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Artigos-->Dos números e dos mandamentos -- 05/01/2000 - 22:37 (Alexandre Simões Pilati) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O homem sempre recorreu aos números para marcar suas obras terrenas, para guiar seu caminho na terra e para estabelecer parâmetros éticos de conduta. Todavia, números são apenas números, metáforas criadas pelo homem numa tentativa desesperada de conter, talvez, a inexorabilidade da passagem do tempo. Por isso damos tanta importância ao ano que agora se inicia. É um número auspicioso. É?! Posso interpretá-lo como eu quiser, de acordo com as minhas conveniências, de acordo com o meu estado de espírito momentâneo, de acordo com o grau de maldade ou inocência que devoto à interpretação. Mas muita gente será contaminada pela minha interpretação. Diante de um número tão forte tudo sofreu (até os pobres computadores pessoais) com a entrada no ano 2000. Já estamos no dia 5 de janeiro e nada aconteceu. Nenhum meteoro caiu no meu quintal, minha casa não foi dissolvida por uma chuva ácida, meu computador ainda me obedece (apesar de às vezes tentar me trair), e o melhor, minhas férias ainda não acabaram. Percebe-se agora, curada a ressaca da embriaguez cósmica de escatologia, que somos menores ainda do que pensamos. Números são só números, por isso não se deve acreditar em números bons ou ruins ou mesmo listas como as dos 10 mais ou 10 menos.

A cultura fácil norte-americana proliferou a moda do Top Ten. E deve-se sempre desconfiar do que é norte-americano. Mas a mística dos números como o 10, o 7, o 2000...continua a viver no arcabouço simbólico do homem. Por que Deus não escreveu 20 mandamentos? Por que ele descansou no sétimo dia?

Juntando a força dos números 10 e 2000, a Folha de São Paulo na edição do dia 26 de dezembro de 1999, produziu o encarte MAIS! com o tema: “Os novos dez mandamentos”. Foram convidados vários intelectuais e artistas para fazerem o papel de Deus, e escreverem novos mandamentos para o ano que se inicia. Na verdade, o maior desejo dos escolhidos foi a busca pela igualdade. Irônico, pois quem nos ensina a igualdade na escola é justamente o trabalho com os números da aritmética, e eu aqui desprezando-os. Em toda parte, como se vê pelos decálogos escritos, há um profundo desejo daqueles que acreditam ou não em números por unidade entre os seres humanos, de respeito às diferenças étnicas, de irmandade entre os seres humanos.

Como não fui convidado pela Folha e sou cético com relação a números ou mandamentos, não escreverei meu próprio decálogo, mas farei a minha seleção Top 8 entre os que foram produzidos. Assim, entro na onda da numerologia fácil e dou minha contribuição para o ano 2000.



1. “Não presumirás que o teu grupo ocupa o centro do universo”. Peter Burke. A solução dos problemas da discriminação étnica, ainda não se efetuou totalmente. Por isso escolho o 8º mandamento do historiador inglês. De fato a solução mental e simbólica das diferenças rege todo o desejo de paz mundial. Essa solução passa por deslocar o olhar para o diferente, passando-o primeiro por si próprio, para dar fim ao etnocentrismo, que muitas vezes justifica massacres e não apenas comentários ou piadas maldosas.

2. “Darás sempre início ao novo, pois os humanos, embora devam morrer, não nascem para morrer mas para recomeçar”. Jurandir Freire Costa. De fato esse foi um dos mais poéticos e profundos mandamentos elaborados para o MAIS!. Em seu conteúdo vem a noção de erro. Se o homem nasceu para criar, e para recomeçar, está implícito que algumas vezes vai errar, e que outras tantas vezes precisará de perdão. O erro não é a morte, mas o primeiro passo para o recomeço.

3. “Sê honesto sem ser cruel”. Alain de Botton. Às vezes as contingências nos levam a atitudes cômodas, todavia desonestas. E há vários casos em que a honestidade nos soou cruel. É a profundeza ética de proceder equilibradamente, que sempre foi difícil e que deve sempre ser lembrada.

4. “Desconfia da tua consciência quendo ela te deixar em paz contigo mesmo. É dificílimo ter certeza do que é certo. Certeza em excesso produz uma mercadoria muito duvidosa, que é a convicção de que estás certo e os outros, errados. Muitas vezes, a consciência apenas mascara o que menos conhecemos em nós mesmos, aquilo que desejamos.” Renato Janine Ribeiro. Ainda pelo reino fluido da ética está a dificuldade de se achar o certo. Muitas vezes não se vê o que é mas o que se quer que seja. O homem é, e sempre será, o reflexo de seus desejos. Em cada sílaba pronunciada pelo ser humano vai estar o desejo de estar certo e o temor de estar errado.

5. “1946- An...da, Luzia, apronta tua fantasia, alegra o teu olhar profundo, que a vida dura só um dia, Luzia, e não se leva nada desse mundo.” Nina Horta. A colunista da Folha tomou uma série de trechos de músicas de carnaval e fez os seus dez mandamentos. Apesar de nós brasileiros precisarmos muito dos outros tipos tradicionais de mandamentos, esses nos traduzem melhor. Escolho “Anda, Luzia” pois traduz a capacidade de celebração que poucos povos no mundo têm e que os poderia tornar mais vivos de uma maneira plena: “Pega o pandeiro e vem pro carnaval”

6. “Não invocarás o interesse público para justificar teu interesse pessoal, ou o do teu grupo, ou da tua classe social.” Luiz Carlos Bresser Pereira. No século que finda, a confusão entre o público e o privado ainda não se resolveu. A superação dos Estados pelos grandes grupos empresariais pode agravar ou solucionar esse impasse. Depende do desejo ético do homem, da sua capacidade de doação integral para o público. Sob o mandamento de Bresser, está a negação do egoísmo. Já surgiu algo mais sólido no homem?

7. “Amarás a ti próprio sobre todas as coisas.” Otávio Frias Filho. Não disse?! Viva o egoísmo, viva eu! O irônico mandamento do diretor da folha representa novamente a superação do egoísmo. Quebrem de uma vez com os espelhos!!!

8. “Apesar de tudo, acreditarás no poder do voto, ao menos como método de tentativa e erro ou de aproximações sucessivas à verdade.” Moacyr Scliar. Já se disse nessa lista de mandamentos que é dificílimo saber quando se está certo. Daí o perigo do voto. A maioria, por não ser o todo absoluto, está sempre perto do erro ou da glória. Jamais conseguirá um outro de modo total. De tropeço em tropeço devemos caminhar, pois é melhor todos errarmos juntos do que um só crer que está certo.

O decálogo que Deus deu a Maomé usa com freqüência e contundência duas palavras um tanto esquecidas hoje em dia: vizinho e próximo. O que apresentei acima traz, subjacentes, quatro palavras essenciais que podem nos fazer caminhar para uma existência mais feliz: altruísmo, celebração, democracia, reflexão. Se estendêssemos os significados dessas palavras ao nosso próximo, ao nosso vizinho, não precisaríamos crer tanto nos números como mensageiros de um mundo melhor. Ou mesmo não careceríamos de mandamentos.

Alexandre Pilati

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