cosméticos, cremes, procurando manter-se sempre bela com o rosto e os olhos cuidados. Tudo para manter os homens submissos a ela. Segundo Erasmo, a Loucura, representada pelo voluptuosidade, leva os homens a fazer a ela todas as promessas, a se curvar a todas as demandas. Quem permite todas estas delícias, observa Erasmo, é a estultícia. Textualmente: "Basta reparar na figura que o varão faz e nas tolices que diz à mulher quando pretende obter a volúpia que ela concede"... (Erasmo de Rotterdam. Elogio da Loucura, XVII).
Concluímos, então, que a volúpia e a voluptuosidade, são o verdadeiro calcanhar de Aquiles do Homem perante a mulher. A volúpia é a chave. No sexo tradicional que visa as relações entre homem e mulher, é a mulher quem maneja a chave da volúpia. É um jogo. Conta muito a habilidade e o talento do saber jogar. Mas tem uma cláusula pétrea no meio do jogo que se impõe em horas imprevisíveis. É a estrutura e a tirania da espécie.
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