A visita
Às dez horas o distinto me telefona: “Querida, melhore a bóia que eu vou levar um colega engenheiro de São Paulo para almoçar conosco.”
Larguei o fone fora do gancho e saí sapateando como uma barata tonta. Oh! Céus! Que farei? Que farei?
Eu e o marido temos um trato, de um não causar imprevisto ao outro (trato que rompi por seis vezes: “Querido, você vai ser papai outra vez!”), porque o imprevisto balança qualquer coreto, mas ele sempre acontece...
Fiquei aturdida, sem saber se começava a ajeitar a sala, limpar o banheiro ou enfrentar o almoço. Estava nesta agonia quando escutei um grito:
- Dona Christina! Chegue!
Cheguei afobada na cozinha e dei com um alagado. A água, em vez de entrar pelo cano da pia, saia de lá aos borbotões e transbordava, fedorenta. Foi a minha vez de berrar:
- Manoel! Socorro! Chegue!
O meu “faz tudo” veio correndo lá da horta. O problema ele logo descobriu. Era o cano da lavanderia que estava entupido e fazia a água voltar e sair por onde não devia. Com um gancho, Manoel começou a tirar pedaços de um sapo dos cafundós escuros do encanamento.
- Como um monstro desse pode ter entrado pelo ralo? – perguntei.
- Ele entrou quando pequenininho e cresceu lá dentro – foi a resposta rápida e inteligente.
Enquanto Almerinda lavava o chão e o desinfetava, fui tratar do ”menu”. Mandaria fazer um rosbife com batatas e ervilhas, uma salada, arroz branco e uma farofinha caprichada e pronto. De sobremesa, doce de caju desfiado com queijo. E ”que venga el toro”!
Ao meio dia o meu marido chegou com o visitante e. enquanto lavavam as mãos, eu substituí o prato do meu neto de cinco anos de perto do avô, para dar o lugar de honra ao engenheiro.
Todos prontos para sentar à mesa, Daniel reclamou:
- Cadê meu prato e meu guardanapo?
- Está aqui perto do Marcos, respondi, calmamente.
- Nada disso! Eu vou sentar no meu lugar! – disse ele, sacudindo o dedinho rechonchudo.
Briga, puxa, troca , não troca, e a visita... sorrindo gentilmente.
Sossegados os ânimos, Daniel senta de mau jeito e o garfo cai debaixo da mesa. O menino desce da cadeira e se embarafusta para pegá-lo. Eu seguro firme no braço dele:
- Deixa, filho, a Almerinda traz outro!
- Não! Eu vou comer com este mesmo!
Eu o repreendo:
- Tenha modos e me obedeça... – falo com um sorriso forçado.
O guri se põe a chorar em voz alta.
- Precisa chorar assim, Daniel? – pergunto aborrecida.
- Também, a senhora aperta o braço do coitado! – me acusa o Marcos.
Papai impõe respeito, e o almoço vai sendo degustado.
Na hora da sobremesa, nova cena:
- Eu não quero doce de caju, eu quero a minha gelatina – choraminga Daniel.
Eu explico, com bons modos:
- A gelatina não ficou pronta, filhinho...
- Mas eu quero a minha gelatina. A Almerinda prometeu! – chora o infante.
Para espanto de todos Almerinda, gordona e carinhosa, vem lá da cozinha com uma panela velha, destas de calombos e reentrâncias e sem cabo e diz:
Olha, Danielzinho, ela tá mole, até parece uma meleca!
Olho, desconsolada para o desconsolado distinto e, sem jeito, pergunto ao visitante:
- Vamos passar uma borracha e começar tudo de novo?
- Não é preciso, eu também tenho filhos pequenos e estou matando as saudades – falou, sorrindo, o convidado.
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