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Artigos-->KOELLREUTTER MAIS DO QUE UM UM PROFESSOR -- 03/01/2024 - 17:09 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

KOELLREUTTER - MAIS DO QUE UM PROFESSOR

 

L. C. Vinholes

03.01.2024

 

Nota: De primeiro a três de setembro de 2006, Helena e eu tivemos oportunidade de participar da programação da Fundação Koellreutter[i] que começava em Tiradentes e terminava em São João de- Rei (MG). Foram três dias que, deixando a Pensão Arco Iris, à Rua Frederico Ozanan nº 340, na companhia de Maria José, irmã de Helena, e Nezinha, prima das duas, aproveitei para passear pelo confortável calçamento de lascas de pedra, conhecer a arquitetura mais que centenária da maioria das casas da cidade, andar na guapa Maria Fumaça, visitar o órgão de bambus da Matriz de Santo Antônio, apreciar as vitrines da tradicional fábrica de objetos utilitários de estanho e conhecer a loja do Centro Aura Soma Paz, onde Margarita Schack[ii] exercia suas atividades espirituais e comercializava pedras, amuletos e lembranças diversas.

 

A pacata Tiradentes estava repleta de músicos vindos para, postumamente, homenagear ao aniversariante do dia 2, que, se vivo fosse, completaria noventa e um anos. Na cidade, entre outros, foram vistos Antôio Carlos Borges Cunha, regente, compositor e professor da PUCRS; José Staneck, o insuperável executante de harmônica; o festejado baixo Eládio Perez Gonzalez; os compositores Tim Rescala e Edino Krieger, e Teca Alencar de Brito, que, em 2001, viria a ser a autora da obra Koellreutter educador, o humano como objetivo da educação musical.

 

Além da documentação que levava comigo para entregar ao reitor da Universidade Federal de São João del-Rei, professor Helvécio Luiz Reis, à qual a Fundação estaria vinculada, era portador de cartas de Brasil Eugênio da Rocha Brito[iii] e Antonio Galvão Novaes[iv], textos há algum tempo preparados pelos autores, como um diálogo atemporal com aquele de quem foram discípulos.

 

Aqui transcrevo a mensagem que recebi do meu amigo, colega e compadre Rocha Brito, acrescida de um primeiro parágrafo, no qual esclarece que sua correspondência teria sido enviada à destinatária com quase um mês de antecedência.

 

eeHelena, e

 

 

A mensagem de Brasil Eugênio da Rocha Brito

 

Em 11.10.2005 enviei um e-mail a senhora Margarita, viúva do estimado amigo e professor Koellreutter que, em parte, peço licença à destinatária e a vocês de fazer uso do mesmo.

 

É muito difícil por em palavras tudo o que ocorreu desde 1954 quando eu, recém-formado em engenharia, busquei voltar a estudar música e procurei o professor Koellreutter, de quem me tornei aluno. Não poderia imaginar que, em muito pouco tempo, viéssemos a nos tornar muito amigos, que após dois anos e meio como seu discípulo, continuariam os contatos, a amizade, fosse por contatos pessoais, constante troca de cartas e colaborações que eu pude lhe dar a um mestre que em mim confiou de maneira plena.

 

No dia 14 de setembro, em S. Paulo, disse ao casal Gertz/Ana Maria[v] e a outras pessoas que, sem dúvida, Koellreutter foi para mim muito mais que um professor. Foi como um irmão mais velho (tínhamos quatorze anos e meio de diferença de idade), alguém em quem procurávamos nos espelhar, de quem recebíamos respaldo, encorajamentos, pessoa com quem compartilhávamos até assuntos mais pessoais, um homem sábio, mas extremamente simples, avesso à soberba, uma das pessoas que mais terá influenciado de como eu passei a encarar a vida, o mundo. Isso de sentir que ele me apreciava como pessoa, sempre me foi muito decisivo, muito importante para mim. Desde início de 2003 eu, sabendo pelo amigo e duas vezes compadre Vinholes, de onde ele, já alcançado pelo Mal de Alzheimer, estava residindo, passei a telefonar de quarenta em quarenta dias para dona Áurea[vi], com quem falava bastante, sempre me pondo a par de como estava o querido professor. Enfim o desenlace aconteceu a treze de setembro de 2005 e o resto não necessitaria ser comentado. Gostaria de lhe informar que, após dois de setembro de 2002, quando tantos ex-alunos e amigos do professor nos reunimos em São Paulo, na casa do Júlio Medaglia, Vinholes teve a ideia de cada um de nós colaborar no sentido de montar um acervo constituído de materiais vários relativos aos cursos de música da Pró Arte ou outros liderados pelo professor (programas de eventos, notícias em jornais, cartas, memórias, que escrevêssemos para registrar/recuperar as coisas não "documentadas" ou mesmo as lembranças pessoais de cada um sobre os tempos de alunos, etc.). Pois, há cerca de dois anos[vii], enviei para Vinholes um volumoso escrito de mais de 300 páginas em manuscrito para atender isso que nos foi pedido, na verdade um registro das lembranças inclusive dos eventos e conversas havidas naqueles anos. Há necessidade de ser feita uma triagem, um peneiramento disso, mesmo porquanto eu não pensei em "edição final" e incluí muita coisa dita por outros, inclusive pelo professor, ou de como eu julguei pessoas e situações, que evidentemente não podem ser postas numa redação final por motivos mais do que óbvios... Apenas estou lhes contando isso porquanto considero que uma razoável parte de tudo que escrevi, junto a escritos de outros amigos e ex-alunos, seria talvez oportuno de fazer parte de algo maior, versando sobre a vida do querido professor. Atualmente Vinholes é meu ultra confiável preposto para resolver sobre isso[viii].

 

Senhora. Margarita, agradeço pela paciência de ler esta longa mensagem e me coloco aqui sempre à sua disposição no e-mail brasilbrito@uol.com.br ou pelo telefone de minha casa em Santos.

 

Um fraternal abraço do Brasil

 

Como que insatisfeito com que, de coração aberto, escrevera sobre seu mestre, Brasil voltou a registrar o que ainda sua lembrança/memória ditava, fazendo referência à colaboração que prestou quando Koellreutter estava preparando os livros sobre Harmonia Funcional e Harmonia de Jazz. O resultado está nas linhas que seguem.

                                                          

Depoimentos, lembranças e colaboração do discípulo e do mestre

 

Além disso tudo contido na carta, queria ainda passar a vocês algo mais pessoal sobre como eu tenho sempre presente em minha memória a figura deste professor e amigo.

 

Entrando no “túnel do tempo”, passam por mim como num vídeo, num DVD especial, alguns dos momentos que muito me impressionaram nestes anos de convívio entre nós.

 

A figura de Koellreutter, nas duas aulas por semana que tinha a sós com ele, me impressionavam mais e mais. Sua inteligência, sua sapiência, sua extrema modéstia e o tratamento que me dava como se ele fosse um irmão mais velho. Aprendia demais e aceleradamente, com ele naquelas salas onde ficava o ambiente impregnado com o gostoso cheiro do fumo “Revelation” de seu cachimbo. Conforme li no depoimento do bom amigo Antonio G. N. Novaes[ix], jovem inteligente e valoroso que à época conheci, eu também vivia aos sábados à tarde das 14 às 18hs aquele deslumbramento das quatro aulas coletivas onde, pelo menos três, eram capitaneadas pelo professor: Analise I, Coral, Análise II e Estética. Quanto além de nessas ocasiões tanto aprender, isso era algo como um sonho sentir/participar daquele ambiente, onde eram ensinados e/ou discutidos (nas aulas de análise) assuntos que nos encantavam.

Lá na escola, fizemos grandes amizades, com pessoas ainda vivas e outras que já partiram deste mundo.

 

Em 1955 inventei o que chamei de “Ábaco analítico das funções harmônicas”. O professor se convenceu da validade do mesmo e me encorajou a levar o assunto adiante. Ao final do ano de 1977, instado pela Editora Ricordi para publicar livro sobre “Harmonia Funcional” ele me escreveu pedindo:

 

  1. que eu repetindo o que fizera em 1959/1960, quando ele me honrou, sobremaneira, ao pedir para responder pela “revisão bem pormenorizada” do seu livro “Jazz Harmonia”[x], viesse não somente a repetir tal procedimento ocorrido na feitura daquele livro. Pediu que eu não somente aceitasse, agora de modo mais amplo, fazer o mesmo que no livro de 1959/1960, mas ainda solicitando que, como que “dialogasse com ele”, principalmente no que dizia respeito às análises de peças musicais que ele introduziria no livro.
  2. E, ainda mais, em outra honra a mim concedida: pedia autorização para fazer figurar dentro do livro o “ábaco”[xi] que eu inventara e que eu respondesse pelo capitulo final que trataria do mesmo “ábaco”.

 

Assim decorreu praticamente um ano em que nos correspondíamos com uma regularidade impressionante de cerca de uma a duas cartas trocadas por mês entre nós. De algumas delas envio xerocópias junto a este pedindo que sejam passadas às mãos de dona Margarita.

 

Alguns outros flashes de lembranças:

 

a) De quando eu e minha esposa, em viagem de núpcias em novembro de 1956 fomos por ele encontrados no mesmo hotel em Salvador e o carinho que ele nos dispensou.

b) Os encontros dele com alunos e ex-alunos quando voltava de viagens como da Índia, por exemplo, em 1959 e nos encantava com o entusiasmo quase juvenil com que abordava os assuntos a nós expostos.

c) Visitas que fazia a mim e minha família, a primeira das quais almoçando em nosso apartamento quando recém-nascera minha filha Cristina, que ele pegou nos braços. A esse tempo eu residia na capital paulista.

d) As atenções das cartas, dos telefonemas, das comunicações entre nós quando trabalhou em New Delhi (Índia) e após em Tokyo. Ao regressar dessas viagens sempre me presenteava com algo especial. Quando veio da Índia me trouxe dois LP’s gravados lá com músicos vários, dos quais pelo menos dois se tornaram, anos depois, conhecidos no Ocidente ao seguirem um caminho paralelo ao de Ravi Shankar.

e) Desde 1963, eu e minha família nos mudamos para Santos, e ele não deixou de manter estreito contato comigo e muitas vezes desceu a serra, fosse para responder por palestras, para exibição de obras suas, ou mesmo apenas para rever pessoas como este amigo, o compositor Gilberto Mendes[xii] e alguns outros ligados principalmente ao Gilberto.

 

 Vou assumir que tenho que parar este longo depoimento por aqui, pois não seria acertado prolongá-lo além disso que já se torna muito extenso.

 

Estimado professor e querido amigo, onde estiver atualmente, sua lembrança me acompanha e me acompanhará até talvez eu vir a ser convocado por Deus e podermos então nos reencontrar.

 

O carinho do seu sempre aluno e sempre amigo, Brasil

 

Brasil Eugênio da Rocha Brito.

Engenheiro Civil e Sanitarista. Aposentado.

 

[i] A Fundação passou a funciona no Centro Cultural da UFSJ, no Campus Solar da Baronesa.

[ii] Margarita Schack ( - 12.05.2016, meio-soprano alemã, dedicada à música de vanguarda, viúva de H. J. Koellreutter que negociou com o reitor da Universidade Federal de São João del-Rei a criação da Fundação Koellreutter, vincula à universidade.

[iii] Brasil é autor do artigo Bossa Nova, publicado na página INVENÇÃO do Correio Paulistano, de 23 de outubro e 6 e 20 de novembro de 1960, e reproduzido no livro Balanço da Bossa e outras bossas (1974), de Augusto de Campos. Figura também, em italiano, na brochura distribuída em 23 de abril de 1997 pelo Instituto Brasil-Itália (IBRIT-Milão), junto com o artigo comemorativo ao Centenário do Nascimento de Pixinguinha.

[iv] Na cerimônia de 2 de setembro de 2006, na Matriz de Santo Antônio, passei diretamente às mãos do reitor Helvécio Luiz Reis, da UFSJ, pastas com centenas de documentos relativos a Koellreutter, reunidos por Brasil, por mim e por outros amigos do saudoso mestre. Igualmente, foram entregues 23 partituras impressas, inclusive a da única cópia existente da Fanfarra de Inauguração, para a abertura do Museu de Arte Contemporânea de São Paulo. Entreguei também cartas pessoais de Brasil Eugênio da Rocha Brito e de Antonio Novaes, dirigidas ao professor, não lidas durante a cerimônia.

[v] Ana Maria Parsons, idealizadora e diretora-geral do Centro de Referência Musicológica José Maria Neves, em São João del-Rei, e seu esposo John Gertz Palma, violonista, ambos residentes em Tiradentes (MG).

[vi] Áurea Trajano foi a mais do que governanta que, com apoio do esposo, diuturnamente acompanhou a Koellreutter nos seus últimos anos de vida.

[vii] Referindo-se a 2007.

[viii] Os anos passaram e o projeto não se realizou.

[ix] Antonio Galvão Naclério Novaes, engenheiro naval e oceânico (USP, MIT), aluno de H. J. Koellreutter, na Escola Livre de Música da Pró Arte, parceiro de Brasil Eugênio da Rocha Brito e L. C. Vinholes na confecção e edição artesanal de dez exemplares mimeografados da apostila Introdução à Acústica (1957), para os que fazem e gostam de música.

 

[xi] Para conhecer a colaboração de Brasil da Rocha Brito com seu mestre H. J. Koellreutter no que diz respeito ao “ábaco” por ele inventado em 1955, o artigo Koellreutter: a gestão do ábaco de Rocha Brito, publicado em 03.09.2015, no site .

[xii] Certamente o compositor Gil Nuno Vaz e o compositor-regente Roberto Martins

Comentarios

Maria do Carmo Maciel Di Primio  - 05/01/2024

Conheci H.J.Koellreutter em 1993, quando adquiri o seu livro ESTËTICA - À procura de um mundo sem "vis-à -vis" ( Reflexões estéticas em torno das artes oriental e ocidental) publicado pela Novas Metas - tradução e coordenação Saloméa Gandelman. Edição japonesa: Seiyõ tono tai wa / Meisei University Ed. Tokio,1983.

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