(Café com Poesias – Brasília/DF, 22/1/2004, 20.; 30h)
Sentada à mesa do café,
vejo a mim mesma numa sala de cinema,
minha vida passando por mim
e findando em forma de poema.
Sentada, os olhos a ver
aquilo que não acontece.
O que passa por mim, custo a crer,
sem que eu deseje, vem:
amanhece, anoitece, acontece.
Diante de mim, a chama da vela dança
e me convida a acompanhá-la
em seu baile tão singular.
Uma lágrima, teimosa, entala,
como a tentar me lembrar
das coisas dentro da mala...
Ainda que olhe, não vejo.
O que vejo, não estou a olhar.
Ainda que escute, não falo.
Sequer ouço os carros a passar.
Sinto-me um pouco sozinha.
Não é uma solidão da doída,
que como erva daninha
cresce teimosa, atrevida,
mesmo em meio à multidão.
É só um pensar-se, um ver a si mesmo,
passear por dentro, buscando a esmo,
um sentido, um motivo, razão
para o que, já se sabe,
não existe explicação.
Retorno à mesa do bar.
Foi-se a sessão de cinema.
Termina-se este pensar
Como termina o poema.
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