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Artigos-->THÉON SPANUDIS E OS NOIGANDRES -- 18/01/2024 - 18:38 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

THÉON SPANUDIS E OS NOIGANDRES

 

L.  C. Vinholes

18.01.2024

 

No final da minha segunda estada o Japão, quando me preparava para embarcar para um novo posto no Canadá, recebi carta manuscrita de Théon Spanudis, datada de São Paulo, em 12 de fevereiro de 1977, na qual ele registra que, de mim, teria recebido um folheto que o ”encheu de tristeza”. Hoje, décadas passadas, embora tente lembrar qual teria sido o folheto enviado para Spanudis, confesso que, não duvidando, não tenho a menor lembrança. Sempre repassei textos, impressos, cartões e todo o material que levasse informações novas aos que se interessavam ou estavam vinculados à poesia nova. Naqueles quase quatro anos de Japão continuei o que havia feito nos primeiros dez anos, contatando os poetas japoneses de vanguarda, estudando e traduzindo seus poemas, sem descriminar estilos ou escolas, simplesmente tentando sedimentar e ampliar o que havia conquistado depois da repercussão da Exposição de Poesia Concreta Brasileira, no Museu de Arte Moderna de Tokyo, de 16 a 24 de abril e 1960, realizada com o apoio do diretor do museu Atsuo Mayusumi e com a colaboração do, também bolsista, arquiteto paulista João Rodolfo Stroeter.

 

Já no Canadá, procurei conhecer o curriculum de Spanudis, tarefa que não foi fácil e, ao final, insuficiente. Era filho de pais gregos, nascera na Turquia em 1915, cursara medicina em Viena, com especialização em psicanálise, aos 35 anos de idade teria chegado em São Paulo e, a convite da Sociedade Brasileira de Psicanálise, ali lecionou até 1957, ano em que teria decidido ser colecionador e se dedicar à crítica de arte e à poesia, participando do movimento neoconcreto que surgiu em 1959. Sua coleção foi doada ao Museu de Arte Contemporânea da USP, em 1979, ano em que teria participado da I Exposição Neoconcreta brasileira. Spanudis faleceu em São Paulo em 1986.

 

Embora certamente tenha sido meu contemporâneo nos anos de 1953 a 1957, quando estudei na Escola Livre de Música da Pró Arte, não recordo de tê-lo encontrado em eventos culturais daquele período de quatro anos e meio ou nas conferências, palestras, exposições onde conheci aos poetas Ronaldo Azeredo, Pedro Xisto, citados na carta, aos irmãos Haroldo e Augusto de Campos, Décio Pignatari, aos pintores Valdemar Cordeiro, Samson Flexor, Anatol Wladislaw, Luiz Sacilotto, entre outros.

 

Dando continuidade ao texto deste artigo, transcrevo, na íntegra, a carta mencionada, respeitando a grafia do autor:

 

meu caro Vinholes.

         o folheto que você me enviou me encheu de tristeza. Vi o desenfreado carreirismo dos Noigandristas, a sua ânsia de propaganda pessoal, em pleno desenvolvimento mundial. Para mim o poeta, é algo sacral e religioso, que não admito projeções carreirísticas. Tem de ser feito em silêncio e estado de simplicidade até talvez simplória e absoluta modéstia. E eles são o contrario de tudo isto.

com a exceção de dois poemetes de Ronaldo Azeredo (o tic-tac, e o rua-sol) nunca os produtos dos outros me disseram alguma coisa. Infelizmente não conheço os teus poemas – gostaria muito – nem os de Pedro Xisto para poder mudar de opinião. Eles nunca confessaram que não tinham a menor ideia do que era uma poesia espacial, antes de conhecer a poesia constellativa e as teorias de Gomringer. Nunca foram capazes de reconhecer os nossos poemas concretos, monopolistas férreos como eles o são, nem a poesia cinética que é algo profundamente novo. Nela, o espaço gráfico dá página não é apenas o passivo suporte da construção verbal-visual, mas torna-se um agente ativo, substituindo a palavra explicativa, principalmente o verbo, sugerindo movimento.

         todas estas falhas caracterológicas deles, a sua desenfreada ambição o carreirismo, o seu pétreo monopolismo, etc. tornam-se os extremamente antipáticos para nós. O vulto de teorias, a mobilização de nomes famosos para dar cobertura aos seus magros produtos, nos deixa não só perplexos, mas também profundamente escandalizados.

         precisava te dizer tudo isto para você me conhecer melhor.

         se apesar de todo isto, você continuar em querer fazer uma minuciosa análise do meu livro, poderia te fornecer material autobiográfico (uma entrevista que dei na revista de psicanálise em São Paulo, retratando o meu desenvolvimento poético) e outro material análogo.

não sei como que você reagirá perante esta minha confissão. Caso você quiser manter o diálogo, me manda, por favor, antes de tudo, poemas teus.

Com um forte e afetuoso abraço.

                                                 Théon Spanudis

endereço:

         Rua São Carlos do Pinhal 485, apt. 42

                                     São Paulo, Brasil

 

Como não sou nem psiquiatra, nem psicólogo, mas apenas despretensioso compositor, poeta e tradutor, na carta acima, limitei-me a dar destaque em itálico a determinadas expressões da lavra de Spanudis, deixando a critério do leitor deste artigo o conceito que ele passe a ter do missivista, do julgamento e das críticas que ele faz de poetas que escreveram uma página nova na história da poesia brasileira, aplaudida por gerações de seguidores no Brasil e no exterior.

 

Não posso deixar de registrar que nunca tendo respondido à missiva de Théon Spanudis, em abril de 2012, doei ao então Centro de Referência Haroldo de Campos para Poesia e Literatura, da Casa das Rosas em São Paulo, o robusto exemplar de sua antologia POÉTICA (1975), da Livraria Kosmos Editor. Em breve também entregarei a carta de Spanudis à Coleção L. C. Vinholes do acervo dessa instituição paulista, para que lá ela aguarde o eventual possível momento de ser cotejada com qualquer outro documento que dê resposta aos personalíssimos arroubos do missivista.

 

 

 

Comentarios

Maria do Carmo Maciel Di Primio  - 22/01/2024

Confesso ter lido varias vezes a carta de Théon Spanudis,
...."magros produtos"...entre outras expressões destacadas em itálico pelo Prof. Vinholes me deixou com o coração apertado.

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